Artigo
Por MARINA SILVA
BUSH, O HOMEM dos ouvidos surdos à crise ambiental planetária, termina seu mandato com a criação de grande área de proteção oceânica em torno de ilhas do Pacífico. A ironia, dizem ONGs ouvidas pela mídia, é que o principal problema no local é a morte de corais pela elevação da temperatura das águas, associada às mudanças climáticas, objeto do Protocolo de Kyoto, que o governo Bush se recusou a assinar.
O que terá motivado esse gesto?
Uma tentativa de buscar certa redenção? Mesmo que seja só marketing, revela a força simbólica da questão ambiental até mesmo para quem sempre a desprezou.
E assim começa 2009, com a crise econômica firme no topo da agenda. É grave e precisa de saídas, mas não as que implicam prejuízo ambiental. A saída real é definir novos parâmetros globais de desenvolvimento, capazes de eliminar o poder das prioridades fictícias sobre as reais. Parece ser o momento de reorganizar o mundo em torno das reais, o que traz a crise ambiental também para o topo da agenda, com a expectativa das negociações que definirão as regras para o pós-Protocolo de Kyoto.
O Brasil encerrou bem 2008 ao anunciar metas voluntárias de cortes nas emissões de gases poluentes. Com isso, contribuiu para esgotar o argumento, usado pelos países ricos para não cumprir suas metas, de que países em desenvolvimento não aceitam se comprometer concretamente. Agora deverá empenhar-se em liderar a construção de nova atitude propositiva do G77, passo importante para exigir avanços dos Estados Unidos, cuja posição não se inverterá automaticamente, apesar das esperanças em Obama.
Na política interna brasileira, 2009 definirá os temas que pautarão o ano eleitoral de 2010. Será inevitável o embate entre crise econômica e proteção ambiental.
Este é um momento que cabe à perfeição no chavão "crise e oportunidade". Muitos buscarão novos patamares de qualidade para suas ações, mas outros verão a oportunidade do oportunismo, usando o discurso da crise econômica para detonar a legislação ambiental e causar grave retrocesso.
É impensável flexibilizar o Código Florestal em favor de quem se recusa a adotar padrões de eficiência ambiental. Da mesma forma, são inaceitáveis atalhos em processos de licenciamento ambiental, prejudicando o cumprimento das etapas necessárias à implantação de projetos de infraestrutura e outros. Baixa qualidade ambiental de investimentos não pode ser confundida com saída para a crise econômica, sob pena de agravá-la no médio e longo prazos.
Atenção, compromisso e firmeza talvez sejam as palavras mais adequadas a 2009.
*MARINA SILVA escreve às segundas-feiras nesta coluna.
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