sexta-feira, 5 de junho de 2009

Folha - Luz no ambiente

Editoriais

Polarização ideológica impede debate técnico e sereno sobre a urgente atualização do Código Florestal brasileiro

O CÓDIGO Florestal data de 1965, quando os 4,2 milhões de km2 da floresta amazônica brasileira se encontravam quase intactos. A maior diversidade biológica do planeta ocupava nada menos que metade do país. Hoje o bioma já perdeu mais de 17% de sua cobertura vegetal.

Como toda legislação, o código precisa adaptar-se a novas realidades. Isso pode ocorrer por meio de alterações pontuais, como até agora, ou por uma revisão que corporifique um novo consenso nacional sobre esse patrimônio natural sem par.
Como demonstra o caderno especial publicado hoje pela Folha, a população brasileira atribui grande valor à preservação das matas. Identifica em madeireiros e fazendeiros seus inimigos, visão que não deixa de estar contaminada pelo maniqueísmo.

A dificuldade se soma ao fato de que prevalece hoje, no setor político e empresarial, o dissenso sobre o código. Representantes da agropecuária movem campanha contra seu mais controverso dispositivo, a exigência legal de preservar 80% da mata nativa nas propriedades localizadas na Amazônia, modificação introduzida em 2001, no governo Fernando Henrique Cardoso -antes bastavam 50%.

Alguns defendem voltar ao patamar anterior, que já seria o mais alto do país (no cerrado a reserva é de 35% e nos demais biomas, 20%). Outros, que a recomposição da cobertura possa ser feita com espécies não nativas da Amazônia, caso do dendê, cultivo de alto valor comercial.

Muitos produtores se preocupam, com razão, com os critérios para definir as áreas de preservação permanente. As APPs são partes da propriedade rural em que a manutenção da cobertura nativa é exigida por lei, como margens de rios, encostas e topos de morro.

A definição do que seja topo de morro é das mais problemáticas. Dependendo de como o fiscal do Ibama ou o Ministério Público a interpretam, culturas inteiras podem parar na ilegalidade. Entre os casos mais citados estão cafezais, vinhedos e plantações de maçã em áreas montanhosas.
Essa insegurança jurídica decerto não favorece investimentos num setor de importância crescente para a economia nacional. Seria, contudo, fácil de eliminar. Bastaria legalizar áreas de cultivo tradicionais e consolidadas, pois seria um contrassenso colocá-las sob risco.

Esse espírito pragmático teve acolhida no próprio código, que admite redução da reserva legal em áreas da Amazônia, desde que indicada no zoneamento ecológico-econômico -um guia, elaborado em âmbito estadual, que disciplina os usos da terra. O ânimo para a cooperação e o enfrentamento técnico de desafios concretos também vigorava no grupo de trabalho formado pelas pastas da Agricultura, do Meio Ambiente e do Desenvolvimento Agrário. Até desandar, no final de 2008, em polarização estéril.

Ou se retoma o caminho anterior, ou agricultores e ambientalistas continuarão travando uma batalha de panfletos. É do interesse do país que os dois lados cedam em parte de suas exigências.

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