terça-feira, 7 de julho de 2009

Envolverde - Garantias ao capital na Amazônia


A surpreendente saída do Ministro Mangabeira Unger da pasta de Assuntos Estratégicos, após a minicrise da MP 458, mostra que em torno desse tema, e em geral da regularização fundiária da Amazônia, organizam-se muito mais interesses do que parece. Interesses tão poderosos que exigem de vários atores sociais um envolvimento firme nesse debate, para garantir a transparência e a lisura a ação tão estratégica para o presente e para o futuro do Brasil. Deixar o assunto apenas a cargo do Executivo e do Legislativo, como vem sendo feito até agora, é mais do que insuficiente. É temerário.

Por Carlos Tautz*

A saída de Unger é o menos importante, ainda que grave. Suspeita-se que o ex-Ministro tenha operado junto à Câmara dos Deputados em defesa de interesses do empresário Daniel Dantas, do Opportunity, a quem assessorava antes de ir para o governo.

Em verdade, o que importa mesmo são as medidas oficiais nesse tema que volta e meia aparecem aqui e ali. Articuladamente, elas aprofundam a condição da Amazônia como um grande enclave para a exportação massiva e crescente de natureza – na forma de minérios, madeira, diversidade biológica, energia primária (gás natural e petróleo) e secundária (óleos naturais e álcool combustível). De forma tão articulada, que configura um verdadeiro modelo. E a história mostra os efeitos deletérios dessa inserção de segunda categoria na economia mundial.

Apesar disso, o crescimento econômico entorpece Lula e ele tem garantido toda segurança para implantação de infraestruturas extrativistas cada vez maiores na Amazônia Legal. Voltadas para
atender às flutuações do mercado internacional, essa exploração deixa como resultados o agravamento da pobreza e uma interminável sucessão de impactos sociais e ambientais nos territórios em que os projetos se instalam. É o caso de Barcarena (PA) e de muitas outras regiões que volta e meia são alçadas à condição de Eldorado.

Sem levar em consideração as chamadas externalidades desse modelo, o sistema de garantias ao capital na Amazônia segue operando. Primeiro, a área “técnica” do governo decide retomar o ciclo de hidrelétricas nitidamente superdimensionadas – como Jirau e Santo Antônio (RO) e Belo Monte (PA), que são viabilizadas por dinheiros públicos. Tanto direta (pelo Basa, Bando do Brasil e BNDES), quanto indiretamente (via Petros, Previ etc).

Seus excedentes garantirão a segurança energética a indústrias intensivas em energia - aços laminados e mineral, por exemplo. A produção inteira será exportada para os centros dinâmicos da economia mundial.

Nesse ambiente, cria-se a justificativa para o BNDES virar sócio de qualquer tipo de empresa – inclusive aquelas cuja produção induz ao desmatamento. Em 2008, o Banco liberou R$ 6 bilhões para frigoríficos instalados na Amazônia, como o Bertin, JBS, Friboi, Independência e
Marfrig. Eles compram gado engordado em áreas de desmatamento ilegal, o que ajuda o Brasil ter alcançado o posto de quarto maior emissor mundial de gases do efeito estufa.

Essa “externalidade”, porém, é convenientemente esquecida por um certo nacionalismo de resultados. Afinal, nós nos tornamos o maior exportador mundial de carne bovina, e é só isso que importa ao balanço de pagamentos e ao nacionalismo de mercado.

O sistema de garantias se completa com a MP 458, que permite a qualquer agente econômico reivindicar uma fatia de até 1500 hectares dos 67 milhões de hectares de terras devolutas existentes na Amazônia, mesmo em terras griladas e desmatadas.

Assim é o sistema de garantias energética, financeira e legal/institucional. Ele permite a grupos econômicos prepararem-se desde já para dar um salto de produtividade e acumulação no cenário
pós-crise. É o que já faz o Opportunity, que migrou do sistema financeiro, agregou valor técnico e estratégico na indústria da informação (na Brasil Telecom) e agora garante a terra como reserva de
valor e meio de acesso a bens naturais. Não é à toa que requereu ao Departamento Nacional de Pesquisa Mineral centenas de concessões de lavra.

É dessa forma, simples assim, que o sistema se consolida. E se aprofunda.

* Carlos Tautz é jornalista.

(Envolverde/O autor)


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