Artigo
Por MARINA SILVA
O ENCONTRO dos presidentes do Brasil, Bolívia, Equador, Paraguai e Venezuela no Fórum Social Mundial, encerrado ontem em Belém, dá o que pensar.
É alentador o advento simultâneo de cinco líderes que rompem com o passado de injustiça e submissão e se propõem a virar a mesa diante do mundo acostumado a nos ver como satélites. No entanto, essa disposição se defronta com as incertezas da crise ambiental e econômica global. Ou temos pernas e coragem para saltar sobre o abismo ou nunca chegaremos ao outro lado porque não há atalhos.
Para fazer a travessia, provavelmente precisaremos nos livrar do peso da tradicional visão que vê os líderes como porta-vozes do destino. Numa sociedade movida a informação, formação de redes e espaços antes impensáveis de militância, a perspectiva do século 21, em plena crise, só pode ser a de interação real, de escuta, de convergência de múltiplas competências e percepções. E de novas referências para a busca de soluções menos verticalizadas e estanques e mais horizontais e complexas. É necessário criar espaço para a força da diversidade social, política e cultural.
Os líderes latino-americanos de origem popular têm a responsabilidade de se repensar como lideranças neste momento crucial de fragilidade das velhas certezas. Por mais que figuras carismáticas importem em processos de mudança, não dá mais para substituir -e nem é desejável fazê-lo- o papel de cada ser humano, sob pena da mesmice política, da terceirização de sonhos e de transformar cidadãos em meros seguidores.
Em minhas andanças pelo Fórum Social Mundial impressionaram-me a sensibilidade e a motivação de milhares de pessoas para a reorganização do mundo em torno do respeito ao meio ambiente. Não se trata mais de bandeira acessória, carregada à margem. A compreensão da centralidade desse fenômeno fará a diferença no perfil das lideranças do século 21 em nosso continente, assim como aconteceu com a construção democrática, no século passado.
Espera-se dos dirigentes do continente que se deixem impregnar pela visão da sociedade e façam do cuidado com o meio ambiente a base para reposicionar a História. E é bom não esquecer que Barack Obama também está nesse rumo, ocupando espaços com excepcional percepção de oportunidades econômicas conectadas às demandas ambientais.
É paradoxal, mas quando menos se esperava, os Estados Unidos se transformaram num potencial e interessante aliado para o futuro.
*MARINA SILVA escreve às segundas-feiras nesta coluna.
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