Por MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Questionado se Lula está sensibilizado com a pressão dos ruralistas, ministro diz que "o presidente não se pronunciou"
Minc defende tratamento distinto para a agricultura familiar e afirma que não vai aceitar o cultivo da cana no entorno do Pantanal
Com a legislação ambiental sob pressão do agronegócio e de empreendedores de grandes obras, o ministro Carlos Minc (Meio Ambiente) critica o "afã produtivista" que, segundo ele, repercute no governo e põe em risco metas assumidas para frear o aquecimento global.
Cobrado por ambientalistas a reagir às pressões, Minc acusa ruralistas (liderados pela Confederação Nacional da Agricultura) de terrorismo e busca aliança com pequenos agricultores para barrar mudanças nos limites de desmatamento.
Minc reconhece que perdeu na definição do novo cálculo da compensação ambiental para empreendimentos em razão de compromissos assumidos por Lula. Mas adianta que não assinará o zoneamento da cana caso o presidente autorize o plantio no entorno do Pantanal.
FOLHA - A pressão agora é como a que levou Marina Silva a se demitir?
CARLOS MINC - O paralelo não é perfeito, mas é um momento difícil. E não se reverte uma situação dessas com chororô. A CNA está numa mobilização competente, faz reuniões com 3.000 agricultores aterrorizando o pessoal, dizendo "olha, vai perder tudo, vai ser preso". Com essa tática, pegaram a agricultura familiar de massa de manobra para sustentar a demanda ruralista. Se isso se consolida, acabou.
FOLHA - O presidente Lula está sensibilizado com essa pressão?
MINC - O presidente não se pronunciou sobre isso. Eu resolvi ir em cima da agricultura familiar para tentar construir uma aliança. A agricultura familiar tem 20% das terras e 90% do número de produtores. A base política do governo Lula não é o agronegócio, embora seus representantes sejam bastante beneficiados com a política do governo. Tivemos conversas com a Contag, que é o movimento mais forte, a Fetraf, ligada à CUT, e com o MPA, que é mais ligado ao pessoal do MST. Depois reuni os ambientalistas, todos os importantes. Falei: olha, eu não quero ter uma derrota honrosa. E fizemos um pacto da agricultura familiar com os ambientalistas.
FOLHA - É um pacto contra as mudanças no código florestal?
MINC - Não, é uma aliança em torno do tratamento diferenciado para a agricultura familiar, as propriedades de até quatro módulos rurais, o que pode variar 50 a 400 hectares, dependendo da região. A relação do Meio Ambiente com a agricultura familiar não pode ser repressiva. É completamente diferente ter terra de 30, 40, 50 hectares ou 30 mil, 40 mil, 50 mil hectares. A agricultura familiar vai poder considerar áreas de proteção permanente no cálculo da reserva legal. Os ambientalistas aceitaram. Outra coisa é o pagamento por serviços ambientais, que o presidente vai assinar. O registro da reserva legal será feito gratuitamente para esse pessoal.
FOLHA - Por decreto, o presidente reduziu a taxa de compensação ambiental para empreendimentos. Pesou a tentativa de reduzir os custos de exploração do pré-sal?
MINC - Eu não ganhei isso. Quando comecei a ver que o Lula havia se comprometido já com o teto de 0,5%, fiquei preocupado. Não aceitei e fiz um recurso dentro do governo. Eu acho que o correto era ser de zero a um. Mas consegui que o cálculo se aproximasse o máximo possível de 0,5%. Do jeito que eles queriam, além de ser essa miséria de 0,5%, a cobrança ia se aproximar de 0,2%, porque só incidia sobre uma pequena parcela do custo do empreendimento. Lula bateu o martelo e recusou o meu recurso quando começou a crise. Ele falou: "Olha, você recorreu, mas agora, com a crise, vamos ter de desonerar, estamos cortando impostos...". Ele não me falou no pré-sal, não.
FOLHA - O presidente está adiando o anúncio do zoneamento da cana-de-açúcar, um compromisso internacional de que o Brasil vai aumentar a produção de biocombustível sem dano ao meio ambiente. A dúvida é permitir ou não a expansão do cultivo no entorno do Pantanal.
MINC - Isso aí não é aceitável, eu não assino o zoneamento dessa forma. Até porque viajo muito por conta das discussões do clima, tenho uma visão internacional, e a primeira coisa que me perguntam lá fora é Amazônia. Depois, é o biocombustível. Por causa de uma área, vai arrasar o nosso etanol.
FOLHA - Seria uma encrenca.
MINC - Não será a primeira, essa é uma das minhas especialidades.
FOLHA - Também há conflito no governo sobre o licenciamento ambiental acelerado para rodovias, que está para ser aprovada pelo Senado.
MINC - Falei na Casa Civil que não tem acordo. Vou pedir ao presidente que vete isso. Acho decurso de prazo para licenciamento ambiental indecente.
FOLHA - Marina indicou um risco crescente de retrocesso na área ambiental. Esse risco é grande?
MINC - A pressão é nesse sentido. A pressão vem em parte do setor econômico, em parte do Parlamento, e isso repercute dentro do governo. Eu tenho de fazer face a isso porque o governo assinou um plano de mudanças climáticas, que estipula metas. Sempre quando chega eleição, PAC, obra, o afã produtivista faz parecer que é inexorável, mas é possível resistir
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