terça-feira, 11 de janeiro de 2011

País poderá receber verba global contra desmate

Ruy Barata Neto

Pela primeira vez, o Brasil poderá ter acesso a dinheiro de um fundo internacional para financiar projetos de proteção a florestas.

Na América Latina, junto com México e Peru, o Brasil é um dos eleitos pelo Programa de Investimento Florestal (FIP na sigla em , inglês), como país piloto para receber até US$ 70 milhões a serem liberados ainda este ano.

A demanda está sendo solicitada pelo Ministério do Meio Ambiente por meio da Secretaria de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda ao Banco Mundial, mantenedor do FIP. A promessa do governo é a de que os recursos sejam usados como pontapé inicial para a implementação no país da política de preservação conhecida como Redd.

O Redd - sigla para Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação - é um mecanismo de compensação financeira de países desenvolvidos para produtores de nações em desenvolvimento que evitam o desmatamento em áreas florestais e assim ajudam o país como um todo a reduzir suas emissões de carbono, causadoras do efeito estufa.

Estima-se que o montante disponível hoje no mundo para financiamento de Redd chegue aos US$ 4 bilhões. No entanto, a tendência é que esse mecanismo se torne cada vez mais popular nos próximos anos. O acordo pa- trocinado pela Organização das Nações Unidas (ONU) em Cancún prevê que até 2012 esse valor possa chegar a US$ 30 bilhões.

Segundo a a diretora de mudanças climáticas do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Thaís Juvenal, está em curso uma adequação institucional do país para fazer a gerência de recursos internacionais de Redd, o que significa definir responsabilidades de cada órgão existente no país com atuação na área do meio ambiente e o quanto cada um deles pode receber para tocar projetos. "A meta é que o sistema nacional de Redd fique pronto até o final deste ano", diz Thaís.

Controle parcial Até hoje o Brasil tem evitado o desmatamento, principalmente da Amazônia, a partir de recursos próprios. Entre entre 2006 e 2010 cerca de R$ 13 bilhões foram aprovados por meio de linhas de crédito e financiamento não-reembolsáveis para projetos de mitigação do desmatamento pelo BNDES.

No entanto, segundo Thaís, ainda não foi possível ter uma ação similar no país todo. O Cerrado não conta com monitoramento nem com instrumentos de medição dos estoques de carbono, como a Amazônia. "O Cerrado é hoje nossa prioridade para investimentos", diz Thaís.

Isso não quer dizer que os recursos do FIP viriam apenas para projetos nesta seara. A ideia é que sirvam também para financiar projetos do Plano Nacional de Mudanças Climáticas (PNMC), instituído por decreto presidencial em dezembro ano passado nas áreas de indústria, agropecuária, energia e de resíduos sólidos. A diretora do MMA explica que a possibilidade de dividir o dinheiro em várias áreas é o que motiva a participação no país no fundo. Além disso, a definição mais clara do conceito de Redd, na última Conferência do Clima de Cancún, no ano passado, tornou mais fácil para o país elaborar ações neste sentido alinhadas com a ONU. "Os outros fundos disponíveis não interessavam ao Brasil porque miravam financiamentos de ações que já fazíamos internamente" diz Thaís.

De acordo com o MMA, a diminuição do desmatamento deverá contribuir com 70% da meta governamental de diminuir as emissões do país em 1.259 bilhão de toneladas de gás carbônico equivalente até 2020.

Segundo Thaís, o Ministério ainda não tem uma estimativa oficial de quanto isso demandaria de recursos tanto locais como externos. O governo espera formalizar o valor em meados do ano quando haverá a finalização dos projetos do PNMC.

Compensação por desmatamento evitado soma sete projetos no país
Existem pelo menos sete projetos em andamento hoje no Brasil que usam mecanismos de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação (Redd). O conceito prevê linhas diferentes de atuação.
Por exemplo, um projeto pode ser o de compensação pelo desmatamento evitado, no qual o produtor rural recebe uma certa quantia para não desmatar mais. Porém, há ações mais complexas, que envolvem programas educacionais para agricultores. Um exemplo é o Transamazônica, feito com um grupo de 350 famílias de produtores rurais que vivem em 15 assentamento nas margens da Rodovia Transamazônica (BR-230) entre os municípios de Senador José Porfírio, Pacajá e Anapú, na região oeste do Pará, abrangendo uma área total de quase 32 mil hectares.

O objetivo é alterar a produção baseada em "corte e queima", que subaproveita o solo.

Segundo o Instituto de Pesquisa da Amazônia (Ipam), o trabalho pode evitar a emissão de 1,8 milhão de toneladas equivalentes de carbono nos próximos cinco anos. O orçamento total para o período é de US$ 15,4 milhões, que está sendo captado junto ao BNDES, gestor do Fundo Amazônia. R.B.N.



Cenário interno dificulta financiamento
Avanço na aprovação do Código Florestal e obras do PAC podem atrapalhar acesso a verbas
Protagonista nas negociações de Clima da ONU, o Brasil pode enfrentar dificuldades para cumprir as metas internacionais e obter recursos de financiamento de fundos globais para reduzir suas emissões.

Embora o país esteja em processo de construção de um sistema nacional de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação (Redd), o avanço da proposta de alteração do Código Florestal dentro do Congresso é visto por especialistas como um passo na direção oposta, uma vez que libera toda a terra com até 400 hectares para uso agropecuário sem a necessidade de manter uma parcela da área preservada. "Sabemos que o Código atual precisa ser mudado, mas criticamos as propostas apresentadas", diz a pesquisadora do programa de mudanças climáticas do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) Mariana Christovam. "O projeto, do jeito que está, é uma maneira de afrouxar a legislação ambiental, o que é contraditório as metas assumidas pelo Brasil", afirma. Por outro lado, se reconhece a necessidade de expandir a fronteira agrícola, tendo em vista o crescimento da demanda por alimentos no mercado internacional.

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" A questão é: como o Brasil vai conviver com os compromissos de redução de emissões com a demanda necessária de energia no país?

Adriano Pires, presidente do CBIE

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Existem problemas similares na área de energia. Projetos ligados ao Programa de Aceleração de Crescimento (PAC) - como é o caso do projeto da hidrelétrica de Belo Monte, no Pará - enfrentam resistências de grupos ambientalistas, um vez que a usina demandará o alagamento de uma área de 516 quilômetros quadrados de floresta.

Por outro lado, o presidente do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires, chama a atenção para o fato que reservatórios menores, como os que existem em muitas usinas em construção, exigirão mais energia assegurada das térmicas, que emitem mais poluentes. "A questão é: como o Brasil vai conviver com os compromissos de redução de emissões com a demanda necessária de energia no país?", questiona. "A conta não fecha." R.B.N.

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