segunda-feira, 30 de março de 2009

Envolverde - Apenas 39,6% da Amazônia brasileira está sob proteção


Por Redação do Amazonia.org.br

Mapa a ser publicado nesta semana por uma rede de 11 ONGs sul-americanas mostra que o Brasil é um dos países que têm proporcionalmente menos territórios indígenas e áreas protegidas na região amazônica. Estão sob proteção 39,6% da Amazônia brasileira, contra 56% da Amazônia colombiana, 79,7% da equatoriana e 71,5% da venezuelana. Somente o Peru destina uma proporção menor de sua selva às reservas florestais e às comunidades indígenas: 34,9%. As informações são do jornal Folha de São Paulo.

O mapa, produzido pela Raisg (Rede Amazônica de Informação Socioambiental Georreferenciada), é o primeiro a localizar as áreas protegidas e os territórios indígenas dos nove países amazônicos. "Em números absolutos não há como comparar a extensão dessas terras com a fatia proporcionalmente menor sob proteção no Brasil -país que tem 64,3% da Amazônia. Porém, o estudo revela que alguns países da região têm mantido a sua porção amazônica razoavelmente protegida, o que, em alguns casos, significa uma proporção grande do território nacional.

Na Colômbia, por exemplo, toda a Amazônia (que representa 43,3% do país) é considerada "reserva florestal" -embora apenas 13% estejam efetivamente em áreas protegidas. São 240 mil quilômetros quadrados em terras indígenas", diz o jornal em sua edição de hoje.

No Brasil, as terras indígenas respondem por 13% da área nacional, número que o ministro para Assuntyos Estratégicos, Mangabeira Unger, já disse considerar alto demais. Em outros países o processo de demarcação das terras indígenas é mais atrasado. O governo venezuelano não reconhece as terras, denominando-as "zonas de ocupação indígena", sobrepostas a parques nacionais.


A boa notícia do mapa é a constatação de que mesmo com 33 milhões de habitantes e 370 povos indígenas distribuídos por nove países, a Amazônia possui 41,2% dos seus 7,8 milhões de quilômetros quadrados sob algum tipo de proteção. Ainda assim, 17% da floresta já tombou em toda a região, e ainda não há um diagnóstico preciso sobre o que está acontecendo dentro de cada área protegida.

Na fronteira do Brasil com o Peru, por exemplo, há ação de madeireiros do lado peruano, apesar de haver um mosaico contínuo de áreas protegidas de ambos os lados. Esse mapeamento deverá ajudar no desenvolvimento de estratégias de conservação transfronteiriças. E ajuda a visualizar o impacto que decisões tomadas em um país podem ter sobre a floresta e as populações indígenas do vizinho.

O mapa poderá ser obtido a partir da próxima sexta-feira n o site: http://www.raisg.socioambiental.org


(Envolverde/Amazônia.org.br)

OESP - Justiça Federal pode ter varas contra desmate

Por Mariângela Gallucci, BRASÍLIA

Para agilizar processos sobre devastação na Amazônia, TRF quer juízes especializados em direito ambiental

A Justiça Federal pretende especializar em direito ambiental as varas de Manaus e Belém, cidades consideradas porta de entrada da Amazônia. O objetivo é tornar mais ágeis os processos sobre devastação da região, que chegam cada vez mais ao Judiciário, punir rapidamente os responsáveis e desestimular práticas degradantes.

A ideia foi encampada por Jirair Meguerian, presidente do Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, onde são julgados os recursos que contestam as decisões dos juízes federais que atuam nos nove Estados da Amazônia Legal e no Piauí, Minas Gerais, Goiás, Bahia e Distrito Federal. Um levantamento feito no dia 25 pelo TRF indica que nos últimos anos houve um aumento significativo no número de ações sobre devastação na região.

Em junho de 2007, existiam 8.983 processos sobre direito ambiental em tramitação nessas varas federais. Agora, há 21.105 processos sobre o assunto. No TRF da 1ª Região esses processos quase triplicaram - em junho de 2007 eram 681; hoje são 1.952.

As ações tratam de assuntos como indenização por dano ambiental, revogação ou concessão de licença, multas e outras sanções, transgênicos, agrotóxicos, unidade de conservação da natureza, crimes contra a fauna e a flora, contravenções florestais, poluição e atividades nucleares.

Segundo o desembargador aposentado Vladimir Passos de Freitas, a especialização das varas na região Amazônica tornaria as decisões judiciais mais técnicas e rápidas e seria uma demonstração para todo o mundo de que o Brasil se preocupa com problemas ambientais.

"Quando o Judiciário aprecia essas questões, quem faz isso são juízes não especializados. A matéria é dificílima, os conceitos são novos e ninguém estudou isso na faculdade", explica Freitas. "Quando se especializa a vara, o juiz frequenta cursos, conhece os peritos, desenvolve técnicas de conciliação", afirma.

Quando foi presidente do TRF da 4ª Região, que abrange Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, o desembargador criou três varas especializadas em direito ambiental. "São um sucesso absoluto."

DESENVOLVIMENTO

O aumento do desmatamento da região Amazônica preocupa os juízes. De acordo com mapeamento da degradação ambiental da Amazônia, divulgado recentemente pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), houve um crescimento da área devastada da floresta. Um levantamento preliminar das áreas degradadas registrou 14.915 km2 em 2007 e 24.932 km2 em 2008.

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, também demonstrou preocupação com a situação da Amazônia. Recentemente, ele defendeu a necessidade de uma regularização fundiária na região. "Nós sabemos que esse quadro de insegurança jurídica acaba por gerar um estado de ilegalidade permanente", disse.

Mas, segundo o presidente do STF, a discussão sobre a preservação e a proteção do meio ambiente não pode ser dissociada da ideia de desenvolvimento. "O Brasil tem um grande dever de integração social e isso tem de ser realizado mediante desenvolvimento."

Agência Câmara - Relator debaterá MP que regulariza terras na Amazônia

A Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural realiza na quarta-feira (1º) audiência pública com o deputado Asdrubal Bentes (PMDB-PA), relator da Medida Provisória 458/09, que trata da regularização fundiária na Amazônia.

A audiência será realizada às 14 horas, na sala da Presidência da comissão (sala 38 da ala C - anexo 2 da Câmara). A reunião foi sugerida pelos deputados Wandenkolk Gonçalves (PSDB-PA) e Moreira Mendes (PPS-RO).

Propostas do relator
Asdrubal Bentes fez alterações no texto da MP, que aguarda votação pelo Plenário da Câmara. Entre outras mudanças, o texto do relator permite a aquisição de terras federais ocupadas irregularmente, por pelo menos um ano ininterrupto, até 11 de fevereiro de 2009. A proposta do governo exigia que a posse fosse anterior a dezembro de 2004.

O relator também eliminou restrições, como o impedimento para pessoas jurídicas (empresas, ONGs e associações, por exemplo) se beneficiarem das novas regras.

Amazonia.org.br - Desmatamento manteve-se estável em fevereiro, diz Imazon

Apesar de a devastação ter sido similar ao mesmo mês do ano passado, especialistas acreditam que a tendência é de queda

A quantidade de florestas desmatadas na Amazônia Legal no mês de fevereiro de 2009 foi de 62 km², de acordo com o Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD), do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). O SAD mostrou que o desmatamento de fevereiro de 2009 foi muito similar ao de fevereiro de 2008, quando foram registrados 63 km².

Dos 62 km² desmatados no último mês, a maior quantidade foi em Mato Grosso, com 65%, seguido do Pará (25%), Roraima (4%), Amazonas (4%) e Rondônia (2%). Mais da metade da Amazônia Legal (66%) não foi monitorada, devido à ocorrência de nuvens na região. O Imazon também registrou 37 quilômetros quadrados de degradação florestal, oriundas de áreas que sofreram intensa exploração madeireira ou fogo. A maior parte das áreas degrada estava em Mato Grosso (75%), mas também foi relevante a degradação nos estados do Pará (15%) e Rondônia (9%).

No desmatamento acumulado no período de agosto de 2008 a fevereiro de 2009, os sete primeiros meses do calendário do desmatamento, foram detectados 749 km². Em comparação com o desmatamento ocorrido no mesmo período do ano anterior, quando o desmatamento chegou a 3.579 km², tivemos uma redução de 79%.

Apesar de Mato Grosso ser ainda o estado que mais desmata, em comparação com o mesmo período do ano passado, o Estado foi o que teve a redução mais expressiva na quantidade de desmatamento, com redução de 87%. Rondônia e Pará também apresentaram grandes quedas na quantidade desmatada (83% e 73%, respectivamente), e os Estados do Acre e Amazonas tiveram crescimento da área desmatada (22% e 3%). Em termos absolutos, no entanto, o crescimento nesses dois estados foi muito pequeno, de 3km² no Acre e 2km² no Amazonas.

Em relação à ocupação fundiária, a maioria dos desmatamentos ocorreu em áreas privadas ou de posse (74%). O desmatamento em Unidades de Conservação foi de 14% e o de Assentamentos da Reforma Agrária de 12%.

sexta-feira, 27 de março de 2009

Envolverde - Minc reitera compromisso de concluir ZEE da Amazônia em 2009


Por Lucia Leão, do MMA

O ministro Carlos Minc reiterou nesta quinta-feira (26/03) o compromisso do Ministério do Meio Ambiente de concluir, até o final deste ano, o macrozoneamento ecológico-econômico da Amazônia, que ele considera o principal instrumento para se estabelecer a fronteira da legalidade na região e planejar o seu desenvolvimento sustentável. Na saudação que fez aos participantes da reunião do Consórcio ZEE Brasil com representantes dos governos dos estados da região, Minc pediu o empenho de todos tanto na conclusão dos ZEEs estaduais onde eles ainda não foram aprovados, como na elaboração do macrozoneamento que, mais do que a soma dos documentos regionais, deve compatibilizar interesses, dirimir conflitos e orientar estratégias de interesse regional e do País.

"Vamos concluir o macrozoneamento ecológico-econômico da Amazônia até o final de 2009 e vamos colocar a Amazônia num outro patamar de desenvolvimento e dignidade para esses 25 milhões de pessoas que vivem lá e têm o direito de ter conforto, de alimentarem suas famílias e não serem os vilões da destruição da floresta e da elevação da temperatura do planeta", afirmou o ministro.

O seminário sobre o Macrozoneamento da Amazônia foi convocado pela coordenação do ZEE Brasil para conhecer o estado da arte do zoneamento ecológico-econômico de cada estado, identificar possíveis entraves e dificuldades no processo e definir como cada participante do consórcio deve intervir para superá-los e garantir celeridade. O Maranhão, por exemplo, acaba de firmar convênio com o Consórcio ZEE Brasil e receberá apoio técnico e financeiro para elaborar seu documento.

O Amapá também ainda está na fase de elaboração do documento e Tocantins já dispõe de zoneamento agroecológico. O Pará, que já realizou um macrozoneamento, optou por realizar ZEEs pontuais, como o da BR-163. Rondônia, Acre e Roraima já concluíram e estão utilizando a ferramenta enquanto Mato Grosso e Amazonas ainda dependem da aprovação do legislativo.

Segundo Roberto Vizentin, diretor do Departamento de Zoneamento Territorial do MMA, o Macrozoneamento Ecológico-Econômico da Amazônia pode ser concluído sem todos os zoneamentos estaduais.

"Isso é possível, mas não é desejável. A rigor, nós deveríamos ter começado com o macro, que daria as grandes diretrizes e os balizamentos para os zoneamentos estaduais. Mas por questões históricas isso não aconteceu. Agora estamos fazendo o caminho inverso, de partir das partes para fazer o todo. Então o ideal é que tenhamos todas as partes".

Fundo Amazônia - O ministro Carlos Minc aproveitou o encontro com os representantes dos estados amazônicos, durante a reunião do ZEE, para fazer um balanço da atuação do Ministério na região durante a sua gestão, que completará dez meses nos próximos dias. Ele disse que depois de um grande esforço de fiscalização e repressão, cujos resultados se refletiram na redução dos índices de desmatamento, o governo avançou na oferta de alternativas para o desenvolvimento da região, entre elas as ações da Operação Arco de Fogo e o Fundo Amazônia, que ontem recebeu doação de US$ 110 milhões do governo da Noruega.


(Envolverde/MMA)

Agência Brasil - Meta é fazer macrozoneamento ecológico da Amazônia Legal até 2009, diz Minc

O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, destacou hoje (26) a importância do trabalho conjunto entre ministérios e estados para cumprir a meta de fazer o macrozoneamento ecológico da Amazônia Legal até 2009.

"O zoneamento deve ser feito em parceria. Estamos semanalmente recebendo relatórios de todos os estados e recebendo cooperação de outros ministérios, como os da Pesca e o da Agricultura", disse.

O ministro ressaltou a importância de o Brasil ganhar a confiança internacional na questão do meio ambiente: "Sempre fomos considerados os 'patinhos feios' em fóruns mundiais e agora estamos, pouco a pouco, sendo reconhecidos como um país que mudou de posição."

O ministro explicou que o Brasil agora tem metas que deverão ser cumpridas. "Temos certeza que só a pressão da polícia e do Ibama [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis] não é o suficiente [para evitar a destruição da Amazônia Legal]. Você pode proibir uma pessoa de desmatar em uma região e ela simplesmente vai para uma outra, a três quilômetros de distancia. Vamos concluir esse macrozoneamento e darmos condições a 25 milhões de pessoas para trabalhar legalmente."

quinta-feira, 26 de março de 2009

Folha - Arrozeiros têm prazo até 30 de abril para deixar reserva

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Data foi definida após reunião do STF com integrantes do governo federal e da PF

Plantação na Raposa ficará a cargo da União; rizicultores poderão pedir, se provarem que agiram de "boa-fé", indenização pela colheita

Os não índios presentes na terra indígena Raposa/Serra do Sol, em Roraima, deverão sair da área até o dia 30 de abril, sob o risco de serem retirados à força pela Polícia Federal e pela Força Nacional de Segurança. Os arrozeiros não poderão colher o que já está plantado, mas receberão, se ficar comprovado que agiram de "boa-fé", indenização pela colheita perdida.

A definição da data da retirada ocorreu depois de uma reunião ontem no gabinete do ministro do Supremo Tribunal Federal Carlos Ayres Britto -com a participação do ministro Tarso Genro (Justiça), do advogado-geral da União, José Antonio Dias Toffoli, do presidente do TRF (Tribunal Regional Federal) da 1ª Região, Jirair Meguerian, e do diretor-geral da PF, Luiz Fernando Corrêa - para definir como executar a decisão do STF sobre a Raposa.

A Corte confirmou na semana passada a demarcação contínua da área, o que implica a saída dos não índios da região. "A desocupação já começou. Admitimos, porém, que os ocupantes atuais da área precisam de um tempo para remover equipamentos e desocupar o gado", disse Britto, que definiu o prazo de retirada.

Ficou acertado que o governo federal será o responsável por custear toda a logística de retirada, o que inclui desde panelas para as refeições, barracas, veículos e motoristas. Ainda não há custo estimado.

A Funai (Fundação Nacional do Índio) ficará responsável por encontrar no Estado um local para levar gado e pertences dos arrozeiros. O governador de Roraima, José de Anchieta Júnior (PSDB), que pediu que os produtores só deixem a área após colher o arroz, disse que vai cooperar. Ele colocou as forças policiais do Estado à disposição do governo federal.

Britto decidiu que o arroz já plantado ficará sob a responsabilidade do governo federal. A colheita tem início em maio.
A PF e a Força Nacional de Segurança vão começar na semana que vem a visitar as propriedades de não índios. Mais de 300 homens devem ir para a região no próximo mês.

Sobre as indenizações pelo prejuízo da colheita, Toffoli disse que o governo deverá analisar individualmente a situação dos produtores. A questão, polêmica, deve acabar sendo resolvida nos tribunais, porque os rizicultores reivindicam R$ 80 milhões de indenização por todas as benfeitorias -a Funai disponibilizou R$ 12 milhões. (FELIPE SELIGMAN E LUCAS FERRAZ)


Ibama multa fazendas da área em R$ 42 milhões

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Três fazendas na reserva Raposa/Serra do Sol (RR) serão autuadas por explorar áreas não licenciadas e de proteção ambiental. O Ibama detectou 8.578 hectares de terras usadas ilegalmente por arrozeiros. A multa será de ao menos R$ 42 milhões.

A fazenda Providência, de Paulo César Quartiero, um dos principais líderes dos arrozeiros, receberá a maior multa -de no mínimo R$ 21 milhões-, por degradar área sem licença, de reserva ambiental e de proteção permanente. Quartiero responde a mais oito processos referentes a desmatamento.

As duas outras fazendas em que o Ibama detectou irregularidades são a Canadá e a Tatu. Ivo Barili, proprietário da Tatu, cuja multa está avaliada em, no mínimo, R$ 3,5 milhões, disse que só plantou em área licenciada e deve recorrer. "A única saída que tem agora é me prenderem, para eu comer às custas do governo", disse ele.

O dono da Canadá, Genor Luiz Faccio, e Quartiero não foram encontrados para comentar o parecer.

OESP - STF dá 36 dias para arrozeiros deixarem reserva em Roraima

Por Mariângela Gallucci

Informações técnicas indicam que prazo ''é mais que suficiente'', afirma ministro Ayres Britto

O ministro Carlos Ayres Britto, do Supremo Tribunal Federal (STF), fixou ontem o dia 30 de abril como data-limite para a saída dos não-índios da reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima. A desocupação foi determinada pelo STF na semana passada, quando concluiu que apenas índios podem ocupar terras naquela área.

"Esse tempo de que os ocupantes (não-índios) precisam não pode ultrapassar o mês de abril, em nenhuma hipótese", afirmou Ayres Britto. "É um tempo mais que suficiente, segundo levantamento que fizemos, com dados técnicos, ouvindo órgãos competentes."

Segundo o ministro, a desocupação já está em andamento. "A decisão do Supremo é definitiva. Não há como contemporizar. Admitimos, porém, que os ocupantes atuais da área precisam de um tempo para remover equipamentos e desocupar o próprio gado que existe na região. São milhares de cabeças", afirmou.

A Polícia Federal e a Força Nacional, que já se encontram na área, ajudarão a garantir uma desocupação pacífica, disse o ministro. Nos próximos dias, ele deverá autorizar a entrada de representantes da União na terra indígena para fazer uma avaliação de eventuais danos ao meio ambiente e coletar informações sobre as indenizações a serem pagas aos produtores, inclusive pela atual safra. A próxima colheita, prevista para junho, deverá ser feita pela União e o destino dos produtos também será definido pelo governo federal.

A marcação da data-limite para a desocupação e o levantamento a ser feito pelo governo foram anunciados por Ayres Britto após reunião com o ministro da Justiça, Tarso Genro, o advogado-geral da União, José Antonio Dias Toffoli, o presidente do Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, Jirair Meguerian, o diretor-geral da Polícia Federal, Luiz Fernando Correa, e o vice-procurador-geral da República, Roberto Gurgel. O ministro também tinha agendado para ontem um encontro com o governador de Roraima, José de Anchieta.

Se depois de 30 de abril os não-índios insistirem em permanecer na área, o governo providenciará a retirada à força. Para isso deverão ser mobilizados homens da Polícia Federal e da Força Nacional.

O advogado-geral da União informou que, além do levantamento sobre bens e benfeitorias dos não-índios, será analisada a concessão de auxílio às pessoas que ficarem desempregadas por causa da desocupação.

O presidente do TRF da 1ª Região informou que na próxima semana viajará para a reserva.

Fundo Amazônia recebe doação de U$ 110 milhões da Noruega


Por Paulenir Constâncio, do MMA

O Fundo Amazônia recebeu nesta quarta-feira (25) U$ 110 milhões, doados pelo governo da Noruega, para serem aplicados em ações contra o desmatamento e a degradação ambiental na floresta amazônica. É a primeira doação recebida pelo fundo, que até junho contará com mais U$ 18 milhões, desta vez do governo alemão.

O BNDES, gestor dos recursos, começa a receber até junho as cartas-consultas de organizações não-governamentais, do setor privado e de governos estaduais, municipais e federal interessados em ações socioambientais voltadas para a redução de emissão de CO2, que estejam de acordo com o previsto pelo Plano de Prevenção de Combate ao Desmatamento na Amazônia (PPCDAM) e no Plano Amazônia Sustentável (PAS). O dinheiro aplicado não implica em reembolso, salvo nos casos em que ficar provado que o executor não cumpriu o previsto. A aplicação será fiscalizada em todas as fases de implantação dos projetos.

As pré-propostas serão analisadas pelo Banco e, caso sejam aprovadas, serão reenviadas aos interessados para o detalhamento técnico e gerencial. A gestão de áreas protegidas, zoneamento ecológico-econômico, conservação e uso sustentável, monitoramento e manejo florestal, além do pagamento por serviços ambientais são algumas das aplicações previstas pelo fundo.

O Ministério do Meio Ambiente participa do fundo em um comitê técnico. Seus projetos também serão submetidos ao crivo do BNDES em igualdade de condições com qualquer outra proposta. As regras para aprovação das propostas foram definidas na criação do fundo e análise de viabilidade é feita pelo banco.

A captação de recursos tem como base a redução do desmatamento. Cada vez que o Brasil provar que reduziu sua área degradada, o que implica em redução das emissões de carbono, terá direito à captação de recursos correspondente de acordo com os preços internacionais. Os 200 milhões de toneladas de carbono, correspondentes ao período que vai de 1996 até 2005, preveem um aporte de até U$ 1 bilhão, dos quais os U$128 milhões já assegurados fazem parte. Segundo o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, outros três países estão com as negociações avançadas para anunciar mais doações aos fundos. Ele não adiantou quais "para não influenciar as negociações".

Minc garantiu à embaixadora da Noruega, Turid Euzebio, que assinou o acordo de doação pelo governo norueguês, que "cada centavo do dinheiro será aplicado na defesa da floresta, na defesa do planeta". O ministro considerou a doação generosa, devido ao montante de recursos, mas também um exemplo, salientando que os noruegueses sempre investiram em ações voltadas para as questões indígenas e ambientais em outros países. A embaixadora citou o Congo e a Tanzânia como países que já receberam recurso para conservação de suas florestas tropicais.

O BNDES deverá lançar, também, um sítio eletrônico do próprio Fundo Amazônia, onde pretende dar um tratamento de "transparência" aos assuntos relacionados à captação e aplicação dos recursos, segundo informou seu presidente, Luciano Coutinho.

Combate ao desmatamento - Criado no ano passado, o Fundo Amazônia é um mecanismo inédito, proposto pelo governo brasileiro, durante a Conferência das Partes, em Bali, promovida pela ONU para debater as condições climáticas do planeta. As doações podem ser feitas por governos, empresas e pessoas físicas, comprometidas com a redução das emissões de carbono provenientes do desmatamento e a degradação da floresta, que é responsável por 20 por cento das emissões de CO2.

Pela primeira vez, o combate ao desmatamento incluirá uma série de ações abrangentes de forma a promover o desenvolvimento sustentável da Amazônia. As ações serão focadas na prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento. A captação de recursos é baseada na
efetiva redução de emissões. Não se trata de captar recursos para reduzir, mas sim de reduzir para captar recursos que sejam investidos diretamente em mais redução.

As taxas de desmatamento anuais empregadas no cálculo das reduções de emissões serão confrontadas, a cada ano, com a média das taxas de desmatamento de períodos de dez anos.

O BNDES poderá captar dos doadores um montante de recursos proporcional à redução das emissões. A vantagem, do fundo, segundo explicou o ministro Carlos Minc, é que ele é "soberano" - isto é, os doadores nem sequer têm assento nos conselhos que definem os
projetos onde o dinheiro será gasto. Isso permitiu ao governo brasileiro receber doações internacionais sem comprometer a soberania a soberania.


(Envolverde/MMA)

quarta-feira, 25 de março de 2009

O Brasil Amazônico


Por Dal Marcondes

Nas próximas décadas o mundo precisa encontrar novos caminhos para se desenvolver, alimentar sua população e criar riquezas que permitam continuar seu desenvolvimento humano, científico e tecnológico. E qual será o papel do Brasil neste cenário. 53% do território brasileiro é a Amazônia, com sua grande diversidade de cenários, povos, culturas, fauna e flora. E este cenário precisa ser compreendido pela sociedade brasileira como o grande diferencial que o País tem a oferecer ao mundo.

O Brasil sem a Amazônia é igual a muitos países do mundo. Tem grandes cidades e precisa encontrar diferenciais a partir de modelos baseados em uma mesmice global. O que o Brasil tem a oferecer para o mundo nas próximas décadas e séculos é justamente aquilo que hoje é visto por alguns como “despesa” e “obstáculo” para o desenvolvimento. A Amazônia é o grande diferencial do Brasil dentro do cenário de futuro comum do planeta Terra.

Uma civilização baseada em baixas emissões de carbono passa, necessariamente, pela compreensão do papel da maior floresta tropical do mundo não apenas em termos de “serviços ambientais”, mas também em conhecimento entranhado em sua imensa biodiversidade.

Uma das arrogâncias recorrentes da humanidade é achar que já detém conhecimento suficiente para fazer qualquer coisa. Isto pode ser visto nos livros de história em diversos momentos. Durante a II Guerra Mundial esta arrogância chegou ao extremo e muitos governantes acreditavam ter um “domínio superior” das ciências e das tecnologias. Foi o auge da mecânica como conhecimento. Poucos anos depois a eletrônica ocupou este espaço, com início dos processos de miniaturização que hoje faz uma TV caber em um telefone celular. A junção da mecânica com a química e a eletrônica levou a primeira geração de astronautas ao espaço. Mas não foi, ainda, o auge da civilização.

Acreditar que já se chegou ao limite é não apenas arrogante, mas estúpido. Nos anos setenta muitos futurólogos previam um mundo bem diferente do de hoje, com grandes corporações controlando tudo através de supercomputadores. O conhecimento seria uma mercadoria de muito valor, controlado por poucos. Onde erraram? Uma vez conversei com Alvin Toffler, especialista em análise de tendências e autor de O Choque do Futuro, de 1970, e A Terceira Onda, continuação escrita dez anos depois, e minha pergunta principal foi: Onde erraram? “Não previram o computador pessoal transformado em eletrodoméstico em todas as casas, e principalmente a internet mudou tudo”. O conhecimento deixou de estar nas mãos de poucos e passou a estar disponível em uma escala impossível de ser prevista nos anos 70 do século passado.

Pois é, alguns cenários são praticamente imprevisíveis. Alguns podem dizer que a internet já existia nos anos 70, o que é verdade. Mas ela existia dentro do modelo que Toffler e outros “futurólogos” trabalhavam, ou seja, dentro de cenários controlados, como o acadêmico, o militar ou o corporativo. Não estava ao alcance de um toque no teclado de um computador pessoal. Este é um bom exemplo de porque é perigoso achar que já se sabe tudo. Desde a antiguidade chegam os ensinamentos de Sócrates, de que a sabedoria ultrapassa limites e não há como percebê-la na sua totalidade. “O verdadeiro sábio é aquele que se coloca na posição de eterno aprendiz”.

Em relação à Amazônia esta é uma verdade absoluta. Não sabemos quase nada sobre ela e é preciso compreender seu potencial de descobertas. O olhar sobre a região deve incluir uma imensa curiosidade no mais amplo sentido humanista. Nos próximos anos é preciso investir em ciência na Amazônia, fomentar pesquisas e estimular doutores a ampliar o conhecimento e o saber sobre a região e seus múltiplos biomas.

Os olhares do mundo estão sobre a Amazônia e a sociedade brasileira deve conseguir mostrar sabedoria e capacidade de governança sobre a região. O Brasil sem a Amazônia não representa nenhuma vantagem para o mundo ou para os brasileiros. No entanto, o Brasil Amazônico pode ser o fator decisivo para fazer brotar o germe de uma economia baseada no conhecimento, no uso eficiente de recursos naturais e energia e na capacidade de gestão da biodiversidade. Talvez o próximo estágio do conhecimento, uma biocivilização.

* Dal Marcondes é jornalista, diretor de redação da Envolverde, recebeu por duas vezes o Prêmio Ethos de Jornalismo e é Jornalista Amigo da Infância pela Agência ANDI.


(Agência Envolverde)

Envolverde - Ministérios do Meio Ambiente e da Justiça vão intensificar combate ao desmatamento


Por Ana Luiza Zenker, da Agência Brasil

Brasília - Os órgãos dos ministérios do Meio Ambiente e da Justiça vão aumentar a integração e intensificar os esforços no combate ao desmatamento. Foi o que anunciou ontem (24/03) o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, após a primeira reunião da Comissão Interministerial de Combate aos Crimes e Infrações Ambientais (Cicca), criada por uma portaria interministerial no início deste mês.

Entre as medidas que devem ser tomadas, está a mudança no foco das grandes operações conjuntas. Isso porque, de acordo com ele, depois das operações realizadas até agora, o perfil do desmatamento mudou: migrou para outras áreas e agora ocorre em polígonos menores, de até 100 hectares.

“Isso vai implicar novas táticas, que implicam equipes com mais mobilidade, menores, direcionadas, áreas que não estavam no foco e agora entraram, municípios novos; e a questão mais relevante é a integração permanente das operações, mudando o foco em conseqüência da mudança do foco dos próprios desmatadores”, disse Minc.

O ministro afirmou ainda que também devem ser iniciadas no próximo mês operações com o Banco do Brasil, de crédito para custeio e investimento agrícola. “Temos toda uma programação forte para não jogar [somente] nas costas da Justiça e também do Ibama [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis] esta responsabilidade [de manter a diminuição no ritmo do desmatamento]”, explicou.

O secretário nacional de Segurança Pública, Ricardo Balestreri, acrescentou que as ações promovidas pela Cicca são principalmente de prevenção, mas há também operações de repressão qualificada, com a presença da Polícia Federal e da Força Nacional de Segurança, que atuam nas raízes dos crimes ambientais, em ações conjuntas também com a Polícia Rodoviária Federal e com o Ibama.

“Porque obviamente hoje o desmatamento cada vez mais tem uma característica de crime organizado e este crime precisa ser combatido”, concluiu.


(Envolverde/Agência Brasil)

OESP - Lista de campeões do desmate passa de 36 para 43 municípios

Por Lígia Formenti, BRASÍLIA

Ano passado, as 7 cidades incluídas derrubaram juntas 122% mais floresta do que em 2007

Subiu de 36 para 43 o número de municípios classificados como os maiores desmatadores da Amazônia. A lista, preparada pela primeira vez no ano passado, foi revisada de acordo com novos critérios estabelecidos pelo governo. Para o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, o fato de a relação ter engordado pouco mais de 19% não significa que medidas de controle do desmatamento na região tenham sido insuficientes.

Ele sustenta que o aumento se deve às metas estabelecidas tanto para o ingresso quanto para a saída dos municípios da lista negra. "Estou sendo cauteloso e conservador", justificou.

Há três municípios candidatos a sair da lista, todos de Mato Grosso: Alta Floresta, Porto dos Gaúchos e Nova Maringá. Desse grupo, no entanto, duas cidades apresentaram um aumento do desmatamento de 2007 para 2008. Em Porto dos Gaúchos, a área derrubada saltou de 12 para 30 quilômetros quadrados. Em Nova Maringá, o corte passou de 17 para 18 km2.

Apesar disso, os municípios atendem a duas das três condições exigidas por uma portaria, assinada ontem por Minc, para sair da lista: é preciso que o desmatamento na cidade tenha sido igual ou inferior a 40 km2; a média de derrubada de floresta no biênio 2007-2008 tem de ser equivalente, no máximo, a 60% da média do biênio 2005-2006; além disso, os municípios precisam também monitorar, por meio do Cadastro Ambiental Rural, pelo menos 80% do seu território.

Nesse cálculo não devem ser consideradas as unidades de conservação e as terras indígenas homologadas. A expectativa do ministro é de que em pouco tempo as três cidades comprovem tal cadastramento.

No ano passado, a relação de maiores desmatadores foi formulada com base em um único critério: eram incluídas as cidades que, reunidas, respondiam por 50% do desmatamento na região. Uma portaria assinada ontem pelo ministro definiu novas condições para que cidades ingressem no ranking de maiores desmatadores.

Para inclusão na lista, são observadas as seguintes variáveis: área total de floresta desmatada, área de floresta desmatada nos últimos três anos, aumento da taxa de desmatamento em pelo menos 3 dos últimos 5 anos, desmate em 2008 igual ou superior a 200 km2.

Das cidades incluídas na relação de maiores desmatadores, quatro são do Pará, uma do Maranhão, uma de Mato Grosso e uma de Roraima. Juntas, elas foram responsáveis por 1.375 km2 de desmatamento. Isso é mais do que o dobro do que havia sido derrubado nas mesmas cidades em 2007: 619 km2. O maior crescimento do desmate foi registrado em Feliz Natal. Em 2007, 22 km2 de floresta haviam sido derrubados. Em 2008, houve salto para 207 km2.

Apesar desses números, Minc garante que o desmate na região vem caindo - 40% em nove meses. Algo que ele atribui ao aumento da fiscalização deflagrada ano passado. "Dos 36 municípios listados como campeões em desmatamento, 24 apresentaram queda dos índices de derrubada de floresta. Só não saíram da lista porque as regras são rigorosas."

Folha - Lista do desmate na Amazônia tem mais sete cidades

Por HUDSON CORRÊA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Agora são 43 os municípios que estão proibidos de fazer novos desmatamentos e terão de recadastrar fazendas

Três cidades de Mato Grosso desmataram menos, mas seguem na lista por não terem recadastramento de imóveis já concluído

O Ministério do Meio Ambiente ampliou ontem de 36 para 43 o número de municípios incluídos na lista dos que mais desmatam na Amazônia, respondendo por 55,6% do que foi devastado em 2008.

Na prática, a inclusão na lista significa a proibição de novos desmatamentos, mesmo os permitidos por lei, ou seja, em até 20% da propriedade, além do recadastramento das fazendas e aumento na fiscalização. A lista inicial com 36 municípios foi estabelecida no início de 2008, em reação ao aumento do desmatamento, e a atualização está prevista a cada ano. Ontem ficou estabelecido que só cidades com devastação anual de até 4.000 hectares, o equivalente a 25 vezes o parque Ibirapuera em São Paulo, poderão deixar a lista. Esse critério permitiria a exclusão de Alta Floresta, Porto dos Gaúchos e Nova Maringá, em Mato Grosso, mas as cidades continuam incluídas por não terem concluído o recadastramento de imóveis -exigência que podem cumprir dentro de dois meses.

Entre os que entraram na lista, o ministro Carlos Minc (Meio Ambiente) citou como novos líderes do desmatamento Marabá, Pacajá e Itupiranga, no Pará, mas não soube explicar por que o desmate cresceu. Em Marabá, por exemplo, a devastação passou de 15,5 mil hectares em 2007 para 33,8 mil em 2008. A prefeitura reconheceu os casos de desmatamento, mas ponderou que o combate à destruição da floresta amazônica é de responsabilidade dos governos federal e estadual.

Também ingressaram na lista ontem Mucajaí (RR), Feliz Natal (MT), Tailândia (PA) e Amarante do Maranhão (MA). A devastação em Mucajaí saltou de 6.100 hectares em 2007 para 21,6 mil hectares em 2008. O ministro afirmou acreditar que a devastação em Roraima esteja ocorrendo em assentamentos rurais. O município de Tailândia entrou para a lista apesar de ter sido o principal alvo da Operação Arco de Fogo, de combate ao desmatamento, realizada pelo Ibama e pela Polícia Federal em fevereiro de 2008.

"Incluir Tailândia é jogo para a mídia. O governo não apresenta política pública para regularização fundiária do município e incentivo para preservação da floresta em pé", afirmou o secretário municipal do Meio Ambiente de Tailândia, Josefran da Silva Almeida. A Folha não conseguiu falar com os outros cinco municípios.

Leia a lista das 43 cidades http://www.folha.com.br/090835

O Globo - Aumenta lista de desmatadores da Amazônia

Por Catarina Alencastro

Sete cidades são incluídas na relação do Ministério do Meio Ambiente; agora 43 concentram 55% do desmatamento

BRASÍLIA. O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, anunciou ontem que a lista dos municípios que mais desmatam a Amazônia aumentou. Sete cidades se somaram às 36 que, desde o ano passado, figuram na lista do desmatamento do bioma. Agora são 43 cidades que concentram 55% do desmatamento total da região. Pela primeira vez, Roraima, estado que tradicionalmente tem baixo índice de degradação ambiental, aparece no levantamento.

Para o ministro, há uma clara relação entre o desmatamento no município de Mucajaí (RR) e os assentamentos de reforma agrária lá instalados.

Ao todo, a cidade, que destruiu 1.490 km² de floresta nos últimos 11 anos e tem 44% de seu território ocupados por uma reserva indígena, tem cinco assentamentos.

— Roraima sempre teve um baixo desmatamento, mas aconteceu uma coisa inusitada: neste município houve um aumento de mais de 200 km². É interessante, porque isso está associado a uma área de assentamento.

O que mostra que a gente tem que ter uma política específica para isso, que vai valer para outras áreas também — disse Minc.

Nas outras cidades que entraram para o rol de preocupações da área ambiental do governo também há grande número de assentamentos. Marabá (PA), que já desmatou 7.540 km² de floresta, tem 75 assentamentos.

Pacajá (PA), com 4.568 km² desmatados, tem 18 assentamentos.

Itupiranga (PA) degradou 4.319 km² e tem 35 assentamentos.

Amarante do Maranhão (MA) responde por 1.772 km² e conta com 18 assentamentos.

Feliz Natal (MT), 1.866 km² desmatados, e Tailândia (PA), 2.024 km² desmatados, têm apenas um assentamento cada. O desmatamento registrado é o acumulado de 1997 a 2008.

Três cidades de Mato Grosso devem sair da lista em breve Esta foi a primeira revisão da lista dos 36 municípios considerados prioritários no combate ao desmatamento, elaborada no ano passado. Minc assinou ontem duas portarias que estabelecem os critérios para os municípios entrarem e saírem do levantamento.

Segundo ele, Alta Floresta (MT), Porto dos Gaúchos (MT) e Nova Maringá (MT) poderão sair da lista em breve.

As três cidades cumpriram as metas de diminuição do desmatamento, mas não concluíram o cadastramento rural e ambiental, uma das exigências para a exclusão. No quesito desmatamento, é preciso que a área devastada identificada no último levantamento por satélite do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) tenha sido inferior a 40 km² e que a média do desmatamento dos dois últimos anos seja inferior a 60% do registrado de 2004 a 2006.

Para ser incluída na lista, basta que a cidade tenha aumentado sua taxa de desmatamento por três anos seguidos, e que o último levantamento tenha registrado devastação anual superior a 200 km².

Minc disse que o objetivo do ministério é o desmatamento ilegal zero, mas achou positivo que as 36 cidades que inauguraram a lista e respondiam por 50% do total do desflorestamento da Amazônia hoje sejam responsáveis por 42% do total.

Segundo ele, a ideia não é estigmatizar esses municípios, mas sim focar em alternativas para tirá-los desta situação.

Valor - Cresce lista de 'campeões ' do desmatamento na Amazônia

Por Mauro Zanatta, de Brasília

A lista dos municípios "campeões do desmatamento" na Amazônia cresceu de 36 para 43 localidades nos últimos 12 meses. Mas alguns dos "campeões" incluídos na primeira relação do Ministério do Meio Ambiente conseguiram reduzir a devastação da floresta em 60%, o que pode levar à exclusão de três municípios de Mato Grosso da nova lista nos próximos dois meses - Alta Floresta, Porto dos Gaúchos e Nova Maringá. Outras duas localidades também seriam beneficiadas neste ano.

Mesmo na relação anterior, onde constavam 36 municípios, foi possível reduzir de 50% para 42% o índice de devastação da floresta no período, segundo o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc. "Os municípios que entraram na lista são os que estão desmatando muito, ou desmataram muito nos últimos três anos, e exigem atenção especial", disse o ministro. "Naqueles 36 da lista anterior houve uma ação e eles diminuíram bastante: 24 dos 36 reduziram muito. Eram 50% e passaram a representar 42% do desmatamento." Foram incluídas na nova relação Amarante do Maranhão (MA), Feliz Natal (MT), Marabá, Pacajá, Tailândia e Itupiranga (PA), além de Mucajá (RR).

A lista dos "campeões" do desmatamento foi instituída em dezembro de 2007 por decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O objetivo era inibir o avanço do desmatamento ilegal na Amazônia. Os donos de terras nesses municípios são obrigados a recadastrar seus imóveis no Incra e a fornecer informações georeferenciadas para posterior mapeamento. Com isso, o governo identifica os donos e pode aplicar multas, embargar as propriedades com desmatamento ilegal, proibindo a comercialização de seus produtos e bloqueando a concessão de crédito de instituições oficiais.

Ao anunciar a nova lista, Minc anunciou a retomada da "Operação Arco Verde" de combate ao desmatamento na Amazônia. Coordenada pela Casa Civil, a ação terá um orçamento de R$ 1 bilhão para recuperar áreas desmatadas, estimular a regularização fundiária e oferecer assistência técnica aos produtores da região. "Queremos metas mais rigorosas e colocamos novos municípios na lista, mas o objetivo é criar uma série de incentivos às boas práticas para que saiam da lista", disse Minc.

O ministro fez um breve resumo das ações ambientais do governo Lula. "A política ambiental melhorou, porque o desmatamento caiu 45%, graças a medidas como restrição do crédito pelo Banco Central, decreto de crimes ambientais, portais de controle, ações contra os cem grandes desmatadores, além do leilão da madeira pirata e do boi pirata", afirmou. Mesmo assim, Minc afirmou estar descontente com o desmatamento. "A política está funcionando, mas ainda é insuficiente. A gente quer desmatamento ilegal zero", disse o ministro, que adiantou algumas novas ações contra a devastação. "Vamos fazer o 'QG' de combate ao desmatamento, mais oito portais de controle de rodovias, mais mil fiscais do Ibama e do Instituto Chico Mendes e várias ações do 'Arco Verde' para dar alternativas de crédito de tecnologia para esses municípios fazer a coisa certa. Ou seja, se desenvolver sem desmatar."

OESP - O Instituto Chico Mendes se perde nas Veredas

Por Marcos Sá Corrêa*

Sem freio nem motorista, desembestado na contramão, o Brasil está em campanha para se livrar das leis que protegem as últimas relíquias de sua exuberância natural.

Há um anúncio na TV dizendo que "o País vai parar" se elas não mudarem. Mas a publicidade é o de menos. Santa Catarina disparou na frente e, concretamente, vota até o fim do mês na Assembleia Legislativa o Projeto 0238, que desfigura o Código Ambiental do Estado a ponto de instituir a licença automática de obras não embargadas e reduzir de 30 para 5 metros a barreira de matas ciliares nos cursos d?água.

A desculpa dos políticos é alforriar, com o projeto, cerca de 167 mil pequenos agricultores, espremidos pelas faixas de proteção permanente em propriedades de 50 hectares. Mas, na prática, o novo código atende antes de mais nada "os grandes", avisa o promotor Luís Eduardo Souto, em artigo no site da Apremavi, uma ONG da serra catarinense.

Os "grandes", Souto esclarece, são 1,9% de latifundiários que dominam 32,52% da área cultivada no Estado. O "agricultor familiar", que lhes serve de pretexto, já conta com a "autorização legal do código vigente para utilizar economicamente as áreas de preservação permanente, desde que o faça mediante sistema de manejo agroflorestal sustentável".

Mas isso não faz diferença. Mente-se tanto no Brasil em favor dos pobres que dez projetos federais disputam, em Brasília, a honra de amputar 9,5 milhões de hectares de parques nacionais e outros tipos de reserva. Somados pelo repórter Aldem Bourscheit, dos confins da Amazônia às fronteiras do RS, eles dariam para cobrir um Estado do tamanho de SC. Só o deputado Asdrúbal Bentes quer acabar com 6,5 milhões de ha em florestas nacionais e parques no Pará.

O presidente do Instituto Chico Mendes, Rômulo Mello, alega que os projetos dos parlamentares são fracos, "sem informação técnica detalhada". Seria plausível caso Mello se dedicasse a desmontá-los. Mas não foi isso que fez, no domingo passado, falando em programa de TV sobre o Parque Nacional Grande Sertão Veredas. Como encarregado oficial de zelar pelas unidades de conservação do governo federal, ele pôs no ar dúvidas estranhas sobre a legitimidade do processo que resultou no parque, estabelecido num lugar "onde tem gente". E ainda aproveitou as câmeras para propor a revisão do Código Florestal Brasileiro.

Com defensores como Mello, o Ministério do Meio Ambiente não precisa de opositores. Mello, pelo visto, ignora que o Grande Sertão Veredas surgiu de um processo exemplar. Leva a assinatura de Maria Tereza Pádua, a funcionária pública que,em outros tempos, instituiu quase tantos hectares de áreas protegidas quanto os milhões que as autoridades agora pretendem suprimir.

terça-feira, 24 de março de 2009

G1 - Lista dos que mais desmatam sobe de 36 para 43

O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, anunciou nesta terça-feira (24) a ampliação da lista dos municípios que mais desmatam a Amazônia. Agora, 43 municípios estão na lista do governo, que contava antes com 36 localidades.

Os produtores dessas regiões ficam impedidos de conseguir novos financiamentos agrícolas até fazerem um novo georreferenciamento (mapeamento exato de todas as terras) e pedirem autorização para o Incra. Esses locais são responsáveis por mais de 50% do desmatamento da Amazônia.

Os sete municípios incluídos na lista são: Marabá (PA), Pacajá (PA), Itupiranga (PA), Mucajaí (RR), Feliz Natal (MT), Tailândia (PA) e Amarante do Maranhão (MA). Em todos esses, houve aumento do desmatamento em relação a 2008, quando foi lançada a primeira portaria com restrições para os 36 municípios que mais desmatam a Amazônia. Segundo Minc, em todos eles também há assentamentos de trabalhadores Sem-Terra.

Nesses 43 municípios, também fica proibida a emissão de novas licenças ambientais e a liberação de novas áreas para plantio por parte do Incra e dos demais órgãos ambientais.Para serem excluídos da lista, eles têm de ter concluído 80% do georreferenciamento do seu território e ter reduzido os índices de desmatamento.

Segundo Minc, três municípios estão próximos de serem excluídos da lista, mas ainda precisam concluir o georreferenciamento das propriedades rurais: Alta Floresta (MT), Porto dos Gaúchos (MT) e Nova Maringá (MT).

Amazonia.org.br - Eduardo Jorge fala sobre impactos do consumo paulistano à Amazônia

Por Fabíola Munhoz, do Amazônia.org.br

Em entrevista exclusiva ao site Amazonia.org.br, o secretário do Verde e Meio Ambiente da Prefeitura de São Paulo, Eduardo Jorge, falou sobre as políticas da metrópole para contribuir com o combate ao desmatamento da Amazônia, admitindo a grande responsabilidade que o consumo paulistano tem com relação à destruição da floresta.

Jorge fala sobre um decreto criado pela Prefeitura em 2005 (decreto 46380/05) que passou a exigir o uso de madeira legal em obras públicas e apresentou os principais pontos do Projeto de Lei (PL) 530/08, hoje tramitando na Câmara Municipal, que prevê a adaptação da cidade às mudanças climáticas.

Questionado sobre ações da sua pasta que promoveriam o consumo de carne sustentável, já que a pecuária é considerada uma das atividades que mais causam o desmatamento na Amazônia, o secretário aponta o vegetarianismo como principal saída para a questão. "Minha posição, enquanto cidadão, é evoluir em direção ao livramento do uso da carne na alimentação humana".

Confira, abaixo, a entrevista na íntegra.

Amazonia.org.br: Qual é o compromisso que a prefeitura de São Paulo tem hoje com relação ao consumo sustentável de madeira?

Eduardo Jorge: A prefeitura de São Paulo criou um decreto em setembro de 2005 e assinou com o Greenpeace o compromisso de somente utilizar madeira legal em suas obras, como a construção de escolas, creches e hospitais. Foi a primeira cidade do Brasil a assinar esse compromisso e, a partir do decreto de 2005, toda licitação da prefeitura passou a exigir que a empresa construtora do prédio púbico apresente o DOF (Documento de Origem Florestal) da madeira utilizada, a cada medição.

De lá para cá, mais 30 e poucas prefeituras assinaram acordos semelhantes e também o governo do Estado de São Paulo adotou o procedimento. Agora avançamos para assinar o protocolo Madeira é Legal, com mais cerca de 20 entidades, dentre as quais o Sindicato das Indústrias da Construção Civil do Estado de São Paulo (SindusCon-SP). É um passo importante, pois não só o setor público, mas também, o setor principal da construção civil do Brasil, que está em São Paulo, assume essa responsabilidade.

Amazonia.org.br: Que outras medidas de conservação do meio ambiente a prefeitura pretende adotar?

Eduardo Jorge: A compra de madeira legal faz parte da estratégia da prefeitura de SP de assumir uma postura ativa na questão do combate ao aquecimento global. A prefeitura tem um plano de combate ao aquecimento global e não está esperando pelos outros para fazer sua parte. Pensamos que o governo federal faz pouco e deve fazer muito mais, mas não queremos só cobrá-lo. Já estamos neutralizando cerca de 20% dos nossos gases causadores do efeito estufa, com a captação de metano dos aterros sanitários, gerando energia para 700 mil habitantes. Com isso, já arrecadamos 70 milhões de reais em créditos de carbono entre os anos de 2007 e 2008. A prefeitura está assumindo sua posição de liderança.

Amazonia.org.br - E quais são os projeto de sua secretaria que podem contribuir com a defesa da Amazônia?

Eduardo Jorge: Precisamos defender a Amazônia, já que seu desmatamento é responsável por 75% das emissões do Brasil, colocando o país nos primeiros lugares entre os emissores de gases do efeito estufa no mundo. Não podemos só cobrar o governo federal, que não está fazendo o seu papel, assim como os estados de Pará e Rondônia. Aqui no sul do país, onde se consomem os produtos da Amazônia de forma não sustentável, não podemos deixar que continuem consumindo impunemente. Queremos cobrar do governo federal e os governos estaduais para que defendam a floresta amazônica, mas também fazer a nossa parte, não consumindo material de desmatamento ilegal na Amazônia. É isso que São Paulo pode fazer para ajudar o Brasil e defender a Amazônia, combatendo o aquecimento global.

Amazonia.org.br: O DOF, que dá legalidade à madeira, não garante a sustentabilidade do produto. Sendo assim, a política da prefeitura de comprar madeira que detenha esse documento não é insuficiente para coibir o desmatamento?

Eduardo Jorge: A prefeitura exige o DOF e entrega sua cópia ao Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama). É responsabilidade do governo federal fazer essa checagem.

Amazonia.org.br: Na sua opinião, essa fiscalização tem se mostrado eficiente?

Eduardo Jorge: Quem pode dizer isso é o governo federal. A prefeitura não tem condições de verificar o DOF no Pará, ou no Amazonas. Nossa função é exigir o DOF, e comprová-lo diante dos órgãos federais, mas quem tem que fiscalizar é o Ibama.

Amazonia.org.br - O que o senhor pensa sobre a ideia de se exigir o selo FSC (Forest Stewardship Council), que atesta a sustentabilidade, para a madeira empregada em obras públicas?

Eduardo Jorge - A posição da secretaria é evoluir da madeira legal para a certificada. No entanto, a posição da área jurídica da Prefeitura é de que isso possa causar problemas ao cumprimento da lei de licitações federal. Há uma polêmica dentro da Prefeitura, sobre se podemos ou não exigir a certificação sem ferir a lei das licitações. A posição da Secretaria é de que devemos exigir, mas na área jurídica da Prefeitura não está definido se isso pode ser feito.

Uma questão é saber se podemos impor essa condição, sem sabe se haverá oferta suficiente de madeira certificada. A posição da Secretaria do Verde é de que a exigência seja progressiva, tornando obrigatório o emprego da madeira certificada em todas as obras publicas e privadas de São Paulo em 5%, no primeiro ano, aumentando-se em outros 5% sua quantidade a cada ano. Desse modo, daqui a 20 anos, por exemplo, será possível ter 100% da madeira usada em obras públicas e privadas certificada. Se a porcentagem definida para o aumento progressivo for de 10% ao ano, em 10 anos só será usada a madeira certificada.

Outro problema é o risco de não haver oferta suficiente de madeira certificada para o consumo. Mas, a intenção é de que em 10 ou 20 anos, todas as obras públicas e privadas usem madeira certificada. Com isso, você vai garantir um mercado seguro e permitir a expansão da oferta. Será um mecanismo institucional para garantir a expansão da oferta. Já sugeri que essa exigência progressiva seja proposta pelos vereadores como emenda ao nosso PL municipal de adaptação às mudanças climáticas, que já está na Câmara para votação. É o PL 530/08.

Amazonia.org.br - Quais os objetivos do PL 530/08?

Eduardo Jorge: Esse é o projeto mais importante de políticas públicas de mudanças climáticas do Brasil e será a primeira lei desse tipo no país. São cinqüenta artigos com centenas de incisos e parágrafos, que tratam da questão da construção civil, do transporte, da eficiência energética, da saúde e do estimulo à expansão de áreas verdes. Será uma reforma completa da forma de produzir, de viver e conviver na sociedade, de modo que essa possa se adaptar a um plano de combate ao aquecimento global. O objetivo é que a sociedade possa progressivamente se livrar do combustível fóssil. É o projeto mais importante que o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, mandou à Câmara dos Vereadores hoje. É um projeto que serve de modelo para todas as cidades do Brasil atualmente.

Amazonia.org.br - O senhor acredita que será fácil a aprovação desse projeto na Câmara?


Eduardo Jorge - É um projeto que mexe com as formas de viver, de produzir e de construir. Então, é lógico que tem que haver um debate muito profundo, com a participação dos vários partidos, do governo, da oposição, dos empresários e dos trabalhadores. O projeto está lá para receber emendas e sugestões. A Secretaria do Verde tem expectativa, pelo poder de exemplo que São Paulo tem, de que o projeto seja aprovado neste ano para estimular outros municípios a fazerem o mesmo e também para dar uma contribuição efetiva ao encontro de Copenhagen no fim do ano. Seria importante que levássemos o projeto aprovado ao encontro.

Amazonia.org.br - O programa Madeira é Legal assinado por prefeitura, Estado de São Paulo, sociedade civil organizada e grandes construtoras terá seu comprimento fiscalizado pelo poder público?


Eduardo Jorge: Quem assinou, assinou com consciência. A participação no programa é uma manifestação livre de consciência e de vontade dos participantes, que não pode ter tutela do Estado. Eles é que vão cuidar para que o protocolo seja cumprido. Não podemos nem devemos ficar com postura de desconfiança com relação aos nossos parceiros.

Amazonia.org.br - A pecuária é considerada uma das atividades que mais causam o desmatamento na Amazônia. São Paulo pretende assinar algum compromisso para compra de carne que não se origine da destruição da floresta?


Eduardo Jorge: Existe um programa de fiscalização da Secretaria de Gestão da Prefeitura, como orientação do prefeito e dos secretários, que verifica se origem da carne é legal, não usa trabalho escravo e se a produção não desmata. Porém, a questão mais importante não é essa, mas sim, a dependência do consumo da carne na alimentação humana.

Minha posição, enquanto cidadão, e não como secretário, é evoluir em direção ao livramento do uso da carne na alimentação humana. Hoje já existe tecnologia de alimentação e a humanidade pode prescindir totalmente do uso da carne. A opção pelo vegetarianismo é a única atitude realmente conseqüente para se livrar desse tipo de dependência.

Amazonia.org.br - Sua secretaria prevê algum projeto de educação ambiental que conscientize as pessoas no sentido do abandono ao consumo de carne?


Eduardo Jorge: Não. Essa é uma questão filosófica e a Prefeitura não pode nem tem autoridade para impor suas posições filosóficas às pessoas numa democracia. Essa é uma escolha pessoal. A pessoa deve ter liberdade para fazer essa opção filosófica. No mais, uma postura da Prefeitura nesse sentido seria um constrangimento indevido. O trabalho de educação sobre as conseqüências do consumo de carne já é feito pela Sociedade Brasileira de Vegetarianismo e outras entidades, que fazem um trabalho muito bom e bem organizado. Esse é um trabalho que deve partir da sociedade e não uma iniciativa que o estado deve ter.

Amazonia.org.br - São Paulo tem interesse em pagar por serviços ambientais da Amazônia?


Eduardo Jorge: Em primeiro lugar, São Paulo tem que resolver o caso dos próprios serviços ambientais. A Secretaria do Verde já levantou essa questão, que é tratada pelo PL 530. Primeiro, vamos defender o pagamento pelos serviços florestais daqui, para produzir água e defender as nossas áreas de Mata Atlântica.

Amazonia.org.br - Sua secretaria pretende tomar alguma medida para amenizar os efeitos do descumprimento da Petrobrás às exigências judiciais para que reduzisse os índices de enxofre no diesel por ela produzido?

Eduardo Jorge: Esse prejuízo a Petrobrás já deu ao Brasil. Nós estamos fazendo a parte da busca pela eficiência energética, que está bem definida com o objetivo de substituir o uso de combustível fóssil no transporte coletivo da cidade. Para isso, temos metas e prazos. O diesel sujo é mais prejudicial à saúde humana. Mas, do ponto de vista do aquecimento global, tanto faz o diesel ser sujo ou o limpo. Ambos aquecem do mesmo jeito e devem ser substituídos, levando-se à necessidade de termos combustíveis renováveis, mais limpos. Isso tudo está previsto no nosso PL.

Amazonia.org.br - Estudos indicam que, com a destruição da Amazônia, a região de São Paulo pode vir a se tornar um deserto. O que pensa disso? Pode estar aí um bom motivo para os paulistanos se preocuparem com a defesa da floresta?


Eduardo Jorge: Eu acredito no estudo. Mas, temos preocupação em preservar a Amazônia não só por isso. Afinal, temos o compromisso com a floresta, mas também com o mundo todo. Eu não sou nacionalista de só me preocupar com a minha casa, meu país. Tenho uma obrigação com a humanidade e, numa cidade como São Paulo, mais ainda. Outra visão seria um nacionalismo muito bobo.

Amazonia.org.br - O senhor acredita que é possível a adaptação da sociedade a uma nova consciência ambiental, numa cidade do tamanho de São Paulo?

Eduardo Jorge: Acredito na mudança porque acredito na democracia. Quando você expõe os dados, o povo evolui para uma posição mais esclarecida e exige que os políticos e empresários mudem seus hábitos profissionais. Do modo como os cientistas já sabem o que acontece e exigem providências, o povo esclarecido precisa ter apenas acesso aos dados para que passe a exigir que os políticos e empresários mudem suas atitudes.

Crédito da imagem: Portal da Prefeitura de São Paulo


(Envolverde/Amazônia.org.br)

segunda-feira, 23 de março de 2009

O Globo - Incra tem culpa maior em desmatamentos

Por Catarina Alencastro

Auditoria pedida por Lula comprova que derrubada de florestas é maior em áreas de assentamentos no MT

BRASÍLIA. Em setembro último, quando o Ministério do Meio Ambiente divulgou a lista dos 100 maiores desmatadores da Amazônia, caiu como uma bomba a inclusão de seis assentamentos do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária). Para acalmar ânimos acirrados, o presidente Lula pediu auditoria para checar se os dados estavam corretos, já que o Incra alegava existirem “erros crassos” no documento. O GLOBO teve acesso ao resultado da auditoria, que revela ser a situação ambiental dos assentamentos do Incra no Mato Grosso ainda mais grave: o desmatamento total nos assentamentos listados é 18% maior que o que apareceu nas autuações originais.

O Incra foi multado pelo desmatamento de 292.070 hectares em oito assentamentos. Mas o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis), com imagens do satélite Prodes, descobriu que o desmatamento foi de 330.290 hectares da Floresta Amazônica, 57.890 hectares a mais que o calculado antes.

Acordo para recuperar áreas As multas impostas ao Incra chegaram a R$ 265,5 milhões.

Segundo o Ibama, os assentamentos desmataram sem autorização de órgão ambiental, impediram a regeneração de floresta primária e não tinham licença ambiental. O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, diz que foi feito acordo para que, no lugar de pagar em dinheiro, o Incra recupere áreas degradadas nos assentamentos e doe áreas destinadas à reforma agrária para unidades de conservação.

— A ideia é fazer, começando por esses assentamentos do Mato Grosso, planos de recuperação e doação de terras a unidades de conservação. É a primeira vez que implementamos a conversão de multa nessas duas áreas — disse Minc.

A auditoria diz que os 330.290 hectares desmatados representam 59% do total dos sete assentamentos autuados. Oito assentamentos do Incra constavam da lista dos 100 maiores desmatadores da Amazônia. No entanto, o Lenita Noman, no município de Nova Bandeirantes (MT), ficou fora do levantamento do Ibama porque havia divergências sobre a exata localização e delimitação de sua área.

O Itanhangá-Tapurah, que aparecia na 43aposição, saltou para o primeiro lugar após a auditoria porque a lista original tinha um erro: os 2.820 hectares desmatados eram, na verdade, o passivo ambiental herdado pelo Incra e que este deixou de recuperar, incorrendo aí em crime ambiental. Na realidade, o assentamento foi autuado em 2006 pelo desmatamento de 68.744 hectares. Técnicos do Ibama descobriram, via satélite, que o desmatamento foi ainda maior: 76.616 hectares, 72% da área do assentamento.

Desflorestamento cresceu a partir de 2002 O laudo também derruba um dos principais argumentos do presidente do Incra, Rolf Hackbart, à época, de que os desmatamentos eram antigos.

Apesar de os assentamentos terem sido criados na década de 90, o Ibama concluiu que 5 9 % dos desmatamentos aconteceram depois de 2002.

O Boa Esperança I, II e III, por exemplo, teve 80% de seus 15.620 hectares desmatados entre 2002 e 2007.

“Através da análise da dinâmica do desmatamento ocorrido no interior dos assentamentos, foi observado que a supressão da vegetação nativa ocorreu após o ano de 2002 (59%). A dinâmica também indicou, para a soma total das áreas de assentamento, tendência no crescimento do desmatamento nos anos de 2002 e 2005, ocorrendo diminuição consecutiva nos anos 2006 e 2007”, diz o texto. A redução no ritmo do desmatamento nesses últimos anos deve-se ao esgotamento dos recursos florestais, sugere o Ibama.

O documento é claro em dizer que o Incra é responsável pelos crimes ambientais cometidos nos assentamentos, já que os assentados estão sob tutela do órgão até receberem os títulos das terras. Segundo o órgão ambiental, o Incra falhou em não comunicar os danos ao meio ambiente. O levantamento também identificou outros crimes, como desmatamento e ocupação de Áreas de Preservação Permanente (APPs).

Documento comprova erros

Na segunda semana de março, a área ambiental do governo discutiu o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal.

Na pauta, um relatório encomendado pelo Ministério do Meio Ambiente a uma consultoria externa para avaliar a evolução do projeto, que está completando cinco anos. O documento é categórico ao assinalar os problemas causados pelos assentamentos de reforma agrária.

Em amostragem sobre 170 assentamentos criados até 2002, metade foi erguida em áreas com 50% ou mais de cobertura florestal nativa. Cinco anos depois, cerca de 45% deles tinham menos de 20% de floresta primária.

Outra amostragem, com 207 assentamentos criados no governo Lula entre 2003 e 2006, revela a tendência de aumento no desmatamento.

Já o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, evitou polemizar com o Incra e minimizou os resultados da avaliação referendada por sua pasta.

— É importante que se frise que esses assentamentos, entre 2000 e 2002, foram criados no governo FH. De lá pra cá, esses assentamentos mais recentes são bem melhores. Você tem quatro tipos diferentes de assentamento: os do horror da ditadura, os do semihorror do Fernando Henrique, as melhorias do (Guilherme) Cassel e a quarta geração, que é esse acordo de demarcação prévia — disse.

Envolverde - Toda grilagem será perdoada


Por Redação do Greenpeace

Relator da Medida Provisória para regulamentar terras ocupadas por posseiros apresenta parecer que acaba favorecendo grileiros
O deputado Asdrúbal Bentes (PMDB/PA) relator da Medida Provisória 458, que legaliza a ocupação de áreas ocupadas por posseiros na Amazônia, assinada pelo presidente Lula no dia 10 de fevereiro, apresentou nesta quinta-feira (19/2) seu parecer sobre o documento. Depois de passar pelas mãos de Bentes, a MP, que já era problemática por não definir critérios para diferenciar os pequenos agricultores e trabalhadores que por direito podem ser beneficiados com titulo de propriedade, daqueles que grilaram terra e desmataram ilegalmente, ficou ainda pior.

“O governo apresentou essa proposta argumentando que os pequenos produtores, há muitos anos instalados na região, seriam os grandes beneficiados. A proposta apresentada por Bentes, no entanto privilegia empresas privadas e latifundiários, que estão destruindo a floresta Amazônica”, diz Marcio Astrine, da campanha da Amazônia, do Greenpeace. O texto permite que empresas e proprietários de mais de um imóvel sejam beneficiados e permite que as áreas sejam vendidas imediatamente após o título ser dado pelo INCRA, ou seja, coloca essas terras como mercadoria para serem negociadas.

A punição para os que descumprirem a legislação ambiental também foi abrandada pelo deputado. Os direitos da MP só serão suspensos depois de uma ampla defesa do infrator, que poderá recorrer até às vias judiciais. Antes, a devolução das terras e a perda do direito seriam imediatos.

Além de incluir novas medidas para beneficiar os grileiros, o texto do deputado mantém os pontos negativos do documento original. Os imóveis até 400 hectares, como previa o texto anterior, continuam dispensados de vistorias. Nesses casos, o governo aceitará uma declaração do próprio beneficiado descrevendo a situação em que sua porção de terras se encontra, o que abre brecha para fraudes. O deputado também mantém a não obrigatoriedade de publicidade sobre os processos de regularização, entre muitos outros exemplos.

A regularização fundiária na Amazônia é fundamental para se garantir o respeito ao meio ambiente, das terras indígenas e do espaço para quem quer viver e trabalhar na Amazônia sem destruir a floresta e para termos condições de chegar ao desmatamento zero em 2015. “Da maneira está sendo feita, a regularização fundiária só serve para anistiar os erros do passado e estimular sua repetição no futuro”, diz Astrini.

O parecer de Bentes agora segue para votação na Câmara, o que deve acontecer nas próximas semanas.


(Envolverde/Greenpeace)

Agência Câmara - Comissão discute aplicação de leis da Amazônia Legal no Maranhão

A Comissão da Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional realiza audiência pública nesta terça-feira (24) para discutir a aplicação de decreto (6.321/07) que inclui o Vale do Mearim, no Maranhão, na área da Amazônia Legal. O debate foi proposto pelo deputado Zé Vieira (sem partido-MA).

Ele argumenta que a inclusão dos municípios do Vale do Mearim na Amazônia representará prejuízos para produtores da região, que terão que se submeter à legislação ambiental mais restritiva. O parlamentar lembra que não há semelhança entre os biomas da região e os da Amazônia. "Nossa Região é de cocais de babaçu".

Zé Vieira argumenta que os municípios do Vale do Mearim só foram incluídos na área da Amazônia Legal, depois da criação da Sudene e da Sudam, em razão de acordos políticos, para justificar a operação do Banco da Amazônia naquela área. "Não há como compreendermos que uma Região tipicamente do Nordeste possa ser incluída no bioma da Amazônia".

Convidados
Foram convidados para o debate:

- o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc;

- o presidente do Ibama, Roberto Messias Franco;

- o presidente do Incra, Rolf Hackbart;

- o diretor do Inpe, Gilberto Câmara;

- o presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Kátia Regina de Abreu; e

- representantes do Sindicato Rural de Bacabal (MA); da Associação dos Criadores do Maranhão; da Associação dos Criadores do Vale do Mearim.

A audiência está marcada para as 14 horas no plenário 7.

Envolverde - STF dá com uma mão e tira com a outra


Por Ana Paula Caldeira Souto Maior e Raul Telles do Valle, do ISA

Decisão final do Supremo Tribunal Federal no julgamento da demarcação da Terra Indígena Raposa-Serra do Sol reconhece a legitimidade do processo de demarcação e a necessidade de retirada dos produtores agrícolas de dentro da área por eles irregularmente ocupada. Impõe, porém, condições para o uso do território que podem se transformar em orientações a serem aplicadas em outros casos.

Num dos julgamentos mais longos da história, e repleto de situações insólitas, o STF não desapontou os Macuxi, Ingarikó, Taurepang, Wapichana e Patamona, que há mais de trinta anos lutam para ver o seu direito reconhecido à terra que descrevem como“de rio a rio”. O tribunal reconheceu seu direito à terra, que já foi palco de invasão de garimpeiros, de fazendeiros e mais recentemente de arrozeiros, os últimos que se recusavam a deixar a terra da União.

O ato final do julgamento foi marcado por um extenso voto do ministro Marco Aurélio Mello - que tomou um dia inteiro e levou ao desespero inclusive seus colegas de toga - e por uma intervenção repleta de recados pessoais ao ministro Gilmar Mendes, que aproveitou a ocasião para espinafrar alguns desafetos que o acusavam de ser contrário aos direitos dos povos indígenas.

O voto do ministro Marco Aurélio foi contrário à demarcação em área contínua e, portanto, contra a retirada dos ocupantes ilegais. Em sua extensa exposição, citou todas as alegações genéricas de perigos na demarcação de uma terra indígena em área de fronteira – já afastadas pelos demais ministros – e encontrou inúmeras nulidades no mesmo processo judicial que havia servido para paralisar o processo de desintrusão iniciado em 2008.

Já o ministro Gilmar Mendes, embora tenha votado a favor da legalidade da demarcação, desfilou argumentos contra a forma como as terras indígenas vêm sendo demarcadas, sem participação dos entes federativos supostamente afetados – estados e municípios – e com base em uma idéia de indígenas que vivem apenas de caça, pesca e coleta, o que, segundo ele, não corresponderia mais á realidade atual. Baseado em estudos realizados por um especialista em solos a respeito do procedimento administrativo da demarcação da Raposa-Serra do Sol, afirmou estranhar os grandes vazios demográficos que existiriam dentro da área, onde algumas aldeias chegam a estar a mais de 150 km uma da outra.

Um dos consensos apresentados nas fundamentações dos votos favoráveis a demarcação da Raposa foi que o marco constitucional para reconhecer o direito indígena à terra deveria ser a Constituição de 1988, que, na imagem usada pelo ministro Ricardo Lewandovsky, teria “tirado uma fotografia” da situação da ocupação territorial indígena na época de sua promulgação e a tinha cristalizado. Embora não tenha sido bem debatida, essa tese leva a acreditar que os índios só teriam direito às terras efetivamente ocupadas em 1988, e quem foi expulso ou retirado por qualquer forma de suas terras tradicionais anteriormente a essa data já não teria mais direito ao retorno. O voto do mkinitros relator ressalva aqueles povos que não estivessem em suas terras por terem dela se afastado contra a sua própria vontade, mas não houve uma definição com relação a essa questão, que deverá ser objeto de futuras decisões da Corte.

Os dez votos favoráveis aos índios da TI Raposa-Serra do Sol entenderam que o procedimento administrativo de demarcação realizado pela Funai não foi eivado de nenhum vício, que a forma de demarcação é de reconhecimento integral da área, uma vez atendidos os critérios constitucionais, que a demarcação em faixa de fronteira não compromete a integridade territorial e a soberania do País, asseguradas às Forças Armadas a sua defesa. Além disso, derrubaram o argumento de que demarcação de terras indígenas pode inviabilizar a existência de unidades da federação ou comprometer o seu desenvolvimento econômico. Este entendimento é válido para todas as demais demarcações realizadas com base da CF de 1988.

19 condições

Além de decidir sobre o caso concreto da demarcação e desintrusão da TI Raposa-Serra do Sol, o tribunal se debruçou também sobre as 18 condições impostas pelo ministro Carlos Alberto Menezes de Direito para que este caso fosse encerrado a favor dos índios, e que supostamente são válidas para outras terras indígenas.

O ministro Direito foi o responsável pela primeira interrupção no julgamento, ainda em agosto do ano passado, quando pediu vistas do processo para refletir melhor sobre o caso. No retorno, já em dezembro, inovou ao acrescentar a seu voto 18 condições para a demarcação, dessa e de outras terras indígenas. Quase todas restringem o direito dos índios à posse permanente e ao usufruto exclusivo dos recursos naturais existentes em suas terras, geralmente subordinando-os às estratégias de defesa nacional, como se a posse indígena fosse uma ameaça ao País. Como nenhuma dessas condições estavam presentes no pedido original – que se restringia ao reconhecimento ou não da Raposa-Serra do Sol como terra indígena – os demais ministros não tiveram condições de analisa-las, e praticamente não houve debate com relação a elas.

Grande parte das condições estipuladas no voto do ministro Direito, e ontem formalmente acatadas pelo relator Carlos Ayres Britto, são repetições do texto constitucional, sem nenhuma inovação, como a que diz que as riquezas minerais não são de usufruto exclusivo dos povos indígenas. Outras, no entanto, e sem maior fundamentação, inovam radicalmente as regras de demarcação de terras indígenas e inclusive contrariam tratados internacionais assinados e ratificados pelo País.

Um dos exemplos é a condição no 5, que estipula que “a expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico e o resguardo das riquezas de cunho estratégico a critério dos órgãos competentes (o Ministério da Defesa, o Conselho de Defesa Nacional) serão implementados independentemente de consulta a comunidades indígenas envolvidas”. Essa condição, além de arbitrária, contraria expressamente o disposto no art.6o da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, ratificada pelo Brasil, que dá às populações indígenas o direito de se manifestarem previamente à construção de obras de infraestrutura em suas terras. Não ficou claro se o STF julgou inconstitucional esse dispositivo da convenção, ou se essa decisão significa que o Brasil está denunciando (rescindindo) a convenção que se comprometeu a cumprir.

Mas esse não é o ponto mais preocupante das condições impostas no julgamento final. A de número 17 veda expressamente a ampliação de terras indígenas já demarcadas. Houve inclusive uma breve discussão entre os ministros Direito e Brito sobre se essa vedação deveria alcançar todas as terras indígenas existentes ou apenas aquelas que já tenham sido demarcadas segundo o modelo estipulado na Constituição Federal de 1988, mais adequado à sobrevivência física e cultural das populações indígenas.

O ministro Direito expressou entendimento de que a vedação de ampliação de terras indígenas – que implica em supressão de direitos adquiridos pelos índios, considerando o marco temporal da CF de 1988, só poderia afetar as demarcações que foram feitas com base nos quatro critérios constitucionais nelas estabelecido, sendo possível portanto a ampliação para as demarcações realizadas anteriores à CF. O entendimento do ministro Direito, mesmo sem muito espaço para discussão, não prevaleceu, mas por sua coerência poderá servir de base ao questionamento desta condição.

Um dos casos fortes para testar esta orientação será o dos Guarani do Mato Grosso do Sul, que vivem em terras extremamente diminutas exatamente porque foram demarcadas antes de 1988, segundo critérios totalmente distintos dos existentes atualmente. Hoje esse povo sofre com a miséria, o alcoolismo e os suicídios, problemas associados à falta de território suficiente à sobrevivência física e cultural.

Ontem o ministro Gilmar Mendes sugeriu a décima-nona condição, acatada, que confirma a participação efetiva dos estados e municípios no procedimento administrativo de demarcação. O ponto é polêmico porque o GT encarregado do procedimento tem caráter eminentemente técnico, sendo presidido por um antropólogo. Como em geral os poderes públicos locais não são favoráveis à demarcação de terras indígenas, por contrariarem os interesses econômicos das oligarquias locais, esse pode ser um novo fator de atraso ou impasse na conclusão dos relatórios e demais etapas do processo de demarcação.

A retirada imediata dos ocupantes ilegais da terra indígena será supervisionada pelo ministro relator Ayres Britto e executada pelo TRF da 1ª Região, em uma decisão inusitada do presidente do STF, que se baseou em um caso nos Estados Unidos, onde os juízes têm poder de fazer as leis, ao contrário do Brasil, onde cabe a eles apenas executá-las.

(Envolverde/ISA)

Folha - Faça o que eu digo

Por MARINA SILVA

NO ENCONTRO com Barack Obama, o presidente Lula pediu ao presidente americano pronta adesão à Convenção da Biodiversidade, renegada por George Bush. Oportuna cobrança, pois em 2010 entra em vigor o sistema de pagamento pelo uso da biodiversidade, que deverá gerar recursos importantes para conservação em países megadiversos, como o Brasil.

O problema é que, na maioria das vezes, temos posição externa ousada e correta. Internamente, contudo, fazemos mal a lição de casa. O Brasil ratificou a Convenção em 1994 e até agora não temos uma Lei para disciplinar o acesso aos recursos genéticos. Em 1995 apresentei ao Senado projeto com essa finalidade. Não foi votado até hoje.

Em 2003, o Ministério do Meio Ambiente articulou para que o governo apresentasse projeto atualizado e submetido a negociação exaustiva com todos os setores interessados.

Após cinco anos de complexa construção de consensos, sob a coordenação da Casa Civil, chegamos a um texto. Quando de minha saída do governo, faltavam apenas consultas a comunidades tradicionais e agricultores familiares para enviá-lo ao Congresso Nacional no segundo semestre de 2008.

Inesperadamente, o MMA interrompeu o processo para elaborar outra proposta, atendendo a demandas do Ministério da Agricultura, entre elas a de criar sistema paralelo de gestão dos recursos genéticos da agrobiodiversidade. Pretende-se retalhar artificialmente a gestão da biodiversidade para acomodar pressões diversas.
Continua-se a bater na tecla de que uma justa partilha de benefícios, para remunerar os conhecimentos tradicionais associados ao uso dos recursos naturais, limitará a pesquisa e os usos comerciais. Mas, sem regras, esses conhecimentos poderão ser apropriados por empresas a troco de nada ou quase nada.

Uma leitura otimista do recado do presidente Lula a Obama é a de que o governo resolveu, finalmente, pegar à unha a criação do regime nacional de acesso à biodiversidade, entendendo que ratificar a Convenção não é só apor uma assinatura. Implica replicar aqui as diretrizes do acordo internacional, numa política una, com força para alinhar ações públicas e privadas. Se essa leitura for a correta, em breve deverá chegar ao Congresso o texto do projeto do Executivo, sem retrocessos e condizente com o espírito da Convenção.

Se, ao contrário, a pauta foi sugerida ao presidente apenas para rechear seu discurso e projetar mais uma vez o óbvio cacife ambiental brasileiro, em prol dos biocombustíveis, é perda de tempo e de algo mais. De credibilidade, por exemplo.

sexta-feira, 20 de março de 2009

Folha - Supremo aprova retirada de não índios de reserva em RR


Por FELIPE SELIGMAN
LUCAS FERRAZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Desocupação da Raposa será em "curto" período, diz relator, que deve decidir prazo hoje

Decisão pela demarcação contínua baliza outros 22 processos que tramitam no STF sobre demarcação de terras indígenas no país

Os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) confirmaram ontem, por 10 votos a 1, que a demarcação da terra indígena Raposa/Serra do Sol, em Roraima, deve ser contínua, com a consequente saída dos não índios da área. Apesar de o Supremo ter declarado que o cumprimento da decisão será "imediato", ficará a cargo do relator da ação, Carlos Ayres Britto, definir os prazos para a retirada dos arrozeiros.

Considerada histórica pelos próprios ministros, a decisão põe fim a uma polêmica iniciada durante o governo FHC (1994-2002), quando a área foi demarcada. A reivindicação dos índios, do uso exclusivo da terra, durava há quase 30 anos. A saída dos não índios não deverá ser imediata, apesar de Britto ter dito que a medida será "a curto prazo". Durante o julgamento, ele chegou a propor 15 dias. Ele disse que pretende definir a data ainda hoje, após falar com o ministro Tarso Genro (Justiça) e o presidente do TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região) -que tem jurisdição em vários Estados, entre eles Roraima. Ficará a cargo da Justiça Federal, sob supervisão de Britto, monitorar o cumprimento da decisão. Não se sabe o número exato de não índios na reserva. O Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), responsável por reassentar as famílias em outro local, afirma que já foram removidas 264 famílias, das quais 105 foram reassentadas. Restariam 47. A Fundação Nacional do Índio, que cuida das indenizações, afirma que 285 propriedades já foram restituídas. O órgão diz que a mesma família pode ser dona de uma ou mais propriedades. Os rizicultores, no entanto, são cinco, donos de seis fazendas que ocupam 1,5% da reserva, localizada na fronteira entre Venezuela e Guiana. O julgamento sobre a demarcação da Raposa começou em agosto de 2008, quando foi interrompido pelo ministro Carlos Alberto Direito. Na ocasião, o relator propôs manter a demarcação, conforme decreto do presidente Lula de 2005.

Ao retomar o debate, em dezembro, Direito acompanhou Britto, mas apresentou 18 condicionantes que deverão ser observadas em Roraima e demais reservas indígenas. Ontem, o ministro propôs outra condição, acatada pelos colegas: que Estados e municípios envolvidos sejam ouvidos durante o processo de demarcação. Até então, segundo o ministro Gilmar Mendes, eles eram ouvidos só uma vez. O TRF-1 terá de averiguar o cumprimento das condições. Esses pontos devem ser observados pelo governo para demais processos de demarcação - há outras 22 ações sobre o tema que tramitam no STF.

O presidente da Funai, Márcio Meira, comemorou a decisão, "histórica", segundo ele, e uma vitória dos índios do país. Um dos líderes dos rizicultores, Paulo César Quartiero disse estar "desnorteado". "Acabaram com a possibilidade de Roraima ser produtiva." Segundo ele, ficou inviável produzir no Estado. "Só se for no céu. Teríamos de fazer um segundo piso, o primeiro já foi."

Arrozeiros se negam a deixar reserva indígena

DA AGÊNCIA FOLHA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM MANAUS

Poucos minutos depois de o STF (Supremo Tribunal Federal) decidir pela demarcação contínua da terra indígena Raposa/ Serra do Sol, dois arrozeiros ouvidos pela Folha afirmaram que não irão aceitar pacificamente a determinação de retirada dos não índios da área.

"Daqui a três, quatro dias você vai ver todo mundo na cadeia. Vamos ser alimentados pelo governo federal." Dessa forma reagiu o produtor rural Ivo Barili ao ser questionado sobre como avaliava a decisão do STF.
"Ou vai para a cadeia ou vai morto. Eu estou em plena colheita. Tenho cerca de 20 mil sacas de arroz lá dentro [na terra indígena]. Vou sair correndo?", questionou o produtor.

O rizicultor Ivalcir Centenaro disse que quer deixar a área só após colher os "cerca de 600 hectares" da lavoura que tem plantado. Indagado se reagiria caso tentem retirá-lo antes disso, respondeu: "Vou meter bala". (JOSÉ EDUARDO RONDON e KÁTIA BRASIL)

Crédito da imagem:Alan Marques/Folha Imagem

OESP - Saída de arrozeiros de reserva deve ser imediata, diz STF

Mariângela Gallucci, BRASÍLIA

Além de manter área indígena em forma contínua, por 10 votos a 1, corte criou espécie de estatuto para demarcação

O Supremo Tribunal Federal (STF) fixou ontem regras para as futuras demarcações de terras indígenas e ordenou a retirada imediata de arrozeiros que ocupam áreas dentro da reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima. Segundo a maioria dos ministros, somente índios podem ocupar a área. Um ponto, contudo, ficou sem definição: quando se poderá usar força policial para retirar os arrozeiros que descumprirem a ordem de sair.

O relator do caso no STF, Carlos Ayres Britto, afirmou que hoje deverá anunciar quando essa retirada ocorrerá. "Não tenho o prazo, mas devo definir amanhã (hoje)", disse o ministro, ressaltando esperar que os arrozeiros deixem a área sem necessidade da retirada forçada. "É um imediatamente a curto prazo", acrescentou. "Estou autorizado a comandar o processo de desocupação."

Ontem, finalmente foi concluído o julgamento da ação que questionava a demarcação da reserva. Por 10 votos a 1, o tribunal decidiu que a demarcação deve ser contínua. Eles também resolveram derrubar uma liminar que garantia a permanência de produtores na área até o julgamento final da ação.

ESTATUTO

Além da definição dos limites da reserva indígena, a decisão de ontem marcou uma nova modalidade de atuação do Supremo. Por maioria de votos, os ministros praticamente legislaram, ao impor uma espécie de estatuto para demarcação de terras no País.

Com 19 pontos, esse "estatuto" prevê, por exemplo, que em processos de demarcação de terras indígenas deverá ser assegurada a participação dos entes federativos envolvidos. No caso da Raposa Serra do Sol, houve a reclamação de que nem todos os envolvidos foram citados no processo. Os ministros também estabeleceram ontem que "é vedada a ampliação da terra indígena já demarcada". Isso evitará que sejam pedidas revisões de áreas indígenas.

O tribunal definiu nesse novo modelo demarcatório que "é vedada, nas terras indígenas, a qualquer pessoa estranha aos grupos tribais ou comunidades indígenas, a prática da caça, pesca ou coleta de frutas, assim como de atividade agropecuária extrativa".

Na sessão de quarta-feira, o presidente do STF, Gilmar Mendes, já tinha dado sinais de descontentamento em relação à forma como os processos de demarcação são tocados atualmente. "O processo de demarcação é muito sério para ser tratado pela Funai (Fundação Nacional do Índio)", afirmou na ocasião.

O STF também decidiu ontem delegar parte do acompanhamento do processo de desocupação da área indígena para o presidente do Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, que está sediado em Brasília, mas tem jurisdição em vários Estados, dentre os quais Roraima.

Ayres Britto pretendia conversar ontem com o presidente do TRF, Jirair Meguerian, e com o ministro da Justiça, Tarso Genro, a fim de ter um panorama sobre a situação na reserva e para, hoje, definir o prazo de retirada forçada. Segundo ele, caberá ao Ministério da Justiça definir quem fará a operação de retirada, se a Polícia Federal ou a Força Nacional.

SAFRA


Um dos advogados que representaram os arrozeiros no processo chegou a pedir ao STF que desse um prazo para que fosse feita a retirada, porque há uma safra em andamento. No entanto, Ayres Britto deu sinais de que não se sensibilizará com isso: "Quem plantou nas terras sob litígio o fez por sua conta e risco."

Na sessão de ontem, além de definir o "estatuto da demarcação", os ministros do STF ouviram o voto de Gilmar Mendes, o único que faltava para que o julgamento fosse concluído. Mendes contou sua experiência pessoal, disse que foi colega de um índio na escola e atuou em processos de demarcação na época em que era procurador da República, nos anos 80.

Mendes, que esteve na reserva no ano passado, fez críticas à falta de presença do Estado na região: "Ali se percebe a falta de presença do Estado. Os índios estão entregues um pouco à própria sorte. Precisam, para se deslocar a Boa Vista, para coisas prosaicas da vida, caminhar dois dias até um local para tomar um ônibus para Boa Vista. Dez horas de ônibus. É esse o quadro. Abandono completo do poder público. Faz-se a demarcação e nada mais", criticou.

Índios que foram a Brasília para acompanhar o julgamento saíram do Supremo cantando e dançando, em comemoração à decisão contra os arrozeiros.

O QUE O SUPREMO DECIDIU

O usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos existentes nas terras indígenas pode ser relativizado sempre que houver relevante interesse público da União

O usufruto dos índios não abrange o aproveitamento de recursos hídricos e potenciais energéticos, que dependerá sempre da autorização do Congresso Nacional

O usufruto dos índios não abrange a pesquisa e a lavra de riquezas minerais, que dependerá sempre de autorização do Congresso. Será assegurada a eles participação nos resultados

O usufruto dos índios não abrange a garimpagem nem a faiscação. Dependendo do caso, pode ser obtida a permissão da lavra garimpeira em determinadas áreas

O usufruto dos índios não se sobrepõe ao interesse da política de defesa nacional. A instalação de bases, unidades e postos militares, a expansão da malha viária, a exploração de alternativas energéticas e o resguardo das riquezas a critério dos órgãos competentes serão implementados independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas e à Funai

A atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal fica garantida e se dará independentemente de consulta a comunidades indígenas envolvidas e à Funai

O usufruto dos índios não impede a instalação, pela União, de equipamentos públicos, redes de comunicação, estradas e vias de transporte, além de construções necessárias à prestação de serviços públicos

O usufruto dos índios na área afetada por unidades de conservação fica sob responsabilidade do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade

O Instituto Chico Mendes responderá pela administração da área de unidade de conservação, com a participação dos índios

O trânsito de visitantes e pesquisadores não-índios deve ser admitido na área afetada à unidade de conservação nos horários
e condições estipulados pelo Instituto Chico Mendes

Deve ser admitido o ingresso, o trânsito e a permanência de não-índios no restante da área da terra indígena, com condições estabelecidas pela Funai

O ingresso, o trânsito e a permanência de não-índios não pode ser objeto de cobrança de quaisquer tarifas ou quantias de qualquer natureza

A cobrança de tarifas também não poderá incidir ou ser exigida
em troca da utilização das estradas, equipamentos públicos, linhas de transmissão de energia ou de quaisquer outras instalações colocados a serviço do público

As terras indígenas não poderão ser objeto de arrendamento ou de
qualquer ato ou negócio jurídico que restrinja o pleno exercício do usufruto e da posse direta pela comunidade jurídica ou pela comunidade indígena

É vedada a qualquer pessoa estranha aos grupos tribais ou comunidades indígenas a prática da caça, pesca ou coleta de frutas, assim como de atividade agropecuária extrativa


Os bens do patrimônio indígena, o usufruto exclusivo das riquezas
naturais e das utilidades existentes nas terras ocupadas, bem como a renda indígena, gozam de plena imunidade tributária, não cabendo a cobrança de quaisquer impostos, taxas ou contribuições

É vedada a ampliação da terra indígena já demarcada

Os direitos dos índios relacionados às suas terras são imprescritíveis e estas são inalienáveis e indisponíveis

É assegurada a efetiva participação dos entes federativos em todas as etapas do processo de demarcação

OESP - A vulnerabilidade de nossas cidades

Por Washington Novaes

A queda, no pátio de um estacionamento, de um avião monomotor que um suicida tentava atirar contra o maior shopping center de Goiânia, na hora em que circulavam no seu interior milhares de pessoas, mais uma vez evidencia vulnerabilidades muito preocupantes de grandes aglomerados urbanos - já às voltas com momentos até de ingovernabilidade e domínio territorial por bandos criminosos ou grupos sociais inconformados (perueiros, motoqueiros, comerciantes irregulares etc.). Nem por isso, entretanto, ouve-se um início de discussão no setor público sobre a necessidade urgente de macropolíticas para esses aglomerados, que crescem e se verticalizam continuamente, quase sem nenhuma disciplina ou orientação, ao sabor apenas das chamadas "forças do mercado", mas com progressiva perda da qualidade de vida pelas populações, insegurança crescente, inundações e até, em certos setores econômico-sociais, inviabilização gradual.

A sequência de fatos é impressionante: uma pessoa já acusada de quatro delitos consegue, sem ser piloto habilitado e quase só com conhecimentos adquiridos na internet, apoderar-se de um monomotor numa cidade de quase 200 mil habitantes, bem próxima de Brasília. Voa em direção a Goiânia e começa por dar voos rasantes sobre o aeroporto dessa capital e passa a poucos metros de um Boeing. Embora seguido por um Mirage e um Tucano da Força Aérea, faz vários outros voos rasantes à beira de arranha-céus e de outro shopping e, sem ser impedido, arremete contra o shopping, onde caiu a dez metros da entrada principal. Quantas vulnerabilidades em terra e no ar, próximas à capital do País e à de um Estado, região metropolitana com quase dois milhões de pessoas!

É inevitável que a memória recue ao tempo em que Mao Tsé-tung tentava impor na China uma política de desconcentração populacional absoluta, mas por estratégia militar. Entendia ele que a concentração humana e/ou econômica criava alvos para o inimigo e abria caminho para a dominação militar. Sem concentração, esse eventual inimigo teria de ocupar todo o país - tarefa impossível. Pela mesma razão, tentava impor com a desconcentração uma política que levasse cada pessoa ao mais próximo possível da autossuficiência na produção de alimentos e outros itens de que necessitasse. Uma de suas radicalidades que o levaram à perda do poder.

Não precisamos, porém, tornar-nos maoístas dépassés para enxergar que precisamos introduzir rapidamente a discussão sobre macropolíticas nos nossos grandes aglomerados urbanos, antes que outras tragédias passem a frequentar nosso cotidiano. Mesmo com a atual crise global, não se consegue vislumbrar nenhuma estratégia que, ao lado de enfrentar as grandes questões econômico-financeiras, nos faça caminhar em direção a ambientes urbanos mais viáveis. Mesmo quando se discute, por exemplo, a oportunidade de introduzir veículos menos poluentes, que reduzam emissões e ajudem a enfrentar o drama do clima, em nenhum momento se agrega à discussão o drama já insuportável dos congestionamentos; ao contrário, segue-se debatendo apenas como retomar a alta produção, as vendas e os empregos no setor. Sem perguntar, por exemplo, o que vai acontecer numa cidade como São Paulo, já com mais de seis milhões de veículos, que ocupam mais de 50% do espaço urbano (incluindo o sistema viário, estacionamentos e garagens), para abrigar carros que consomem cerca de 90% da energia para transportar a si mesmos (e não passageiros), consomem 30 vezes mais energia para deslocar uma pessoa que o metrô (determinando um desperdício de R$ 1 trilhão em algumas décadas, como lembra o ex-secretário de Transportes Adriano Murgel Branco). E ainda permanecem ociosos a maior parte do tempo, porém gerando problemas gigantescos.

Apesar de licenciarem cerca de mil veículos novos por dia na cidade de São Paulo e tendo hoje em circulação mais carros do que quando foi introduzido o rodízio, os administradores não aceitam propostas como a do pedágio urbano para reduzir a pressão em certas áreas, facilitar o transporte coletivo e gerar receitas para outras soluções. Nem a ampliação do rodízio. Muito menos a exigência de retirar um veículo antigo de circulação para licenciar um novo. Nem mesmo uma proibição de fato rigorosa para cargas e descargas em certos horários, como já houve há mais de meio século. Ou questionar a ampliação da frota de motos, que, para ganhar tempo no trânsito, desrespeitam toda a legislação na área. Ou o aumento brutal da poluição urbana, que custa muitas vidas a cada dia, como tem demonstrado a Faculdade de Medicina da USP.

Enquanto isso, na área política só se ouvem discussões sobre procedimentos clientelistas, em que os depositários de votos tentam implantar alguma ação para um parcela específica dos eleitores em troca dos votos. A sociedade, por sua vez, não consegue se organizar e se informar para discutir políticas mais amplas. Campeiam as denúncias de corrupção, corporativismo, regras que beneficiam apenas os detentores de fatias do poder. Mas na área econômica a preocupação única parece ser com taxas de crescimento do PIB, como se esse fosse o único indicador eficaz de progresso real, ou com a redução/isenção de impostos, quando um estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário aponta uma sonegação, só de empresas autuadas entre 2006-2008, de mais de R$ 200 bilhões (32% do Orçamento federal).

Não será pelos velhos caminhos que conseguiremos avançar de fato. Há outros. Um deles indica que está na hora de as universidades e outras instituições que dominam o saber retomarem um papel que já tiveram (e foi interrompido em 1964), de vanguarda das discussões e de mobilização da sociedade para debater rumos mais adequados. Não é preciso esperar que outros suicidas nos aterrorizem.

Washington Novaes é jornalista