Por Fabíola Munhoz
Estão próximas do fim as investigações de um esquema para extração e venda ilegal de madeira e carvão, descoberto no leste do Pará em junho do ano passado, tendo o município de Tailândia como sede da articulação do crime.
A fraude, que derrubou florestas a partir do "esquentamento" de cerca de 120 mil metros cúbicos de madeira ilegal, gerou R$ 90 milhões para os bolsos dos integrantes da quadrilha e só aconteceu porque cinco projetos de licenciamento ambiental para exploração florestal foram fraudados no final de 2006.
De acordo com a promotora agrária de Castanhal, que é responsável pelo caso, Ana Maria Magalhães, o caso não é apenas de crime ambiental, mas uma mega fraude que envolve, também, falsidades ideológicas, documentais e improbidade administrativa.
Na época, o órgão responsável pela aprovação dos projetos era Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente (Sectam) do Pará- hoje o trabalho é feito pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema)-, a partir da atuação de servidores e técnicos que estão sendo investigados pelo Ministério Público do Estado (MP/PA). O secretário do órgão durante esse período, Raul Porto, foi preso por envolvimento com a exploração ilegal de madeira em março do ano passado pela Operação 'Ananias', da Polícia Federal.
Os projetos fraudulentos estavam em nome de quatro pessoas e foram aprovados no tempo recorde de 18 dias, sendo que as áreas às quais se referiam já haviam sido devastadas há mais de 15 anos. São cinco projetos de exploração florestal fraudulentos em nome de quatro pessoas, duas das quais, possivelmente, sejam "laranjas" dos demais. Um dos integrantes da quadrilha morreu no ano passado e a área usada por ele para fraudar a lei está atualmente invadida.
A promotora diz que teve certeza da participação de servidores da Sema no esquema, quando o órgão demorou muito a responder seu oficio pedindo informações documentais e, por fim, informou que os documentos dos cinco projetos haviam desaparecido. O sumiço dos papeis não impedirá que se prove a culpa dos criminosos, segundo Magalhães. "Essa documentação foi possível recuperar no próprio sistema da Sema", garantiu.
A denúncia foi feita por Valdinei Palhares, pecuarista e antigo sócio do ex-prefeito de Tailândia, Paulo Jasper. Palhares indicou Jasper ao MP/PA como o principal negociante dos papéis fraudulentos, que teria faturado sozinho R$ 12 milhões.
O Núcleo de Meio Ambiente do Centro de Apoio Operacional do Ministério Público do Estado do Pará (Numa) fez um convênio com o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) , para que tivesse acesso aos dados técnicos. Estes possibilitaram constatar as fraudes da quadrilha, em razão da análise de imagens de satélite das áreas desmatadas, antes e depois das aprovações dos projetos de cortes rasos.
Magalhães informou que os crimes não puderam mais ser investigados pelo Grupo Especial de Prevenção e Repressão às Organizações Criminosas (Geproc) do MP e tiveram de ser transferido à responsabilidade da Delegacia Especializada em Meio Ambiente da Polícia Civil.
Como funcionou o esquema
A Sectam aprovou os projetos de manejo ou corte raso para uma determinada área, que poderia não ter mais floresta e até mesmo ser existente. Em outras palavras, a documentação imobiliária apresentada ao órgão ambiental do Estado era falsificada e não foi verificada.
A pessoa beneficiária comercializou somente o papel, que forneceu a madeireiras como autorização para que a madeira usada por essas empresas pudesse ser transportada ou cortada impunemente. A madeira em si e, principalmente, o carvão- mais procurado por ser matéria-prima para siderúrgicas- são retirados ilegalmente de áreas de floresta pelos "compradores", que financiam os "sem-tora" para que invadam áreas de floresta e a desmatem ilegalmente.
Depois da devastação de áreas que não tinham relação com o projeto, a madeira decorrente do desmatamento era "esquentada" com os papeis dos projetos fraudulentos, podendo ser vendida a qualquer lugar. É por isso que esses papeis podem "esquentar" uma madeira extraída de terras localizadas a muitos quilômetros da área prevista no projeto com fraude.
A promotora, que acompanha o caso, diz que chegou ao nome dos criminosos porque as vendas ilícitas de madeira se tornaram evidentes para as pessoas de Tailândia, devido ao enriquecimento rápido de alguns dos integrantes da quadrilha. Ao lado disso, as invasões de áreas de floresta pelos sem-tora começaram de forma incontida. "Tudo isso chamou a atenção das pessoas e todos em Tailândia comentavam pelas ruas sobre o esquema", afirmou.
Fazenda Uirá
A promotora Ana Magalhães disse já ter oferecido denúncia contra os sem-tora que atacaram a floresta da fazenda Uirá, em Tailândia, uma das terras que tiveram sua madeira ilegalmente retirada e "esquentada" a partir das autorizações fraudulentas dos cinco projetos de Tailândia.
De acordo com ela, Uirá está ainda hoje invadida, e aguarda reforço policial do Estado para que seja cumprida uma liminar de reintegração de posse deferida pela Vara Agrária de Castanhal, e assim sejam retirados os assaltantes de madeira do local. A promotora já fez um pedido de prisão desses sem-tora, que não foi atendido pelo Juízo de Tailândia. Nos próximos dias, a Polícia deverá, finalmente, desocupar a área de Uirá, depois de devastados mais de 700 hectares de floresta nativa.
A promotora também reclama da demora de resposta ao pedido de documentos sobre os projetos fraudulentos que fez à Sema. Para ela, a omissão da nova gestão do órgão foi penalmente relevante, e o MP deverá propor ação civil pública por improbidade administrativa contra o secretário estadual do Meio Ambiente, Walmir Ortega. A reportagem procurou Ortega para que falasse a respeito, mas não obteve resposta da assessoria do secretário até o fechamento da matéria.
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