Por Roldão Arruda, enviado especial
Especialista diz que só 1 milhão dos 22,4 milhões de hectares do território está titulado
SÃO PAULO - Não é só o emaranhado de leis que dificulta a legalização das terras na Amazônia. Em algumas áreas, verifica-se uma queda-de-braço entre os governos federal e estadual para ver quem controla as áreas não tituladas. "Atualmente, os grandes problemas de grilagem e conflitos de terra ocorrem em territórios pertencentes à União, que não tem competência para controlá-los e se recusa a repassá-los para os Estados", diz Aurelina Medeiros, estudiosa da questão, especialista em planejamento agrícola e deputada estadual de Roraima pelo PSDB.
Ela mora no Estado há 30 anos. Foi uma das fundadoras do Instituto de Terras daquele Estado, chefiou em duas ocasiões a Secretaria da Agricultura e, na Assembléia, dedica-se ao debate sobre questões fundiárias. Ela recorda que desde a criação do Estado de Roraima, com a Constituinte de 1988, discute-se a transferências das terras do antigo território para o controle do Estado. Até hoje, porém, nenhum passo importante foi dado nessa direção.
Em 2001, por iniciativa da então senadora Marluce Pinto, foi aprovada a Lei 10.304, que determinava a transferência das terras para Roraima. Fixava um prazo de seis meses, a partir dali, para que fosse regulamentado o processo de transferência. "Até hoje não aconteceu nada."
Mais tarde, entre 2006 e 2007, um grupo interministerial, do qual Aurelina fez parte, trabalhou na ante-sala do gabinete da Presidência, com o objetivo de preparar o decreto de regulamentação. "Fizemos um bom relatório, muito elogiado, mas o decreto não saiu."
Na opinião de Marluce, o principal foco de resistência está no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), que prefere estocar terras para possíveis assentamentos, e em instituições ligadas à defesa dos interesses indígenas. "Uma vez que o processo de demarcação de territórios indígenas está chegando ao final no Estado, como sinalizaram os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), o maior ponto de resistência passa a ser o Incra."
Sem acesso
A deputada salienta que, dos 22,4 milhões de hectares do território estadual, apenas 1 milhão está devidamente titulado. "E esses hectares legalizados são quase todos ocupados por projetos de assentamentos do Incra", afirma. No conjunto, são 32 projetos do instituto no Estado, sendo que a maioria fracassou.
A reportagem do Estado visitou projetos onde não existem sequer vias de acesso. Chega-se aos lotes por trilhas na mata. Em outro, observa-se um grande número de lotes abandonados. "Vende-se muita ilusão", diz a deputada.
Outra questão que a especialista enfatiza: a área reivindicada pelo Estado é uma pequena fatia do que sobrou após a demarcação de terras indígenas, áreas de preservação ambiental, terras do Exército. "Estamos discutindo apenas os direitos sobre 20% do território, o que equivale a 5,1 milhões de hectares. Se você considerar a lei de preservação ambiental, que determina que 80% de cada propriedade permaneça intocada, como reserva legal, estamos falando de 1,1 milhão de hectares."
Aurelina vê também incompetência do governo federal para administrar as áreas que mantém sob a sua tutela, alegando que são verdadeiros "depósitos de terras improdutivas".
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