terça-feira, 29 de julho de 2008

Envolverde - Energia-Brasil: Biodiesel iluminará comunidades amazônicas

Por Mario Osava, da IPS

Rio de Janeiro, 29/07/2008 – O óleo de palmeiras nativas como o do tucumã, uricuri e murumuru permitirá a povoados isolados no interior profundo da Amazônia brasileira dispor de eletricidade, inacessível por meios convencionais. Uma equipe de pesquisadores se prepara para colocar em funcionamento este ano uma unidade produtora de biodiesel em Carauari, município de 25 mil habitantes ao qual somente se tem acesso por via fluvial ou aérea, sulcando 1.600 quilômetros de rios e viajando 2,5 horas de avião desde a capital do Amazonas, Manaus. “Há cerca de 10 espécies prometedoras, isto é, com plantações naturais densas e que oferecem boa quantidade de óleo, mas se avançou mais com o tucumã por sua abundância e sua cadeia produtiva parcialmente desenvolvida”, informou à IPS Roberto Figliuolo, especialista do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa).

“A população amazônica consome muito a fruta do tucumã, mas aproveita apenas a polpa, que é comida crua ou frita em formas variadas, e joga fora o caroço que contém uma amêndoa, a parte “mais valiosa”, com 40% de óleo”, explicou. Toneladas da fruta em estado natural chegam diariamente a Manaus, principal mercado do produto, com 1,7 milhão de habitantes. Não é racional, porque 80% do peso, que correspondem ao caroço, é transportado inutilmente por longa distância. Alterar essa cadeia, instalando as usinas para retirar e envasar a polpa na origem, baratearia o transporte e criaria mais empregos e renda nas comunidades extratoras de tucumã, com um produto “mais higiênico” e de melhor preço, disse Figliuolo, coordenador do projeto do biodiesel amazônico iniciado há cinco anos. Dessa forma, a fonte do óleo ficaria nas comunidades.

“É difícil convencer os prefeitos e autoridades locais a impulsionarem essa alternativa, única forma de levar eletricidade às pequenas comunidades remotas, onde não é viável estender linhas de transmissão”, reconheceu Figliuolo. No Estado do Amazonas, o mais extenso em território e em florestas preservadas do Brasil, há 4.600 comunidades isoladas e apenas 32% com eletricidade, destacou Banny Barbosa, estudante de química da Universidade Federal do Amazonas, que apresentou seu estudo sobre biodiesel de tucumã na reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, que aconteceu entre 13 e 18 deste mês.

Em Carauari são “mais de cem” os povoados rurais de poucas famílias, disse à IPS Nelson Lacerda, secretario municipal de Meio Ambiente. Alguns poucos maiores, como Roque e Nova Esperança, onde se desenvolve o projeto de biodiesel, com cerca de cem famílias cada uma, dispõem de luz elétrica apenas durante cinco horas à noite. Com o biodiesel substituindo o diesel e o óleo combustível mineral, essas comunidades poderão dispor de eletricidade o tempo todo. O tucumã e o uricuri oferecem um óleo adequado para a elaboração do biodiesel por sua baixa acidez, o que facilita a conversão, explicou Lacerda, químico que deixou o grupo pesquisador em Manaus e o curso de mestrado para cuidar da execução destas idéias na prefeitura. A principal dificuldade, segundo Lacerda, é quebrar o coco (caroço arredondado) do tucumã.

A unidade-piloto está instalada, mas para produzir biodiesel exige um conjunto de medidas. O etanol para a catálise de conversão do óleo já começou a ser produzido a partir da cana de açúcar semeada em “terras já desmatadas” de Carauari. Foi difícil conseguir equipamentos para a pequena produção tanto de etanol quanto de biodiesel, transportados em partes desde São Paulo para serem montados na localidade, sem os técnicos especializados, recordou Figliuolo. E agora faltam condições para produzir o óleo suficiente a fim de abastecer a central termoelétrica.

São escassos os recursos financeiros e técnicos para produzir biodiesel na Amazônia. Mas, é necessário, porque o diesel mineral, fonte de luz nas comunidades dispersas, representa grandes bastos em subsídios, encarece junto com o petróleo e o transporte e seu fornecimento pode ser cortado algum dia, argumentou o pesquisador. “Quando se comprovar a viabilidade técnica, econômica e ambiental” dessas pequenas unidades locais, a experiência de Carauari se espalhará pela Amazônia, aproveitando a abundância de frutos oleaginosos, acredita Figliuolo.

Há alguns anos o governo brasileiro promove o programa “Luz para todos”, com o objetivo de levar eletricidade a milhões de brasileiros ainda privados de seus benefícios. Nas áreas mais povoadas, a solução foi estender linhas de transmissão. Mas, para a Amazônia, com seus cinco milhões de quilômetros quadrados e sua baixa densidade demográfica, se busca alternativas que exigem a produção local de energia, com a solar e a eólica ou ainda a termoelétrica à base de resíduos de madeira e óleos de espécies nativas. (IPS/Envolverde)

(Envolverde/IPS)

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