Opinião
Por LUIZ DULCI
O Fórum Social Mundial, cuja 9 edição ocorre em Belém, é sem dúvida o maior e mais importante espaço de debate da sociedade civil internacional.
Ao idealizá-lo e realizá-lo com tanto êxito, desde 2001, os mais diversos movimentos sociais de cinco continentes demonstram, antes de mais nada, uma notável capacidade de mobilização unitária. Mas, sobretudo, comprovam que a sociedade civil irrompeu definitivamente como um novo e relevante ator na cena global.
A mensagem central do Fórum é inequívoca: a globalização não pode restringir-se aos capitais, à indústria cultural e ao pensamento conservador. Os trabalhadores, as organizações não-governamentais, os movimentos alternativos, o pensamento transformador também podem — e devem — mundializar a sua atuação.
Inspirado em bela e justa consigna — Um Outro Mundo é Possível —, o Fórum nunca escondeu o seu principal objetivo: acumular forças na perspectiva de uma nova ordem econômica, social e política, baseada em outro modelo de desenvolvimento.
Há quem julgue a sua fragmentação temática carente de uma plataforma unificadora, e o seu pluralismo político não hegemonizado por nenhuma corrente ideológica ou partidária, entraves à incidência prática do Fórum. Penso o contrário.
Creio que o seu maior trunfo é justamente essa estrutura em mosaico, não-diretiva, isenta de quaisquer constrangimentos doutrinários ou táticos. É o que explica, em boa medida, o fascínio, o extraordinário poder de atração que ele exerce em milhões de pessoas por todo o planeta. Seu formato original e suas energias assumidamente utópicas não prejudicam em nada — ao contrário, potenciam — a repercussão que o Fórum tem na opinião pública. Em matéria de mudança social, dizia o saudoso Helio Pellegrino, o que importa não é a espuma das águas mas a força do rio que passa por baixo.
Foi com essa fisionomia libertária que o Fórum conseguiu incluir e/ou fortalecer na agenda dos povos temas cruciais para a democracia e a justiça social no século XXI: o combate à pobreza e à desigualdade econômica, a sustentabilidade ambiental, a participação social, o multiculturalismo, o respeito à diversidade étnica e de gênero, a tolerância interreligiosa, entre tantos outros.
Frente à gravíssima crise internacional, gerada nos países ricos mas com impacto brutal sobre todas as nações, em especial as mais pobres, os ideais do Fórum adquirem enorme atualidade e pertinência.
Pois a crise mundial não é, obviamente, apenas econômica ou financeira.
Estamos assistindo, na verdade, à ruína teórica e prática — e ética — do modelo neoliberal imposto ao mundo nas últimas décadas.
Junto com vários dos bancos e empresas mais poderosos do planeta, o que desmoronou foi o dogmatismo predatório do chamado Consenso de Washington.
Foi o poder absoluto dos capitais, sem regras nem transparência, alheios a qualquer supervisão pública, pairando acima dos indivíduos, das sociedades e das instituições.
Foi a atrofia irresponsável do estado democrático. A insensata subordinação de toda a vida social à lógica mercantil.
A sociedade civil, os movimentos populares e os governos progressistas não podem, por isso mesmo, enfrentar a crise apenas mitigando seus efeitos perversos e defendendo conquistas sociais — ainda que esta seja uma tarefa indispensável. Precisam ir além, ampliando a luta para que o mundo adote outro modelo de desenvolvimento e de governança, fruto de uma compreensão ética e solidária da vida econômica e do estado democrático.
Não basta remover os escombros do neoliberalismo. O desafio é construir uma nova ordem pósneoliberal.
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