sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Envolverde - Sem Estado, mas com muitas ideias


Por Zoltan Dujisin, especial para IPS/TerraViva

O Estado esta em declínio, isso ninguém põe em duvida. Enquanto a globalização precipita a privatização dos serviços públicos, há quem queira aproveitar o crepúsculo do Estado para proporcionar novas formas de soberania aos povos menos poderosos. Mas o que é um 'povo'?

Defendendo o direito inalienável a auto-determinação dos povos, o Presidente da CIEMEN (Centro Internacional Escarre pelas Minorias Étnicas e das Nações) Aureli Argemi referiu que “o Estado está a atravessar uma grande crise, estamos a caminhar para outro mundo. A nossa ideia não é separar, é unir todos os povos sob o ideal da democracia.”

Mas todo movimento nacionalista enfrenta criticas e desafios filosóficos, que originam nas duas grandes escolas de pensamento sobre o nacionalismo do século XIX: A primeira, liberal e ocidental, define a nação segundo o conjunto de cidadãos que vivem sob um Estado que cria e fomenta uma identidade. A segunda, que teve o seu grande impulso na Alemanha e na Europa do Leste do século XIX, considera que a base duma nação esta na cultura, a língua e os hábitos que a diferenciam de outras nações.

O nazismo levou a segunda concepção a um extremo intolerante e deixou-a no descrédito, e o fim do comunismo também pôs na defensiva todos aqueles que defendem formas de pensamento colectivista. No entanto, Xose Manuel Beiras, Presidente da Fundação Galiza Sempre insiste que “sem direitos de identidade colectiva o cidadão é maneta, está limitado na sua personalidade jurídica e politica. Estes direitos podem servir de base para lutar contra a discriminação de raça, género e cultura.”

“O nacionalismo emancipador é a antítese do nacionalismo chauvinista,” continuou o ativista naquela que foi a intervenção mais exaltada do dia. Beiras explica que é preferível uma identidade ser construida “de base” do que como resultado de uma imposição vertical. Concluindo, pediu desculpa “pela minha veemência, mas eu sou como sou!” causando a gargalhada do publico.

Mas como distinguir um povo duma etnia ou duma nação, um dialecto duma língua? Políticos, jornalistas e académicos nunca chegaram a um acordo quanto a essa questão, mas muito do charme duma causa nacional parece consistir na capacidade duma elite em mobilizar a população e convencer outros da importância e ancestralidade da própria cultura. Foi por isso mesmo que Beiras começou a sua intervenção lembrando aos participantes que o Português “nasceu na Galiza.”

Se galegos e catalães tem que lidar com o Estado espanhol e o que dizem ser a sua obstrução para com os seus direitos coletivos, o Curdistão esta repartido por bem 4 estados, alguns deles instáveis: A Turquia, o Irão a Síria e o Iraque opõem-se de forma incondicional e as vezes violenta ao movimento independentista Curdo. “Como se não chegasse, a Europa e os EEUU tem grande interesse nos nossos recursos,” disse Faruk Doru da Kurdish Network. A sua proposta “dum sistema confederal deveria ser aceite pelos estados centrais, porque por muito que tenham exércitos e aviões, no terreno sao os Curdos que tomam as decisões que nos afectam no dia a dia.”

Já mostrara Doru no dia anterior, durante o concerto da musica dos povos e nações sem Estado, como o sentimento nacional e uma questão... sentimental. Após mais de uma hora de danças indígenas da Amazónia, o publico foi apanhado de surpresa pela performance a solo do ativista Curdo, que encantou a plateia com o seu excelente domínio vocal, e depois com as suas habilidades na guitarra, interpretando a musica dum jovem cujo irmão morre pela causa Curda. Naquela altura Doru dirigira-se ao publico e chamara para a união entre o seu povo e os indígenas “Os problemas sao os mesmos: Os grandes poderes querem o nosso petróleo e a nossa agua.”

Hoje, foi a vez dum indígena corresponder: “Não é possível enfrentar estes desafios de forma parcelada e isolada,” Claudio Carihuentro, da Wallmapuwen (País Mapuche) diz da perspectiva do único grupo indígena americano que, apesar de oprimido desde a criação do Estado chileno, nunca foi derrotado militarmente pelos conquistadores espanhóis. “Muitos dos recursos ambicionados pelos Estados poderosos estão nas zonas habitadas por povos como o nosso, mas esta mesma interdependência de recursos causados pela globalização oferece oportunidades de lutar conjuntamente.”

“Temos que introduzir o debate sobre as nações sem Estado na agenda alter-mundista,” concorda Carles Riera da CIEMEN. “Existe uma crescente aliança entre povos da Europa, os povos indígenas da América, o Sahara, o Curdistão e o Tâmil para questionar o modelo do Estado nação.” avisou o membro do grupo organizador do debate.

Mas a solução passa necessariamente pela independência? Respondendo a uma pergunta de Terraviva, Beiras insiste que não e preciso cair “no fetichismo eurocentrico do Estado das revoluções liberais do século XIX. A noção de nação independente transcende a do Estado independente. Nos somos pelo exercício da soberania popular, não por uma formula concreta de institucionalização politica do exercício dessa soberania.” (IPS/ TerraViva)

* O autor é português.

(Envolverde/IPS/TerraViva)

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