sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Envolverde - Frei Betto encanta e alerta


Por Fabrício Ângelo, especial para IPS/TerraViva

Um dos mais importantes teólogos da Brasil aponta avanços na democracia na América Latina, mas alerta para a falta de políticas públicas consistentes com o desenvolvimento sustentável e a preservação da Amazônia.

Em um debate onde a senadora brasileira Marina Silva não pode comparecer, quem roubou a cena foi um inspirado Frei Betto, que se apresentou para mais de 200 pessoas na manhã desta quinta-feira, no Palco 2 do FSM 2009. Com um discurso simples e cheio de irreverência, encantou a platéia que não perdeu a atenção por nenhum minuto, mesmo sob um calor de mais de 30 graus.

Carlos Alberto Libânio Christo, conhecido como Frei Betto, é um escritor e religioso adepto da Teologia da Libertação e militante de movimentos pastorais e sociais. Foi assessor especial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva entre 2003 e 2004 e coordenador de Mobilização Social do programa Fome Zero.

De acordo com Frei Betto, todos somos seres naturais e isso nos faz iguais a qualquer outro. Para ele a religião nada mais é do que uma forma de realçar os valores humanos. “O ser humano tem em sua existência o amor, a compaixão e a solidariedade, e isso não é nenhuma ideologia que forma, e sim nossa própria humanidade”, disse.

Betto declarou que a maior função do ser humano é ajudar o outro a criar juízo. “Apesar de tudo temos prazo de validade e defeito de fabricação”, brincou arrancando sorrisos e aplausos do publico. “Deus está sempre conosco, mas achar que vai ficar observando e julgando tudo o que fazemos é ilusão. Ser humano é lutar pela plenitude da vida”.

Ao ser perguntado sobre se acreditava em vida fora do planeta, mais uma vez Frei Betto foi irreverente, “claro que sim, mas penso que eles já devem ter captado algumas imagens de televisão, que são as ondas de maior alcance existente, e visto que aqui não há vida inteligente”, falou. Usando mais seriedade ele ressaltou a importância de uma aliança ecológica universal por toda a Terra.

“Temos que pensar em uma aliança de preservação e veneração de natureza ética e solidária. Não adianta lutar pela preservação do meio ambiente sem lutar pelo fim da pobreza”.

“A Amazônia é habitada há pelo menos 40 mil anos. Vinte por cento da água que abastece os mares vem daqui. Temos apenas 3% de água potável em todo o planeta e querem acabar com tudo isso, sem falar no desmatamento e nos projetos públicos”, continuou.

Segundo Frei Betto o solo amazônico não tem muita profundidade e perde rapidamente seus nutrientes. “Se o desmatamento continuar o futuro da Floresta Amazônica é o presente do Saara africano. E não é só isso, as chuvas que caem aqui abastecem a agricultura do Sul e Sudeste do Brasil, então o risco é nacional”, destacou.

Continuando, o religioso alertou que o cultivo de soja na região cresceu 18% “e soja não dá sombra nem ajuda na preservação de lençóis freáticos. A região tem mais de 100.000 espécies de flora e fauna. O milagre da vida está sendo destruído, é o que chamamos de ecocídio”, avisou. Ele alertou, principalmente os estrangeiro, a só comprar madeira certificada e não alimentar uma indústria que movimenta mais de um bilhão de reais por ano e destruindo a floresta.

Mais uma vez Frei Betto brincou com as palavras quando disse que os homens são bichos difíceis de domesticar e que nascemos naturalmente capitalistas e egoístas, ”vejam os bebes, por exemplo, são extremamente egoístas, quando estão com fome choram, esperneiam, nem querem saber se os pais tem de acordar cedo para trabalhar”.

Ao ser questionado sobre o trabalho escravo, o frei afirmou que no Brasil a escravidão é sofisticada, pois não precisamos mais trazer pessoas de nações mais pobres para dominar. “É só fazer uma promessa de trabalho fácil e depois mantê-los sobre pretexto de dívidas. E isso tudo é aceito pela sociedade”, afirmou.

O palco da discussão é a região amazônica, e seus problemas estão sendo debatidos em quase todas as mesas de discussão do FSM 2009, por isso Frei Betto continuou batendo com firmeza nessa tecla. “Ainda falando de Amazônia, se continuar o desmatamento em 2030 já teremos estrago em uma área que equivale a 32 Bélgicas. A maioria desses devastadores não pensa em sustentabilidade ou em gerações futuras, só no capital”, falou.

Frei Betto comentou o momento político vivido pela América do Sul na atualidade. “Pela primeira vez temos governos democráticos e populares. No continente tivemos três importantes fases, a ditadura, o ciclo neoliberal e hoje a democracia popular. Mas de nada adianta se não tivermos uma democracia de verdade, política e principalmente econômica”, declarou.

Conforme Betto mesmo com suas falhas a atual situação tem grandes avanços, pois vários dos presidentes da região vieram de classes populares e conhecem de perto as dificuldades enfrentadas por essa população. “Temos que fortalecer os movimentos populares e sociais, senão sempre ficaremos nas mãos da elite.

Mas esses movimentos precisam aprender a fazer política pública e não ficar esperando que algum deputado ou senador faça por eles. Dar um basta nesse sistema econômico desigual, pois como diz o ditado, o cachorro só é o melhor amigo do homem porque não conhece dinheiro”, finalizou mais uma vez irreverentemente. (IPS/TerraViva)

(Envolverde/IPS/TerraViva)

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