O País comemora na próxima semana mais um aniversário de seu atraso ambiental. É o Dia da Árvore.
A data deitou raízes no calendário cívico nacional há quase cem anos. Pelo menos cinco décadas depois de desabrochar nos Estados Unidos. A festa começou em Nebraska em 1872, quase ao mesmo tempo em que brotavam os primeiros parques nacionais do mundo. Fazia parte de uma onda de conservação da natureza que o resto do mundo imitaria mais cedo ou mais tarde.
Aqui, ficou para mais tarde. Perdeu a chance de marcar, no fim dos século 19, a campanha contra o desmatamento do sueco Alberto Loefgren, chefe da seção de botânica da Comissão Geográfica e Geológica de São Paulo. Loefgren queria o pacote completo. Não o plantio simbólico de mudas. Mas sobretudo os parques e o Código Florestal.
A resposta do governo saiu no começo do século 20. Reduzia-se ao Dia da Árvore, que na prática era o desmatamento de Loefgren reduzido à mínima potência. O Código Florestal e os primeiros parques nacionais, discutidos desde o Segundo Reinado e empurrados com a barriga pela República Velha, vingaram na década de 1930, às vésperas do Estado Novo. Bem depois que a moda americana se alastrara até as colônias africanas.
Nos Estados Unidos, o Dia da Árvore, que em outros lugares do Hemisfério Norte cai em março, como a primavera, acontece em 23 de setembro, para coincidir com o aniversário de Julius Morton, o cidadão de Nebraska que inventou a cerimônia. No Brasil, cai em 21 de setembro, para coincidir com a entrada da primavera, época em que uma tradição indígena muito mais renitente celebra a estação das queimadas.
Talvez por causa desse paradoxo, nosso Dia da Árvore - que, pelo decreto 55.795, chama-se Festa Anual da Árvore desde 1965 - deveria se chamar Dia da Muda. Árvore é coisa que se leva muito tempo para fazer. Muda, não. Dá fruto no dia da festa. E basta.
Como o decreto de 1965, que o País esqueceu, as mudas plantadas em 21 de setembro têm forte pendor para não crescer. Quem passou pelas escolas públicas do Rio na década de 1950, no tempo em que os alunos cantavam o Hino Nacional e hasteavam a bandeira antes de entrar na sala de aula, deve se lembrar da data como o dia em que todo mundo se perfilava em volta de um buraco no pátio, onde as professoras cravavam uma haste tenra, desfolhada, dizendo se tratar de um futuro pau-brasil - ou árvore que o valha.
Meio século depois, se uma ínfima porcentagem desses brotos tivesse crescido, as escolas públicas cariocas estariam hoje debaixo de bosques. Não em áreas cimentadas. E essa aridez não é só produto do acaso nem do cerco imobiliário que espremeu as escolas em áreas cimentadas. O Movimento Viva Rio, há dez anos, tentou doar mudas para Cieps da zona oeste, onde os prédios de Oscar Niemeyer geralmente cozinham ao sol escaldante em terrenos desérticos. Ouviu, da primeira diretora consultada, que árvore em escola só serve para os alunos se esconderem atrás do tronco, fazendo bobagens.
Mas as mudas nem por isso perdem a festa de seu dia. Amanhã, pelo menos nas rodovias de São Paulo, 120 mil miniaturas de espécies nativas serão distribuídos nos postos de pedágio pela SOS Mata Atlântica, com minuciosas instruções sobre como e onde plantá-las. Eis uma oportunidade que a educação ambiental dos estudantes brasileiros não deveria perder, seguindo o destino dessas menores até chegar a hora de virarem, de pleno direito, árvores. Daqui a três anos.
Marcos Sá Corrêa - O Estado de S. Paulo
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