Por João Domingos e Fabíola Salvador, de O Estado de S. Paulo
Lei já prevê a redução de 80% para 50% na reserva para recomposição de áreas desmatadas, diz Carlos Minc
BRASÍLIA - O Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) deverá ratificar, no mês que vem, a decisão de um grupo composto por 13 ministérios, de reduzir de 80% para 50% a obrigatoriedade de reflorestamento nas proximidades da BR-163, que liga Santarém a Cuiabá, e da Rodovia Transamazônica. A decisão dos ministérios foi tomada com base em lei que regulamentou o zoneamento ecológico-econômico nas proximidades das duas estradas, aprovada pela Assembleia Legislativa do Pará e sancionada, em janeiro, pela governadora Ana Júlia (PT).
O Código Florestal (Medida Provisória 2.166-76) dá ao Poder Executivo federal a atribuição de reduzir a exigência de 80% para até 50% de reserva legal nas propriedades da Amazônia Legal, desde que feito o zoneamento ecológico-econômico pelo Estado.
"O Código Florestal já prevê a redução de 80% para 50% em caso de recomposição de áreas desmatadas", disse o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc. "A lei foi aprovada pelo Pará, e ficou muito boa". Como hoje, na área das duas rodovias, o desmatamento chegou a cerca de 90% das propriedades, Minc disse que os proprietários serão obrigados a recompor as áreas degradadas, até alcançar os 50% da reserva legal. "Quem não fizer isso cometerá crime ambiental", disse ele.
"Essa decisão era esperada, porque as áreas já estão desmatadas. É um caminho para avançar e facilitar o licenciamento dessas áreas. É importante saber que só vale para os desmatamentos até 2005. Não vale para nenhuma nova empreiteira, nem poderá haver novos desmatamentos", disse o engenheiro florestal Paulo Barreto, pesquisador sênior do Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia).
O pesquisador Adriano Venturieri, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), como Minc, lembrou que o Código Florestal prevê a redução da reserva nas áreas onde há o zoneamento ecológico-econômico. Para o cientista da Embrapa, a alteração, que ainda precisa ser aprovada pelo Conama e, posteriormente, regulamentada por decreto presidencial, não vai estimular o aumento do desmatamento na região da BR-163, uma das principais vias de escoamento da safra agrícola do País.
"A alteração aprovada pelos ministros não vale para novos desmatamentos, como deixa claro o Código. A alteração só vale para desmatamentos antigos. No caso do Pará, ela só beneficia quem desmatou até 2005", afirmou. O deputado federal Homero Pereira (PR-MT), que já presidiu a Federação da Agricultura do Mato Grosso (Famato), avaliou que o conselho de ministros fez "justiça" ao aprovar, por unanimidade, a redução da reserva legal.
Pereira explicou que a legislação ambiental permitia o desmatamento de 50% das propriedades na região. "Quem desmatou antes do novo Código, com base na regra anterior, não pode ser punido", afirmou.
O presidente da Comissão Nacional de Meio Ambiente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Assuero Veronez, apoia a ideia e diz que só assim seria possível eliminar os passivos ambientais de outros Estados e chegar ao desmatamento zero na Amazônia. "Em São Paulo, o passivo ambiental é de quatro milhões de hectares. No Paraná, são 4,5 milhões de hectares. Não há como recuperar essa área nos estados. Não há áreas livres. Então, que a compensação seja feita na Amazônia", disse.
Ministério da Defesa
O ministro da Defesa, Nelson Jobim, afirmou, em palestra no Instituto Militar de Engenharia (IME), no Rio de Janeiro, que tratar a questão do desmatamento na Amazônia sob a perspectiva da criminalização "é um equívoco histórico". "Temos 20 milhões de pessoas espalhadas na Amazônia e precisamos encontrar uma forma de desenvolvimento econômico sustentável para essa gente. Senão, se vai derrubar, se vai vender madeira", declarou.
Jobim também afirmou que as agendas discutidas no País em relação à Amazônia, que classificou de inadequadas, são produzidas na Europa e servem para o "deleite dos europeus". Depois da palestra, em entrevista, o ministro declarou: "É crime desmatar, mas não podemos manter isso como bandeira única. Precisamos dar uma solução para a população."
Ele afirmou que a política de criminalização de desmatadores não está dando resultado. Jobim defendeu a combinação de preservação da Amazônia com o que chamou de alternativas de "desenvolvimento real" que contemplem a exploração da terra e a produção rural. "Não podemos ficar nessa dicotomia maluca de ‘não vamos desmatar nada, não vamos trabalhar com nada, vamos preservar tudo’, a bem de que os europeus venham aqui passear", disse. "Precisamos dizer que a Amazônia vai ser protegida por nós, mas vamos dar uma solução para as 20 milhões de pessoas que vivem lá. Senão, vamos ter que expulsá-las. É legítimo?"
Sobre o embate entre os ministros Reinhold Stephanes (Agricultura) e Carlos Minc (Meio Ambiente) em relação a eventuais mudanças no Código Florestal, Jobim disse preferir a "linha" de Roberto Mangabeira Unger, da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. "O erro é exatamente tomar posições dos daqueles que pensam que a solução é o desmatamento, e daqueles que pensam que a solução é a preservação absoluta e não a atividade econômica da Amazônia. Temos que sair deste eixo", disse. "Essa agenda não é nossa. A agenda brasileira tem que ser a do desenvolvimento sustentável.
Desmatar e explorar com pecuária não é nossa agenda. E também não é preservar a Amazônia de forma a ser um grande jardim para deleite dos estrangeiros."
(com Felipe Werneck)
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