quinta-feira, 5 de junho de 2008

Valor - Índios valem tanto quanto operários, diz Marina no Senado


Por Raquel Ulhôa

A ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva fez ontem seu primeiro discurso como senadora, cujo mandato reassumiu após deixar o cargo no governo Luiz Inácio Lula da Silva - ao sentir que perdera "o acolhimento" do presidente da República para continuar dando encaminhamento à agenda da questão ambiental. Marina rebateu as críticas de lentidão na concessão de licenças ambientais, listou as conquistas do ministério, cobrou sustentação política para o projeto de desenvolvimento sustentável, voltou a se queixar do governador do Mato Grosso, Blairo Maggi, e fez críticas indiretas a Lula, que costuma atacar a "elite" nacional.

"O problema do Brasil é que a gente precisa ampliar a elite e mudar a visão que se tenha de elite, porque elite é o mais alto cargo da intelectualidade brasileira, o homem mais importante. Mas também o Chico Mendes, que pensou a Amazônia antes que todos nós aqui a pensássemos, fazia parte da elite brasileira. A democracia pressupõe que sejamos capazes de considerar a opinião do operário - e muitas vezes a opinião do operário foi considerada até o mais alto nível da República - mas também ser capaz de considerar as diferentes opiniões, inclusive dos índios, que muitas vezes não estão sendo tratados como brasileiros", disse.

A petista afirmou que volta ao Senado "com espírito de co-autoria das boas propostas" do seu sucessor, Carlos Minc, e do governo Lula. Mas deixou claras as críticas com a falta de "transversalidade" da política ambiental no governo. "O apoio às práticas produtivas sustentáveis ficou a desejar", disse. Marina defendeu negociação com todos os partidos políticos na defesa da política ambiental.

Ressaltou que, nos cinco anos em que permaneceu à frente do ministério, procurou e teve apoio de todos os partidos na aprovação de leis importantes para o setor, como a Lei de Gestão de Florestas Públicas, a criação do Instituto Chico Mendes de Proteção da Biodiversidade Brasileira. "Acredito ser possível fazer alianças pontuais, duradouras, porque não sou do tipo que acha que ter interesses diferentes é errado. O erro é não ter interesse, é camuflar os interesses", disse.

A ex-ministra afirmou que dificuldades foram encontradas à frente do ministério, inclusive o desmatamento crescendo mais de 20% de 2001 para 2002, mas "medidas drásticas" foram tomadas para conter o processo. "No caso do desmatamento, o que andou mais foi a agenda do combate às práticas ilegais. Agora, o erro - vou pedir licença para falar, da forma respeitosa como sempre tratei, o governador Blairo Maggi -, o erro é combater o que está funcionando, combater o combate ao ilegal", disse.

Ela pediu ampliação do Plano Amazônia Sustentável. "Quando em setembro do ano passado acendeu a luz vermelha e tomamos todas as medidas que tiveram o seu cume na resolução do Conselho Monetário Nacional - que proíbe crédito para quem desmata ilegalmente - não era para o governador Blairo Maggi questionar as medidas, era para continuarmos trabalhando juntos", completou.

A senadora salientou que a questão ambiental deixou de ser um assunto "periférico" no país. Listou as quatro diretrizes de sua gestão: controle e participação social, desenvolvimento sustentável, fortalecimento do Sistema Nacional do Meio Ambiente e política ambiental transversal. Citou as críticas pela suposta lentidão na concessão de licença ambiental. "É um resgate, porque a hidrelétrica do complexo do Madeira jamais teria sido licenciada, se não tivéssemos resolvido os problemas do mercúrio, dos sedimentos, das malárias e dos bagres, que alguns ridicularizavam. Temos conhecimento técnico e compromisso ético, para resolver o problema da energia e o problema dos peixes", disse.

Crédito da imagem: Ruy Baron/Valor

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