quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Valor Econômico - Área irregular pode ir para reforma agrária


Por Mauro Zanatta

O governo federal anunciou ontem a primeira medida concreta para inibir a derrubada ilegal da floresta amazônica. Os proprietários de terras com área superior a 320 hectares situadas nos 36 municípios com os maiores índices de desmatamento terão 45 dias para recadastrar suas áreas sob pena de suspensão dos cadastros dos imóveis, proibição de venda das propriedades e da contratação de crédito rural, além do risco de desapropriação das fazendas para fins de reforma agrária ou criação de reservas florestais.

As medidas, anunciadas pelos ministros Marina Silva (Meio Ambiente) e Guilherme Cassel (Desenvolvimento Agrário), abrangem 15,4 mil imóveis com área total de 48 milhões de hectares na região. São 19 municípios em Mato Grosso, 12 no Pará, quatro em Rondônia e um no Amazonas. "Não resolve o problema, mas é um insumo para combater o desmatamento", afirmou Cassel. "Vamos usar (as áreas irregulares) para fazer reservas ou a reforma agrária."

O ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, de quem Marina Silva divergiu publicamente em discussões sobre a extensão da devastação da floresta, não participou do anúncio. "Cada ministro está implementando normas em sua área. É uma decisão de governo e não há divergência alguma entre ministérios sobre as medidas", disse a ministra.

A decisão do governo, segundo o ministro Cassel, possibilitará cruzar os dados informados pelos donos de terra com as imagens de satélite da região para identificar os campeões da derrubada. Com isso, explicou ele, devem aparecer as "manchas" e "vazios" de terras griladas ou situadas em áreas indígenas e de reserva legal obrigatória. As fazendas da região só podem ter 20% da área explorada. "Se for terra estadual, avisamos ao Estado. Se for federal, podemos destinar a assentamentos", disse.

O prazo para recadastramento, que deve custar R$ 2 mil por propriedade, segundo o governo, se estende de 3 de março a 2 de abril. Os pequenos proprietários terão dois anos para recadastrar suas áreas e o próprio governo pagará os custos com a produção de plantas georreferenciadas e de memoriais descritivos exigidos para as áreas. O custo está estimado em R$ 50 milhões.

Principal porta-voz dos produtores rurais, a Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA) avalia que o prazo de 45 dias é "insuficiente" para a comprovação da titularidade da posse. "Pelos procedimentos a serem tomados, o produtor precisaria de pelo menos 90 dias", diz o assessor técnico da comissão de Assuntos Fundiários da CNA, Anaximandro Almeida. A época de chuva na região, segundo ele, também deve atrasar o processo. O ministro Cassel rebateu a queixa: "Esse tempo de 45 dias é mais do que suficiente. Isso se faz em uma semana, 15 dias", disse.

O governo acredita que o banco de dados antidevastação deve ficar pronto somente em meados de julho para ser comparado com as imagens de satélite. Só depois disso é que uma medida punitiva poderia ser imposta aos infratores. "Não queremos causar confusão ou transtorno aos produtores, mas saber de quem são os imóveis. Só não vai se recadastrar quem quiser se esconder", disse Cassel.

A ministra Marina Silva explicou o foco em médias e grandes propriedades. "Não podemos tratar diferentes com se fossem iguais. Não há discriminação, mas bom senso. Esta é uma excelente oportunidade para separar o joio do trigo", defendeu. Os donos de pequenas áreas de terras são, segundo ela, responsáveis por "apenas" 18% do desmatamento na Amazônia. "É um corte (acima de 320 hectares) previsto em lei. Não é aleatório", reforçou Cassel. O processo de devastação da Amazônia, segundo ele, foi puxado por madeireiras ilegais, grileiros e pela fronteira agrícola. "Não é preciso ser especialista para saber isso. Ou você já viu um ribeirinho com motosserra?", questionou.

As exigências do governo para o recadastramento, que são parte de um decreto presidencial editado em 21 de dezembro de 2007, devem ser publicadas em edital de convocação e notificação nos próximos dias.

Crédito da imagem: Valor Econômico

Nenhum comentário: