terça-feira, 4 de março de 2008

Valor Econômico - Desmatamento ameaça planos de Maggi para 2010


Por César Felício

Os indícios de que o desmatamento na Amazônia teria voltado a crescer, sobretudo no Mato Grosso, ameaçam abortar a decolagem do governador Blairo Maggi (PR) para um papel ativo na sucessão presidencial de 2010. O sonho de seus aliados de vê-lo como candidato a vice ou mesmo à Presidência está na gaveta desde a publicação dos dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), sugerindo um crescimento de até 50% no desmatamento estadual.

Nos próximos meses os dados do Inpe - considerado um sistema impróprio para se medir desmatamento, mesmo por ambientalistas- devem ser revisados por levantamentos mais precisos, como o sistema Prodes, do ministério do Meio Ambiente. Desde fevereiro, os proprietários de um arco de 18 milhões de hectares espalhados em 19 municípios do Norte do Estado, apontados como campeões do desmatamento, estão obrigados a se recadastrar, sob pena de perderem linhas de crédito.

Pressionado pelo mercado internacional de soja e de olho em sua imagem, Maggi havia investido os últimos dois anos na adoção de um discurso preservacionista e na aproximação com as ONGs que se dedicam ao Meio Ambiente. A aposta do governo é que a tendência de alta será desmentida, mas Maggi parece se preparar para um resultado adverso. "Sou governador de um Estado com problemas ambientais e há a tendência de me colocarem como vilão. Só que o Estado não tem condições de fazer cumprir a lei sozinho. Ninguém me ajuda. Precisava da presença do Exército em municípios distantes", queixa-se Maggi, distribuindo responsabilidades. "Há um limite, físico, de até onde a agricultura pode ir. No caso da pecuária, não há . Os frigoríficos não deveriam comprar carne sem exigências ambientais, mas a pecuária é , heterogênea, dispersa. A madeira ilegal e o desmatamento clandestino são elos de uma corrente", afirma.

Maggi ganhou as eleições de 2002 prometendo desenvolvimento a qualquer preço . Nos dois primeiros anos de seu governo desmatou-se cerca de 22 mil quilômetros quadrados de floresta, área maior que o Sergipe. Em entrevista ao "New York Times", Maggi disse em 2003 que "não sentia a mínima culpa pelo que estava se fazendo no Estado". O desmatamento seguiu firme até a Polícia Federal prender o secretário de Meio Ambiente , Moacir Pires, um dos 130 presos pela "Operação Curupira", de combate ao desmatamento. O preço pago por Maggi foi alto.

A ONG Greenpeace, acompanhada dos humoristas do programa de TV "Pânico", constrangeu Maggi em 2005 ao tentar entregar-lhe o prêmio "motosserra de ouro". O jornal britânico 'The Independent" escreveu um perfil sob o título "O estupro da floresta e o homem por trás disso". A publicação "Virginia Quarterly Review", dos Estados Unidos, afirmou que Maggi, "homem com aspecto suíno", era a "personificação da depravação ecológica".

Pressionadas pela União Européia, um dos principais consumidores, as cinco maiores tradings de soja do Brasil - o Grupo André Maggi, da família do governador, é uma delas - assinaram em julho de 2006 a "moratória da soja", comprometendo-se a não comprar o produto de áreas novas do plantio. O primeiro balanço do pacto sairá na próxima semana. Começava a conversão do governador, com o risco da agricultura nacional perder crédito e mercados preferenciais e de sua carreira política ficar confinada ao Estado.

O governador ligou para os ativistas do Greenpeace, pouco mais de um ano depois do constrangimento público. Aderiu a uma proposta ambientalista, a de lutar pela remuneração dos produtores para manter a floresta em pé. Assinou acordos setoriais, sem força legal, para que entidades patronais da soja, cana e carne pressionem seus membros a cumprirem a lei. "Senti uma enorme mudança nele. Blairo começou a ser visto como um 'verdinho', não confiável, pelos seus colegas de agronegócio", disse um dos coordenadores do Greenpeace, Paulo Adário.

Nos anos de 2005, 2006 e começo de 2007, o desmatamento no Mato Grosso caiu para 14 mil quilômetros quadrados. Mas nem o governo mato-grossense procurou capitalizar o resultado, em uma conjuntura onde o preço da soja e da carne entraram em uma fase de baixa. "Além disso, o estoque de terras desmatadas formado entre 2003 e 2004 tornava novos desmates anti-econômicos. O crescimento já esgotou estes estoques", diz o coordenador da ONG Amigos da Terra, Roberto Smeraldi.

A economia do Estado cresceu 10% no ano passado, segundo avaliação da Federação das Indústrias do Mato Grosso (Fiemt). Em Cuiabá, não se vê guardadores de carro ou pedintes nas ruas centrais e canteiros de construção civil se multiplicam. Mesmo com a recuperação da saca de soja em 72% em doze meses, é a alta no preço da carne, onde a arroba do boi gordo subiu 40% ao longo de 2007, que alimenta o receio de aumento do desmatamento este ano. "Não se vê o dedo da soja no desmate", diz Adário. Estado com o maior rebanho bovino do Brasil, o Mato Grosso assiste a um grande aumento da sua capacidade instalada de abate nos últimos anos. O primeiro frigorífico moderno é de 1976. Em 1991, havia 14 no Estado. Agora são 33. "Uma só planta de 1,5 mil cabeças abatidas por dia envolve área de pastagem de 500 mil hectares", diz Smeraldi.

Crédito da imagem: Ruy Baron/Valor

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