quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

O Liberal - Índios pedem socorro para a Amazônia

Cerca de 1,2 mil índios do mundo inteiro se reuniram ontem de manhã em frente ao palco principal da Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra) para protestar em favor da preservação da Amazônia, no primeiro dia do Fórum Social Mundial (FSM). Eles fizeram uma faixa humana com os dizeres 'Salve a Amazônia' e 'S. O. S. Amazônia'. Diversos participantes do evento se uniram ao ato ao observar a movimentação.

Antes de começar o ato, os índios Xavantes fizeram um ritual de purificação para que tudo corra bem durante o Fórum, que termina domingo, 1º de fevereiro. Um representante indígena, em nome de todos os povos, leu uma mensagem para pedir permissão aos seus ancestrais para participar do evento. Neste momento, vários curiosos se aproximaram para acompanhar a celebração. Alguns, inclusive, até subiram em árvores para observar tudo de perto.

Segundo Marcos Apurinã, coordenador da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), cerca de 3,5 mil índios de 200 etnias de todo o mundo participam do evento. Segundo ele, a manifestação foi feita de última hora, pois, na verdade, na manhã de ontem seria realizada uma conferência entre os índios. Entretanto, como a tenda que seria reservada para a reunião não ficou pronta a tempo, decidiu-se pelo protesto em defesa da Amazônia.

O objetivo, segundo Apurinã, é sensibilizar a humanidade de que preservar a Amazônia é uma questão urgente. 'A floresta não tem língua para falar, mas nós, indígenas, entendemos o que ela sente e ela também nos entende', disse o coordenador da Coiab. O representante da tribo Kaipó, Ireo Kaiapó, que veio a Belém com mais 187 índios, disse que o FSM será um espaço de discussão para definir os rumos da construção da hidrelétrica de Belo Monte. 'Estamos em busca de saúde e dos direitos dos índios e para lutar contra a construção da usina, que vai destruir o meio ambiente', asseverou.

Maloca
Os índios Tembé de várias aldeias estão provando suas habilidades na construção de uma grande maloca ao lado das instalações do Programa Pobreza e Meio Ambiente na Amazônia (Poema), na Universidade Federal do Pará (UFPA). 'A Maloca do Povo Tembé' ficará pronta amanhã e será um grande palco para que os indígenas apresentem aos participantes do Fórum Social Mundial as principais manifestações de sua cultura e para outras etnias, assim como os problemas que enfrentam hoje.

'É um espaço reservado para discussões sobre os direitos de todos os povos indígenas', disse o líder Valdeci Tembé, da aldeia Sussuarana. A maloca de 100 metros quadrados fica às margens do rio Guamá. A estrutura não tem um esteio central. A sustentação é feita pela 'uirakuera', uma peça forte de madeira com cerca de apenas um metro, que sustenta as vigas laterais no centro do telhado. A 'uirakuera' foi colocada ontem presa no alto do andaime no fim da tarde.

Comércio

Durante o Fórum, os Tembé vão aproveitar o espaço para expor e comercializar o artesanato produzido com palha, sementes, penas e fibras amazônicas. Um grupo de 34 índios, entre eles quatro mulheres, ainda vai construir mais duas pequenas casas para serem usadas como cozinha e um espaço de acomodação. Depois do evento, FSM, 'A Maloca do Povo Tembé' terá muitas utilidades. Será usada como centro de formação para professores, um centro de informática para alunos indígenas e como sede da Associação do Povo Tembé.

Toda a madeira que está sendo usada na construção do espaço foi extraída durante cinco dias da reserva Tembé, com autorização, e trazida para Belém em caminhão. São esteios, vigas e caibros de macucu, laçador, pintadinho e broqueiro. Eles trouxeram também a palha de ubim, cipó de timbó açu e pachiuba, para construir a cobertura. Segundo os Tembé, essa é a parte mais trabalhosa, porque a palha precisa ser toda amarrada.

Cerca de 20 índios, a maioria do grupo, estão fazendo a amarração das palhas na pachiuba para montar o telhado. Todo o aprendizado dos Tembé sobre carpintaria e construção faz parte da cultura que é passada de geração para geração. Para não atrasar a construção, os Tembé carpinteiros se apropriaram de tecnologia e estão usando motosserra e furadeira elétrica para parafusar toda a maloca e garantir mais segurança para a obra.

Construção da Maloca do Povo Tembé na UFPA atrasa e gera reclamações
Moradores de comunidades tradicionais do Pará abriram um canal direto de diálogo com autoridades locais e nacionais no Encontro dos Povos das Águas da Amazônia Paraense, iniciado ontem. Com o evento, promovido pela Gerência Regional de Patrimônio da União (GRPU), pescadores, seringueiros e extrativistas esperam ter mais acesso às políticas públicas, principalmente na área da educação. O encontro vai até sábado, 31, no auditório do Convento dos Mercedários.

A reunião do Conselho Nacional de Seringueiros com a Central de Usuários das Reservas Extrativistas Marinhas e o Movimento dos Pescadores do Estado do Pará tem como objetivo a troca de experiências. As organizações conseguiram, com apoio da GRPU, iniciar um diálogo com autoridades governamentais, como a senadora Marina Silva (PT), o procurador geral do Estado, Felício Pontes, e outros membros do governo do Estado.

Um dos objetivos, diz Lorena Moreira, uma das coordenadoras do evento e representante dos movimentos sociais, é a regularização fundiária de ribeirinhos, que já vem sendo conquistada aos poucos. Segundo ela, o GRPU já deu termo de uso da terra para quase quatro mil famílias. Porém, ainda há quase outras dez mil por receber o título. Um pedaço de terra é essencial, mas não suficiente, segundo ela.

Assistência

Os ribeirinhos querem participar do gerenciamento costeiro junto com o GRPU, assim como ser abrangidos pelos programas sociais como o Bolsa Família e assentamentos do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). 'Há poucos com Bolsa Família, mas muitos ainda precisam. Queremos mostrar que existimos e o governo não pode mais nos ignorar', afirma.

A educação é a principal carência levantada por Luiz Carlos Araújo de Fariais, presidente da Associação de Usuários da Reserva Extrativista Chaguaré Mato Grosso, localizada a nove quilômetros do centro do município de Santarém Novo, no nordeste do Pará. Mesmo sem muito luxo, as 850 famílias associadas têm conseguido sobreviver, apesar da dependência de atravessadores para repassar produtos como camarão, peixe e turu.

A partir do Encontro dos Povos das Águas, Luiz Carlos espera conquistar ainda mais ganhos para si e para sua comunidade. 'Tenho certeza absoluta que vamos avançar muito. No momento, precisamos de escolas de qualidade para nossos filhos e de condições para nós mesmos escoarmos a produção', diz.

Painéis mostram história dos povos

Uma outra atração do Fórum Social Mundial é a tenda 'Cartografia dos Povos e Comunidades Tradicionais', localizada na Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra). Na tenda estão expostos painéis sobre a luta, conquistas e toda a produção de povos e comunidades tradicionais da Amazônia, como das Mulheres Quebradeiras na Defesa do Babaçu Contra as Carvoarias, no Médio Mearim (MA), e a dos quilombolas de Monte Alegre (MA), na luta pelo título definitivo de suas terras, assim como de povos ribeirinhos, pescadores e artesãos do Pará.

A tenda é parte integrante do Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia - Povos e Comunidades Tradicionais (PNCSA), composto por pesquisadores e movimentos sociais com atividades em todas as regiões do Brasil. O projeto é coordenado pelo antropólogo Alfredo Wagner Berno de Almeida, da Universidade Federal do Amazonas (Ufam). O projeto se relaciona com grupos de estudos de diversos países, como da Colômbia, Guiana Francesa, Venezuela, Argentina e países da Europa.

A UFPA integra o PNCSA por meio de um grupo de alunos de doutorado, mestrado e de especialização do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (Naea). Constam da programação na tenda oficina, exposição fotográfica, de publicações e diálogos com representantes dos movimentos articulados e dos pesquisadores participantes do PNCSA.

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