quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

OESP - Falta de fiscais emperra operação

Por João Domingos, TAILÂNDIA (PA); e Carlos Mendes, BELÉM

Em ação contra desmate ilegal, vistoria de 90 madeireiras pode levar 2 meses

No ritmo que começou - e apesar do impressionante aparato bélico e dos 300 agentes envolvidos diretamente na ação, a maior já realizada no País para conter o desmatamento na Amazônia -, a Operação Arco de Fogo pode demorar pelo menos dois meses só para fazer a fiscalização nas 90 madeireiras de Tailândia, 235 quilômetros ao sul de Belém. O gargalo está justamente no Instituto Nacional do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o órgão responsável por fazer a verificação da papelada.

O Ibama levou o dia todo de ontem para olhar os documentos de uma única madeireira, a DK, uma empresa entre pequena e média. Descobriu que ela tem licença ambiental para trabalhar e cadastro técnico federal. É uma das 21 que têm licença. As outras 69 não têm. Na DK, o Ibama encontrou cerca de mil metros cúbicos de madeira sem origem. Por isso, deverá aplicar uma multa ao empresário Marcos Antonio Dantas, entre R$ 100 mil e R$ 200 mil, informou Bruno Versiani, coordenador da operação pelo lado do Ibama. Havia madeira leve, como faveira, e nobre, como angelim.

Versiani disse que não está preocupado com a demora no trabalho. “Não tenho pressa. Esse é um tipo de coisa que não permite erros.” Envolvido numa correria atrás de papéis, Dantas não quis fazer nenhum comentário sobre a fiscalização em sua empresa. Um funcionário contou que, ao ver a chegada de tantos carros, tantos agentes e, com eles, tantas armas, Dantas quase desmaiou.

Para a Operação Arco de Fogo em Tailândia - onde na semana passada a população revoltou-se contra a fiscalização, aprisionou agentes do Ibama e da Secretaria do Meio Ambiente do Pará (Sema), bloqueou a rodovia PA-150 e ateou fogo em objetos -, a Força Nacional de Segurança mobilizou 156 homens; a PF, outros 70. O Ibama, porém, apareceu com 24 agentes, mas até ontem não os havia utilizado todos, sob o argumento de que alguns não tinham conseguido chegar. A Sema emprestou dez agentes ao Ibama. “Quando a equipe estiver completa, vai dar para fazer duas madeireiras por dia. Fazendo as contas, vamos gastar dois meses”, calculou Versiani.

Na Operação Arco de Fogo de Tailândia, cabe à PF uma função muito mais burocrática que de ação. Todas as irregularidades que forem encontradas pelo Ibama terão de ser transformadas em uma ocorrência policial, que depois seguirá para o Judiciário. Assim, a PF trabalha com equipes de dez pessoas. Para cada uma, conta com um delegado, um escrivão, um perito e sete agentes. A Força Nacional fica do lado de fora da madeireira, para garantir a segurança dos que estão lá dentro. Para não cansar muito o pessoal, é promovida a troca de turma de três em três horas.

Depois da fase de Tailândia, a Operação Arco de Fogo será estendida para os nove Estados da Amazônia Legal - Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Maranhão (oeste), Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins. De acordo com o coordenador-geral de Defesa Institucional da PF, delegado Daniel Sampaio, a operação será feita em etapas. Primeiro vem a fiscalização do Ibama e a abertura de inquérito contra os que atuam na ilegalidade. Depois, o Estado tentará implementar ações de recuperação dos empregos perdidos por causa das ações, de forma a impedir que os desmatamentos continuem.

Para o coordenador da campanha Amazônia da ONG Greenpeace, Paulo Adário, a presença do Estado na Amazônia ajuda a reduzir ações ilegais, mesmo que a operação demore para ser cumprida. “Pode haver a intensificação do desmatamento em outras áreas sim, mas é preciso levar em conta o papel da exemplificação”, afirma. “Uma análise, como a que parece ser feita em Tailândia, pode indicar outros caminhos para enfrentar o problema. Um pente-fino na serraria, por exemplo, pode reduzir o trabalho na floresta. Porém, tem de haver punição.”

COLAPSO ECONÔMICO

Em Tailândia, a ação contra as madeireiras é sinônimo de crise, pois de acordo com a prefeitura, cerca de 70% de toda a renda que circula na cidade tem origem no setor de madeiras. Pelo menos 6 mil trabalhadores cumprem aviso prévio ou já foram demitidos de madeireiras e carvoarias, de acordo com dados do Sindicato dos Madeireiros (leia texto acima). Para piorar, a madeira envolve uma cadeia produtiva grande: a pessoa que identifica a árvore na floresta, os que a cortam, o transportador, os operários da madeireira, os estivadores e, no final, a indústria da construção civil, moveleira e até de navios.

A governadora do Pará, Ana Júlia Carepa (PT), disse ontem que o Estado perde anualmente R$ 2 bilhões com atividades ilegais, como o comércio clandestino de madeira. Isso representa quase um quarto do orçamento estadual para 2008, que é de R$ 9 bilhões. “Não vamos tolerar ilegalidades”, disse. “Faremos reflorestamento e recomposição florestal nas áreas de onde a madeira foi retirada.”

A governadora adiantou que o Estado irá leiloar toda a madeira trazida de Tailândia para Belém, destinando metade do que for apurado ao aparelhamento dos órgãos ambientais e a outra metade à criação de programas sociais de qualificação profissional para geração de emprego e renda aos demitidos das madeireiras. Uma das alternativas é criar a figura do agente ambiental, que receberia um salário mínimo.

BATALHA JUDICIAL

O juiz federal substituto da 5ª Vara de Belém, Antonio Carlos Campelo, negou ontem pedido de liminar das madeireiras G. M. Sufredini e Tailaminas Plac, as maiores de Tailândia, que pretendiam permanecer na condição de fiéis depositárias de madeiras apreendidas na semana passada.

Campelo também decidiu que, até o final do processo administrativo, iniciado a partir do momento em que as empresas foram autuadas por extração ilegal de madeira, o Ibama não poderá doar ou leiloar a madeira apreendida. Caso o superintendente do Ibama desobedeça, ficará sujeito ao pagamento de multa diária de R$ 5 mil, além de ser responsabilizado criminalmente.
COLABOROU CRISTINA AMORIM

MAIS DESMATAMENTO
Em Mato Grosso: Alta Floresta, Aripuanã, Brasnorte, Colniza, Confresa, Cotriguaçu, Gaúcha do Norte, Juara, Juína, Marcelândia, Nova Bandeirantes, Nova Maringá, Nova Ubiratã, Paranaíta, Peixoto de Azevedo, Porto dos Gaúchos, Querência, São Félix do Araguaia, Vila Rica

No Pará: Altamira, Brasil Novo, Cumaru do Norte, Dom Eliseu, Novo Progresso, Novo Repartimento, Paragominas, Rondon do Pará, Santa Maria das Barreiras, Santana do Araguaia, São Félix do Xingu, Ulianópolis

Em Rondônia: Machadinho d’Oeste, Pimenta Bueno, Nova Mamoré, Porto Velho

No Amazonas: Lábrea

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