quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Silêncio no cerrado

Fogo mata animais e devasta áreas que deveriam ser preservadas como o parque de Chapada dos Guimarães

Da Redação

O longo período de estiagem que toma conta do cerrado e da Amazônia brasileira este ano culminou em grandes incêndios florestais, arruinando a vegetação em unidades de conservação, destruindo cidades e propriedades rurais e causando problemas de saúde em boa parte da população da região Centro-Oeste.
 

Embora já prevista em vários modelos climáticos analisados por pesquisadores e anunciados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais(INPE), a seca demonstra a fragilidade da fiscalização, a omissão do Judiciário e a falta de uma política de conscientização sobre o uso do fogo com programas de educação ambiental e assistência técnica rural permanente nas áreas onde as queimadas se propagam todos os anos. A velha e perigosa cultura do fogo é a verdadeira causadora de um dos maiores desastres ambientais do país. E o fogo não aparece do nada, ele certamente é provocado pelos seres humanos e suas invenções. A tragédia está estampada nas margens das estradas e em unidades de conservação como o Parque Nacional de Chapada dos Guimarães.

Com mais de 25 anos e um dos mais visitados do Brasil,o parque tem sido alvo de destruição e descaso de autoridades locais, da população do entorno e de muita gente "fina" que, com suas máquinas de diversão como as motocicletas, rasga a morraria soltando fagulhas e provocando fogo e erosões. Os chacareiros, pequenos agricultores, insistem em usar o fogo para facilitar a limpeza e fazem isso à vista de todos insistindo na prática. Brigadistas e bombeiros que arriscam a vida e a saúde para apagar quilômetros de chamas apontam que a comunidade do Rio dos Peixes e do Morro São Gerônimo fazem sempre a mesma coisa todos os anos.

Desde 2007 o Parque Nacional de Chapada dos Guimarães vem passando por vários incêndios florestais, sempre nos mesmos pontos. O gerente do parque, Cecílio Pinheiro, aponta dois grandes incêndios de agosto para cá. Um deles começou no entorno do Morro São Gerônimo, durou dez dias e arrasou nove mil hectares de mata. O segundo começou na região do córrego Coxipó-açu, devastou 6 mil hectares e deixou aves, répteis e pequenos mamíferos sem abrigo e alimento. Quem caminha pela mata devastada facilmente avista as aves, veados, cobras e lagartos chamuscados pelo fogo, perdidos nas cinzas. O silêncio impera no cerrado.

Os analistas ambientais do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMbio), Maurício Cavalcanti e Priscila Amaral, que há alguns anos acompanham a devastação do Parque de Chapada durante o período de estiagem no cerrado, afirmam que faltam estudos científicos sobre os impactos das queimadas, mas tudo indica que áreas que queimam com muita frequência têm grande probabilidade de destruir a mata arbórea, ou seja matar as árvores. "A formação vegetal original pode ir se modificando", dizem.

Os técnicos ressaltam ainda que 2007 era considerado o ano com maior área queimada até 2010, onde foram destruídos até agora 50% da área total da unidade de conservação de 33 mil hectares. Em 2009 ocorreram focos de incêndio, mas o grande brigadista do ano passado sem dúvida foi a chuva. "Em 2007 tivemos queimadas graves, mas o vento ajudava porque levava o fogo e também apagava. Este ano os incêndios arderam durante dias, as matas ficaram torradas, a vegetação virou cinza. Presenciamos labaredas de de cinco metros de altura e em questão de horas o fogo se alastra chegando a ultrapassar aceiros e até barreiras naturais como os rios. O fogo passou pelas copas das árvores", conta Maurício.

Ignorância - Ao todo 50 homens trabalharam desde agosto tentando conter o fogo provocado pela ignorância das pessoas, as mesmas que se dizem amantes do parque, as mesmas que vivem do turismo. Durante todo esse tempo, Chapada dos Guimarães e Cuiabá respiraram os gases tóxicos da fumaça, mas mesmo assim muita gente não consegue entender que o problema é a insistência das pessoas em usar o fogo. Reivindicar estrutura do poder público para apagá-lo pouco adianta quando as chamas estão sem controle. Em um lugar como Chapada, onde existem áreas de difícil acesso, é quase impossível deter a destruição.

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