Por MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A regularização fundiária da Amazônia, cujas regras foram aprovadas na noite de anteontem no Senado, começará pelos municípios que registraram os maiores índices de desmatamento na região: 33 deles têm terras públicas da União passíveis de serem doadas ou vendidas aos atuais ocupantes.
Até o final do ano, a meta do governo é cadastrar os ocupantes de 90 mil imóveis, numa extensão de 21 milhões de hectares, maior que o Estado do Paraná. Isso equivale a pouco menos da terça parte do território que o governo pretende regularizar no período de três anos.
Terá direito ao título quem comprovar ter ocupado a terra até dezembro de 2004. Propriedades com até cem hectares serão doadas. As demais, até 1.500 hectares, terão um preço simbólico ou definido com base em tabela do Incra, de R$ 70 a R$ 1.200 por hectare. As propriedades com até 1.500 hectares serão vendidas sem licitação, com prazo de 20 anos para pagar e três anos de carência.
"Vamos checar imóvel por imóvel se não há denúncia de grilagem ou disputa pela terra", disse o coordenador da regularização, Carlos Guedes de Guedes. Ele informou que os históricos de conflito agrário na região serão consultados para evitar que grileiros (portadores de títulos falsificados) sejam beneficiados. É a maior preocupação dos ambientalistas.
Quando não houver problemas, o título poderá ser concedido num prazo de 60 a 120 dias após o cadastramento.
Internet
O governo também usará o microblog Twitter para colher denúncias de posse irregular das terras. Assim como funciona hoje a lista suja do trabalho escravo, o ministério lançará na internet o nome de quem se cadastrou para receber títulos de terras na Amazônia ao lado da localização da propriedade. As denúncias serão analisadas pela Ouvidoria Agrária.
Na última semana deste mês, o cadastramento dos ocupantes será iniciado em Porto Velho (RO), Alta Floresta (MT) e Marabá (PA). Em Lábrea (AM), o cadastramento vai começar em julho, por causa das chuvas.
O trabalho pode começar antes da sanção da lei pelo presidente Lula, que deve ocorrer nos próximos dias. Para este ano, o custo previsto da regularização é de R$ 70 milhões.
Ontem, o ministro Guilherme Cassel (Desenvolvimento Agrário), principal mentor da proposta de regularização fundiária, avaliou que as mudanças feitas pelo Congresso no texto não abalaram os princípios básicos do programa: "Aquele temor de que o Congresso alterasse muito, por pressão da bancada ruralista, não se concretizou. Eram fantasmas".
Ele estuda a possibilidade de pedir o veto à venda de terras públicas a pessoas jurídicas. Segundo Cassel, a possibilidade de venda de parte dos imóveis três anos após a regularização "é preferível" à transferência da propriedade por meio de contratos de gaveta.
Mudanças
As alterações feitas pelo Congresso no texto original da MP editada pelo governo no início de fevereiro permitirão a venda das propriedades acima de 400 hectares três anos, em vez de dez, após a concessão do título, e o reconhecimento da ocupação por parte de empresas.
A bancada do PT no Senado pedirá que o presidente Lula vete artigos da medida provisória que regulamenta a situação fundiária na Amazônia. A senadora Marina Silva (PT-AC) quer que Lula vete os incisos 2 e 4 do art. 2º, que autorizam a regularização de terras ocupadas por prepostos; o art. 7º, que permite a transferência de terras da União a pessoas jurídicas e a quem já possui outras propriedades rurais; e o art. 13, que dispensa a vistoria prévia.
O senador Aloizio Mercadante (SP), líder do partido no Senado, defendeu que a medida deveria garantir a certificação de propriedade somente para quem vive do sustento da terra.
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