Artigo
Por MARINA SILVA
COMEÇA a oitava edição do Fórum Social Mundial, em Belém, em meio a uma conjuntura mundial que em nada lembra 2005, quando foi realizado pela última vez no Brasil. Terminou a era Bush e entramos na era Obama. A maioria dos países tenta se safar da severa crise econômica global. O relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU escancarou uma crise ambiental gravíssima provocada pela aceleração do aquecimento global. E a guerra no Oriente Médio recrudesceu como fogo que encontra gasolina.
A novidade é que o fórum está na Amazônia, região-símbolo do cruzamento das grandes questões do presente com as perspectivas de futuro. Como se fosse uma fronteira imaginária de tempos, possibilidades e esperanças. O fórum é evento da sociedade, fiel à sua diversidade e em busca de um "outro mundo possível", a partir da crítica e oposição ao modelo de organização econômica e social dominante. Desse mundo almejado, temos os contornos: globalização solidária, mais equidade e justiça social, respeito aos direitos humanos, relação equilibrada entre seres humanos e ambiente natural.
Uma olhada rápida ao redor logo mostrará como é difícil chegar lá. Uma segunda olhada, porém, identificará milhares de focos que já contêm esse futuro, em termos de conhecimento, lastro cultural, disposição para mudar, ideias, soluções tecnológicas inovadoras, experiências de convivência e de gestão. O fórum é, sem dúvida, uma liga possível entre essas potencialidades. Contraditoriamente, poderá vir a ser poderosa fonte de dispersão e de cansaço dessa energia, caso não se mova para sínteses capazes de levantar bandeiras, aglutinar e criar força política.
Não é fácil fazer isso sem se perder numa condução empobrecedora que enrijeça seu caráter de grande e democrática tribuna livre. Mas há questões que, pela sua natureza horizontal e inclusiva, podem ser pontos de partida para refletir sobre um caminho mais propositivo para o fórum. Um bom começo seria desencadear um movimento político global pela adoção de metas e planos para enfrentar as mudanças climáticas, estabelecendo critérios para que os mais pobres e vulneráveis não paguem a conta do desastre provocado principalmente pelos ricos.
O grande desafio deste fórum pode ser o de transitar para fora dos seus próprios círculos, juntar forças e agir. Como uma água que vai abrindo seu leito, desde uma pequena nascente, recebendo igarapés. E acaba formando gigantes como o Tapajós, o Amazonas, o Tocantins, o Xingu, o Madeira. Que eles nos inspirem nesses dias em Belém.
*MARINA SILVA escreve às segundas-feiras nesta coluna.
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