sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Envolverde - Aliança entre presidentes socialistas e um pragmático


Por Mario Osava, especial para IPS/TerraViva

Um presidente pragmático, Luiz Inácio Lula da Silva, e quatro colegas sul-americanos de esquerda mostraram discrepâncias em suas perspectivas diante da crise econômica mundial, em mesa em que se juntaram na noite da quinta-feira, no Fórum Social Mundial (FSM). À tarde os quatro “socialistas” já haviam se reunido a convite da Via Campesina e do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), do Brasil, mas Lula ficou de fora.

Enquanto os presidentes Rafael Correa, do Equador, e Hugo Chávez, da Venezuela, apoiados por Evo Morales, da Bolívia, afirmaram estar construindo o “socialismo do século XXI” como a única solução para a crise, condenando o capitalismo, Lula defendeu acordos comerciais para aumentar as exportações, ajuste financeiro e investimentos estatais para evitar a recessão e o desemprego.

Fernando Lugo, do Paraguai, em discurso não tão claro, falou em promoção das potencialidades da América Latina, em integração de nações e não de comércio, saudando o FSM como a origem e o difusor de idéias e propostas que ajudaram a levá-lo à presidência de seu país em 2008, derrotando um regime autoritário que já durava 60 anos.

Lula reconheceu ter “divergências” com seus colegas, mas se referia a disputas concretas como a nacionalização do petróleo e gás na Bolívia, que afetou investimentos da estatal brasileira Petrobras, e a reivindicação paraguaia de melhor remuneração para a energia da central hidrelétrica de Itaipu, compartilhada entre Brasil e Paraguai.

Lugo foi mais diplomático na presença de Lula, nesta ocasião, do que em um encontro anterior dos quatro presidentes anticapitalistas, organizado pela Via Campesina, que não convidou o presidente brasileiro ao “diálogo” entre os promotores e simpatizantes da Alternativa Bolivariana para as Américas (ALBA), encabeçada por Chávez. Entre os bolivarianos Lugo disse que “não descansaremos em paz, e nossa alma não descansará, enquanto não atingirmos este objetivo”, referindo-se a um preço melhor e à “livre disponibilidade” da energia de Itaipu, que o Paraguai vende ao Brasil

O Brasil também enfrentou atritos diplomáticos, já superados,com o Equador, por conta da expulsão de una empresa privada brasileira por supostas irregularidades na construção de una central hidroelétrica equatoriana.

Lula destacou a boa convivência com seus colegas e a solução de disputas no “jogo da verdade” das negociações. Porém, se mantém distante da ALBA e da visão que identifica uma “crise do capitalismo” nas atuais crises financeira, ambiental e energética que o mundo enfrenta.

Em seu discurso, diante de dez mil pessoas que se apertavam no centro de exposições Hangar, o presidente brasileiro acusou os banqueiros e a especulação desenfreada de provocarem a crise financeira. A regulação dos bancos e uma “nova ordem econômica internacional” são suas receitas.

Anunciou grandes investimentos da Petrobras e um programa de construção de 500 mil moradias este ano para evitar mais desemprego. O Estado ampliará seus investimentos e a participação na economia, porque “aqui o pobre não pagará pela crise”, sustentou o presidente. Lula aposta nos investimentos públicos para espantar a crise que ameaça se instalar nas economias da região. “Nossos países foram obrigado a fazer ajustes fiscais e de redução do Estado”, disse, afirmando que agora, com a quebra dos bancos e das empresas, é o Estado que tem de salvar a todos.

Lamentou que a Rodada de Doha, de negociações da Organização Mundial de Comercio (OMC), tenha fracassado, porque “os países pobres, sobretudo a África”, ganhariam mais mercados para suas exportações. Recordou inclusive ter recomendado ao ex-presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, que salvasse Doha e portanto também sua biografia.

O livre comércio e a OMC não contam com simpatias entre seus colegas de esquerda. O presidente equatoriano Rafael Correa disse que o socialismo deste século “já existe”, e reconhece a supremacia do trabalho humano, defende a vida e o valor social dos ecossistemas, como a floresta amazônica, um pulmão do planeta. Os países amazônicos, ao contrário dos industrializados, que devastaram suas florestas, preservaram um ambiente de altíssimo valor, mas sem preço.

“O verdadeiro socialismo é feminista” e já está em construção, disse o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, que afirmou ser o socialismo “o único caminho para salvar o planeta” e que “outro mundo está nascendo na América Latina” que, em décadas passadas, foi o “laboratório que levou a receita do capitalismo neoliberal mais a fundo que outras regiões”. Identificou uma “onda revolucionária” na região.

“Se uma alternativa não for construída, o capitalismo destruirá o mundo”, sentenciou Evo Morales, para propor quatro campanhas mundiais, uma por “justiça e paz” para que este seja o século do “fim das guerras imperiais”, outra por uma nova ordem econômica de “complementaridade entre nações”. A terceira campanha teria por finalidade “salvar a Mãe Terra” do capitalismo e seus padrões de consumo.

Um “modelo alternativo já existe na América Latina” e poderá avançar muito com a integração regional, que já tem instrumentos financeiros, como o Banco do Sul, e um possível marco institucional, com a Organização dos Estados Latino-Americanos e do Caribe. Esta organização teve a fundação aprovada na Cúpula Regional de dezembro, em Salvador, Brasil, disse Rafael Correa.

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Crédito de imagem: TerraViva

(Envolverde/IPS/TerraViva)

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