quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Secas podem tornar Amazônia savana


Se estiagens como as de 1998, 2005 e 2010 virarem regra, floresta vai sumir no Pará, Tocantins e Mato Grosso  Falta de chuvas causada pela mudança climática fará com que a floresta se desestabilize, diz Carlos Nobre, do Inpe

CLAUDIO ANGELO DE BRASÍLIA
Uma sucessão de secas como a de 2010 seria capaz de transformar a porção sudeste da Amazônia em savana.

A conclusão é de uma dupla de pesquisadores do Brasil e da Colômbia, que calculou pela primeira vez qual é a redução na quantidade de chuvas necessária para desestabilizar a floresta.

Como tudo o mais que envolve efeitos do aquecimento global sobre os ecossistemas, a conta não é simples e envolve várias interações.

Mas Luis Fernando Salazar, da Universidade Industrial de Santander (na Colômbia), e Carlos Nobre, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), estimam que reduções de precipitação de 35% no sudeste da Amazônia e de 40% no nordeste bastariam para ampliar a estação seca (o "verão" amazônico) para quatro meses, transformando a vegetação em savana.

Num cenário futuro de aquecimento da Terra, no qual as temperaturas médias amazônicas subissem 4ºC, tal redução de chuvas é perfeitamente plausível.

Basta lembrar que as secas prolongadas de 2005 e deste ano viram reduções tão grandes ou maiores do que essas.

"É como se no futuro o que aconteceu neste ano de 2010 passe a ser o padrão", disse Nobre à Folha.

EFEITO CO2

Em um estudo publicado no periódico científico "Geophysical Research Letters", a dupla de pesquisadores usa um modelo computacional de clima e vegetação e analisa a resposta da floresta a diferentes níveis de temperatura e precipitação.

Mas, claro, num mundo aquecido não são apenas temperatura e chuva que variam: um dado que estudos do tipo ainda não haviam computado, é o efeito do CO2 a mais sobre a floresta.

O gás carbônico, como qualquer criança sabe, é fundamental para a fotossíntese. Ao mesmo tempo em que ajudam a esquentar o planeta, as emissões humanas do gás fertilizam as plantas.

O problema, conta Nobre, é que ninguém sabe qual é o efeito de fertilização do gás sobre a floresta amazônica.

"O ponto de não-retorno depende do efeito de fertilização", diz o pesquisador. "E os dados não nos permitem dizer que seja zero."

Ele e Salazar, então, montaram três cenários de resposta da floresta: um com zero fertilização, outro no qual o efeito é 100% (também improvável) e um intermediário, com fertilização de 25%.

No cenário intermediário, o aumento de temperatura de 4ºC e uma redução de 35% nas chuvas transformariam todo o sudeste amazônico numa savana empobrecida.

O efeito é máximo no sudeste (sul do Pará, Tocantins e Mato Grosso) e mínimo no noroeste (Amazonas). "Lá chove 4 metros por ano, se cair para 2 metros ainda dá para sustentar uma floresta", diz Carlos Nobre.

"Mesmo que a temperatura suba 7ºC, o efeito do CO2 compensaria esse aumento", afirma o cientista.

Nenhum comentário: