sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Valor Econômico - Lobby verde de Lula convence ricos

Por Daniela Chiaretti

A novidade não estava no discurso, mas na reação da platéia. Ontem, no auditório do Itamaraty, em Brasília, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva repetiu, mais uma vez, sua defesa eloqüente aos biocombustíveis e seu papel no combate ao aquecimento global. "Os biocombustíveis têm que estar no centro de uma estratégia global de proteção ao meio ambiente", disse Lula. Quem o escutou, desta vez, foram uns 100 parlamentares dos países mais ricos do mundo e dos cinco emergentes, o grupo batizado de G8+5. Eles capitularam ao lobby verde: reconheceram sua importância na redução dos gases estufa e vão recomendar aos governos que reforcem a posição dos biocombustíveis nos acordos internacionais do clima. Fizeram só uma ressalva - mais comercial do que ambiental.

No documento final dos membros do Globe, uma organização internacional de legisladores que promove diálogos sobre mudanças climáticas e ecossistemas, os biocombustíveis receberam aval positivo assim como a liderança do Brasil no setor. A idéia é levar tudo à próxima reunião do G8+5, em julho, no Japão. As recomendações percorrem o caminho habitual - de que a produção seja sustentável e devidamente certificada. Lula garantiu, exibindo números do IBGE, que a produção de biocombustíveis no Brasil não concorre com a de alimentos e que não se está desmatando a Amazônia para fazer etanol. "Não há possibilidade de um cidadão brasileiro derrubar um pé de árvore na Amazônia para colocar lá uma cabeça de gado ou plantar uma oleoginosa", improvisou. "Não olhem o programa de biocombustíveis a partir do mapa da Europa, onde tudo está arrumado. Olhem como uma oportunidade para a África, para a América Latina."

O olhar dos parlamentares europeus ficou sutilmente enviesado. As taxações aos biocombustíveis devem ser revistas com urgência, concordam. Mas permaneceu entre colchetes - código usado nas negociações internacionais para sinalizar quando não há consenso em algum trecho - a frase que diz que este tema deveria ser prioridade na Rodada Doha da OMC. A objeção européia teve sotaque francês e alemão. Ainda há suspeitas da pressão que os biocombustíveis exercem sobre a floresta, justificaram. Estudo da Universidade de Minnesota, publicado recentemente na revista "Science", dá conta do prejuízo que cortar árvores para plantar cana representa na absorção do carbono da atmosfera. As reticências, esclareceu Michael Kauch, membro do parlamento alemão, são uma reação ao que ocorreu na Indonésia, onde florestas vieram abaixo para dar lugar ao plantio de palma.

A ressalva aos biocombustíveis pode até ter uma raiz ambiental. No caso americano, porém, as taxações protegem a produção de etanol do milho, mais cara e menos eficiente que o de cana, e a preocupação com a Amazônia ou o aquecimento global está em segundo plano. Curiosamente, quando o presidente Lula apareceu no encontro do Globe, um dia depois do previsto e sem presença confirmada até minutos antes, os parlamentares americanos haviam acabado de sair do plenário.

Além dos biocombustíveis, os parlamentares queriam avançar em um documento que sugerisse linhas gerais para o que vai acontecer depois de 2012, quando termina o primeiro período do Protocolo de Kyoto. Mas, ao final do evento, ficou ainda trabalho por fazer. "Não houve consenso nas metas", disse Michael Jay, representante do parlamento inglês. Os chineses já haviam avisado que não iam referendar nada porque não teriam recebido o rascunho do documento antes de vir ao Brasil. Limitaram-se a escutar e a exibir um vídeo onde se viam dezenas de termelétricas a carvão sendo derrubadas. "Estamos demolindo as antigas", disse Xu Jianmin, membro da delegação. Ele expôs um ponto de vista singular: "30% das emissões de gases atribuídas à China não são nossas. Vêm da produção de artigos que, se não estivessem sendo feitos na China, estariam sendo produzidos em outro lugar."

Nenhum comentário: