Opinião
Por CARLOS MINC
As lutas, por vezes incompreendidas, fazem parte do processo histórico de mudança de comportamento
MUITAS PESSOAS estranharam a atuação do Ministério do Meio Ambiente (MMA) em sucessivos conflitos e posteriores entendimentos com o setor da soja, da cana-de-açúcar, da madeira e da hidreletricidade, bem como com o governo Blairo Maggi, entre outros. O governador Maggi (PR-MT), em um primeiro momento, tentou derrubar a resolução do Conselho Monetário Nacional que cortou o crédito aos desmatadores e aos que estavam ilegais do ponto de vista fundiário e ambiental. Não logrou êxito.
Atacou, com outros governadores, a Operação Arco de Fogo, alegando que ela estava criando desemprego e desarticulando a economia local com a luta forte contra o desmatamento e os embargos. Ele tinha razão somente quanto ao atraso da Operação Arco Verde, que agora vai a todo o vapor e apresenta dezenas de alternativas de atividades e empregos sustentáveis.
Fracassadas as tentativas de atenuar a luta contra a impunidade ambiental, o governador Maggi lançou o programa de regularização ambiental e agrária dos municípios de Mato Grosso, o MT Legal. A ideia era facilitar a regularização das propriedades rurais, cortar burocracias e apoiar o reflorestamento de áreas degradadas. Essa lei chocava-se com alguns pontos da lei federal e com o zoneamento ecológico-econômico (ZEE) estadual. O governador esteve duas vezes no MMA, e conseguimos adequar o MT Legal ao ZEE, exatamente o que o governador de Santa Catarina não fez no Código Ambiental de seu Estado, que desfigura leis federais de proteção às matas ciliares.
Em Cuiabá, assinamos com o governador Blaggi um convênio de cooperação para agilizar o licenciamento e o cadastramento das propriedades rurais. A luta não é um fim em si, mas uma estratégia que visa à mudança de comportamentos. Depois de muitos anos de conflito com o setor da soja, um dos fortes vetores de desmatamento da Amazônia, os ambientalistas e, posteriormente, o MMA resolveram fazer um pacto que resultou na moratória da soja: nós aceleramos o ZEE e a regularização fundiária, e a Abiove (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais) e o setor exportador de óleos vegetais se comprometeram a não comprar soja de área desmatada na Amazônia a partir de 2006.
Há dois meses, fizemos um balanço da moratória da soja, com monitoramento de 620 polígonos (por satélite) feitos por MMA, Abiove, Greenpeace e Amigos da Terra. Resultado: 96% de cumprimento, um sucesso. A soja deixou de ser um agente relevante no desmatamento da Amazônia.
Agora nosso foco é a luta contra a pecuária ilegal, que resiste ao controle. Vamos cortar créditos aos fazendeiros que degradam o bioma amazônia, incentivar o boicote comercial e civil e avançar com a rastreabilidade dos rebanhos até eles se adequarem. Assinamos em Belém, há um ano, o Pacto da Madeira Legal e Sustentável com a Aimex (Associação das Empresas Exportadoras de Madeira do Estado do Pará) e os exportadores. Comprometemo-nos a concluir o ZEE da Amazônia até o fim de 2009 e dobrar a oferta de madeira legal, de manejo.
Os exportadores garantem que só comprarão madeira legal, de planos de manejo licenciados. Faremos o balanço em breve, mas a situação avançou depois que Fiesp e Caixa Econômica Federal assinaram pactos públicos de só comprar madeira legalizada de origem comprovada. Isso não diminuiu o combate às serrarias, carvoarias e madeireiras ilegais, ao contrário. Triplicamos as autuações, os embargos, a fiscalização e o leilão de madeira pirata.
Estabelecemos programas muito duros de mitigação das emissões de CO2 de térmicas a óleo e a carvão, que agora terão de plantar milhões de árvores. Mas estamos racionalizando e agilizando o licenciamento de boas hidrelétricas, que vão gerar energia renovável, inundando poucas áreas e fazendo a análise integrada por bacia hidrográfica, legitimada pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos.
Lançamos recentemente em Natal a Carta dos Ventos, com 20 secretários estaduais de energia, para desbloquear a energia eólica no país, tornando-a mais barata e eficaz, com leilões anuais e estratégia de construção de um setor eólico nacional. Não podemos endurecer com as térmicas, que sujam nossa matriz energética, sem agilizar as fontes renováveis de energia. Não podemos enfrentar as posições retrógradas de parte do agronegócio e do latifúndio sem uma aliança com a agricultura familiar e um tratamento diferenciado para ela. As lutas, por vezes incompreendidas, fazem parte do processo histórico de mudança de comportamento, dos padrões de produção, consumo e de civilizações.
CARLOS MINC BAUMFELD, 57, mestre em planejamento urbano e regional pela Universidade Técnica de Lisboa e doutor em economia do desenvolvimento pela Universidade de Paris 1, é o ministro do Meio Ambiente.
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