domingo, 2 de março de 2008

OESP - Lição de empresário: é possível lucrar sem destruir a floresta

Por João Domingos

Os exemplos de dois empreendedores de Tailândia, Pará, que abandonaram o corte de madeira e prosperam

A fiscalização das autoridades federais e do Pará nas madeireiras de Tailândia (235 quilômetros ao sul de Belém) desde o início do mês e a ocupação da cidade no início da semana passada por uma força de 300 homens da Polícia Federal e da Força Nacional de Segurança causaram a maior crise econômica e social da história da cidade, que em maio completa 30 anos.

Três mil pessoas foram demitidas e outro tanto deverá ser dispensado também. Mas há saídas. Todas dentro da legalidade. Quem aponta as alternativas são as pessoas que já estiveram ou ainda estão envolvidas com a atividade madeireira. Começa a se forjar uma nova mentalidade empresarial entre pessoas que chegaram à cidade quando ela ainda tinha umas poucas casas, lá se fixaram e fizeram fortuna, principalmente com a atividade madeireira.

Uma dessas novas mentalidades é a de Massao Ozaki, de 52 anos, formado em Administração de Empresas por uma faculdade do Paraná, que chegou a Tailândia com a roupa do corpo em 1988. Massao “tocou madeireira” até 1992. “Ganhei muito dinheiro”, conta. “Também perdi muito, porque me meti na política e acabei me quebrando.” Desde então, Massao saiu atrás de alternativas.

Na cidade, iniciou a construção de um hotel. Na setor rural, deu a partida a um projeto de plantio de pimenta-do-reino. Mais recentemente, começou a plantar a palmeira do dendê.

A lavoura já está com dois anos e meio e começa a frutificar. A primeira safra será colhida neste ano. Mais importante, ele fechou contrato com as distribuidoras da região e vendeu as safras dos próximos 25 anos. “O dendê é o futuro”, diz.

Massao plantou dendê em 100 hectares. A produtividade média da palmeira é de 25 toneladas por hectare e o preço, no momento, é de R$ 170 por tonelada, o que vai dar R$ 425 mil por ano. Levando-se em conta que o custo de produção é de 50%, ele terá lucro líquido de R$ 212,5 mil.

“Aqui em Tailândia não há nada mais lucrativo do que uma madeireira. A não ser uma mina de ouro ou de diamantes”, diz sem nenhum receio de errar o empresário Edson Schmidt, sócio do pai, Nestor, na Madeireira Cimatal, uma das pioneiras da cidade. “Mas é preciso buscar a diversificação, porque a madeira começa a escassear.” Foi por isso que, há dois anos, Nestor, um gaúcho de 67 anos, chamou os filhos e disse que não serraria mais. “Estava muito difícil encontrar a madeira certificada.” Ele já começou a procurar alternativas.

Pai e filho têm três fazendas que totalizam 6 mil hectares. Até agora estavam sendo preservadas para a extração de madeira. Mas, neste ano, eles vão pedir autorização para desmatar 20%, a área de corte regulamentada pelo Código Florestal. Vão criar gado, plantar mandioca - que tem mercado garantido - e trabalhar com o setor de sucos. Leia abaixo um pouco da história de Massao e Nestor, ambos filhos de migrantes, um de japoneses, outro de alemães. Ambos são exemplos de que é possível viver da floresta sem destruí-la.


Pupunha, teca, pimenta e paixão pelo dendê
Massao: SP, Altamira e Tailândia

Em Tailândia, a série da TV Bandeirantes sobre os cem anos da chegada dos primeiros migrantes japoneses ao Brasil tem um espectador fiel. Ele se emociona de tal forma que, não raro, dá a impressão de que quer pular para o lado de lá da tela e virar personagem da história. Trata-se do empresário Massao Ozaki, de 52 anos, ex-madeireiro, filho de imigrantes japoneses.

Em 1981, aos 26 anos, Massao decidiu aventurar-se. “Eu não queria ser mais um filho de migrante japonês em São Paulo. Como tinha lido muito sobre projetos na Transamazônica, Jari, terras no Araguaia e Tocantins, pensei: ‘É pra lá que vou’.” Com a roupa do corpo, tomou vários ônibus rumo a Altamira, no Pará. Acabou ficando em Tailândia, naquela época um povoado com pouco mais de cem casas, onde o governo do Pará fizera seu primeiro projeto de assentamento.

Um primo de Massao já estava em Tailândia, puxando toras de madeira para a atividade que se iniciava. Chamou-o para trabalhar com ele. “Fui ajudar no caminhão. Era uma aventura. A gente ia buscar óleo diesel a 500 km de distância.” Mas o primo escondeu dele o fato de que estava quebrado. Logo teve de entregar o caminhão. Massao, então, candidatou-se a um lote de terras destinado aos colonos. Ganhou 100 hectares do Instituto de Terras do Pará (Iterpa). Em 1983 fez um projeto de plantio de 3 hectares de seringueiras e de 10 hectares para arroz.

Derrubado pela malária, que o deixou de molho por dois meses em Belém, Massao perdeu o período de colheita e todo o arroz. “Decidi que não trabalharia mais na roça. Iria para a cidade.” Acabou encontrando um outro descendente de japonês que o chamou para trabalhar com a única atividade que gerava emprego na cidade: as madeireiras. Virou sócio.

Com a rápida ascensão econômica numa cidade tão pequena, era natural que entrasse para a política. Elegeu-se vereador em 1988 e vice-prefeito em 1992, pelo PMDB. Em um ano já tinha brigado com o prefeito, Francisco Alves Vasconcelos, o Baratão. Não voltou mais à prefeitura. Envolvido com as atividades políticas, encontrou sua madeireira no vermelho e cercada por exigências de um mundo que cobra pela derrubada de árvores.

Chamou os funcionários, dispensou-os, pagou as indenizações e viu que não tinha outra saída a não ser fechá-la. Juntou todo o dinheiro que ainda restava e virou-se para a hotelaria. Dez anos depois, com o dinheiro do negócio e da venda da gleba recebida do Iterpa, comprou 50 hectares a nove quilômetros da cidade, na beira do asfalto.

Deu início então à plantação de pimenta-do-reino. No mesmo terreno, pôs pés de pupunha e mil mudas de teca (Tectona grandis), madeira mais valorizada do que o mogno, originária do Laos, Camboja, Vietnã e Indonésia, que se adapta muito bem ao clima úmido e quente da Amazônia e já vem sendo usada para a recuperação de áreas degradadas.

“Quando as tecas estiverem adultas, e eu conseguir 1 metro cúbico em cada árvore, vou apurar R$ 1 milhão com elas”, calcula. Há dois anos e meio, Massao entrou no projeto que mais o apaixona, o dendê. “Nada é melhor do que o dendê.” Ele tem 100 hectares da palmeira.



'Não vou esperar para ver o que vai acontecer'

Nestor parou de serrar madeira

Único ainda vivo dos quatro filhos de um casal de migrantes alemães que, como tantos outros, foi para o Rio Grande do Sul, Nestor Schmidt, de 67 anos, tomou uma atitude radical para um madeireiro de Tailândia. Decidiu não serrar mais um centímetro de madeira em protesto contra a falta de documentação e certificados das toras que chegavam às suas duas serrarias.

Hoje, usa seu maquinário para prestar serviços a terceiros. Antes de assinar contrato, exige que mostrem documentação da madeira.

O patrimônio da madeireira e das serrarias de Nestor, que tem dois filhos como sócios, é de cerca de R$ 4 milhões. São três caminhões próprios para puxar madeira, três tratores, um trator florestal (para entrar na mata e tirar a tora), três carregadeiras (como pás mecânicas, só que com uma espécie de alicate no lugar da lâmina), uma patrola e duas serrarias. “Não tivemos outra alternativa a não ser parar. Fechei por falta de madeira legal. Preferi não esperar para ver o que vai acontecer”, disse.

Com o dinheiro que ganharam na madeireira, Nestor e os filhos compraram três fazendas. Juntas, somam cerca de 6 mil hectares. “Nós temos madeira lá, temos estoque. Poderíamos estar serrando nossa madeira, mas resolvemos dar um tempo, diversificar a atividade. Vamos mexer com gado também, plantar mandioca, ver como fazer para engarrafar suco, tudo dentro da legalidade.” Ele disse que muitos dos problemas vividos hoje pelos madeireiros foram causados pelo próprio setor. “Não se prepararam para a escassez da madeira.”

Nestor afirmou que a decisão de paralisar as atividades das serrarias se deu por dois fatores: falta de certificação da madeira e para mostrar que o governo não ajuda, atrasa alvarás das madeiras legais, além de fazer vista grossa para os que roubam madeira nas terras dos que preservam a floresta. “Por aí existem os sem-terra. Em Tailândia, temos os sem-tora, que entram nas terras dos outros, levam a madeira e a vendem”, disse.

Para manter suas três fazendas preservadas, Nestor e os filhos gastam dinheiro com o pagamento de vigias, na tentativa de impedir que roubem a madeira. Há também outro problema. Como a área é destinada à preservação, os sem-terra costumam invadi-la, alegando que são improdutivas e que deveriam ser desapropriadas. Por enquanto, Nestor conseguiu que a Justiça lhe garantisse a reintegração de posse.

Em 1988, Nestor montou sua madeireira. “Já não havia espaço para todo mundo. Vim para cá porque tinha madeireiras e essa é uma atividade de que gosto, a única que aprendi. Pensava sempre: ‘Se conseguir comprar uma serraria, posso chamar meus filhos para cá’.” Nascido em Santa Cruz do Sul (RS), era pequeno quando o pai morreu em acidente rodoviário. A mãe vendeu tudo e levou os quatro filhos para Concórdia (SC). Lá, comprou um sítio. Quando adulto, começou a trabalhar numa serraria. “Comecei nos serviços gerais. Depois, aprendi a limpar tora e dirigir caminhão.”

Atualmente, mesmo com a serraria fechada, ele não fica parado. “O que a gente ganha com prestação de serviço não dá para fazer capital, mas dá para viver. Enquanto isso, a gente vai planejando o que fazer.”

Um comentário:

sandramarcuzzi08@hotmail.cm disse...

Boa tarde, conheço essa pessoa da primeira entrevista MASSAO sempre foi guerreiro.