O forte calor e a umidade da Amazônia, além de cupins e fungos são os aliados do Laboratório de Produtos Florestais do Serviço Florestal Brasileiro para descobrir as espécies de madeira tropical mais resistentes do país. O estudo é desenvolvido há 25 anos com 120 espécies e só terminará quando todas elas tiverem apodrecido.
Até o momento, amostras de 11 espécies permanecem intactas e integram o grupo das madeiras tropicais mais duráveis: preciosa, muirapixuna, jataipeba, cumaru, maparajuba, louro-canela, abiurana, pau-santo, muiracatiara-rajada, angelim-vermelho e maçaranduba. A pesquisa ocorre em uma área localizada na Floresta Nacional do Tapajós (PA).
O engenheiro florestal e coordenador do estudo, Alencar Garlet, diz que a pesquisa surgiu para suprir a falta de informações sobre as madeiras amazônicas, inclusive a respeito da durabilidade natural delas. "Esses dados eram restritos às espécies de maior importância comercial e eram provenientes de poucos ensaios", diz ele.
Com a idéia em mente, os pesquisadores saíram a campo para coletar espécies em vários pontos da Amazônia. Deram prioridade àquelas que não tivessem sido objeto de estudos anteriores e que apresentassem potencial madeireiro em função da altura, diâmetro do tronco e volume por hectare.
Desde que as amostras começaram a ser analisadas, em 1985, uma equipe vai ao local da pesquisa uma vez ao ano na época da seca para analisar as madeiras. No dia 25, técnicos retornarão da visita anual com novos dados. Cada amostra recebe uma classificação que vai de zero (amostra sadia) a quatro (amostra podre). Os dados são registrados em uma planilha e depois analisados em laboratório. "Agora é que as informações estão maduras e que podemos trabalhar nelas", diz.
Os resultados podem ajudar a valorizar o uso das espécies naturalmente duráveis. Nos Estados Unidos e na Europa, é crescente a restrição ao uso de produtos químicos de preservação de madeira em função de questões ambientais. "O mercado quer madeiras que sejam naturalmente duráveis e esta é uma oportunidade de agregar valor a essas espécies", afirma Garlet.
Preservantes - O estudo não excluiu a análise das madeiras tratadas com produtos químicos, pois os pesquisadores queriam comparar quanto tempo uma madeira comum suportaria com e sem preservantes.
Assim, para cada amostra de madeira nativa sem produto químico foram preparadas outras duas estacas com tratamentos diferentes. Os resultados comprovaram o efeito do creosoto e do CCA (sigla para arseniato de cobre cromatado) sobre a durabilidade delas. Das 120 espécies, a maioria continua em bom estado desde que a pesquisa teve início. Até madeiras que normalmente se degradariam no período de um ano, como o marupá, continuam íntegras na área onde o estudo ocorre.
Uso racional - Segundo Alencar Garlet, o estudo ajudará a tornar o uso da madeira mais racional e eficiente. O consumidor que estiver em busca de uma madeira resistente para ser usada em estruturas expostas a condições climáticas em casas, sítios, clubes ou prédios, por exemplo, terá elementos a mais para decidir por aquelas comprovadamente duráveis.
A escolha correta evita o desperdício e o impacto ambiental caso fosse usada uma madeira menos resistente, que apodreceria rapidamente e precisaria ser trocada. "Ao utilizarmos espécies adequadas para cada situação, estamos evitando o apodrecimento precoce da madeira, que resultaria na necessidade de cortar novas árvores para substituir a madeira apodrecida", afirma o engenheiro florestal.
As informações obtidas com o estudo ajudarão também a ressaltar qualidades então desconhecidas de determinadas espécies e a valorizar o seu uso. Esse conhecimento deve ampliar, ainda, as opções de madeiras com características semelhantes. Com menos pressão em cima de um número reduzido de espécies tradicionalmente utilizadas, a floresta tem mais chances de continuar de pé.
Pesquisa também é realizada em Brasília O campo de estudos montado na Flona do Tapajós foi replicado em menor porte na Fazenda Água Limpa, de propriedade da Universidade de Brasília, no Distrito Federal. A pesquisa é mais recente - começou em 1986 - e envolve somente 80 espécies. O objetivo é verificar como a madeira se comporta em climas diferentes. As amostras são analisadas no 1º semestre de cada ano.
SAIBA MAIS:
Entrevista - Alencar Garlet
O que interfere na rapidez ou não da degradação?
A velocidade dos processos de biodegradação varia de acordo com a espécie madeireira, com as condições ambientais do local, principalmente umidade, temperatura e teor de oxigênio, e com o tipo de microorganismos e/ou insetos que a atacam. Embora existam algumas espécies com alta durabilidade natural, nenhuma madeira é imputrescível quando exposta a condições que favoreçam a biodegradação.
A resistência da madeira está associada a alguma característica especial da madeira?
A durabilidade natural é uma propriedade intrínseca de cada espécie, com causas complexas, que depende da constituição anatômica, da composição química dos seus elementos estruturais, da presença de extrativos com atividades fungicida e inseticida, e não está diretamente relacionada a nenhuma outra propriedade físico-mecânica individualmente.
Por que a madeira apodrece?
A madeira é formada basicamente por celulose, hemicelulose e lignina e pequenas quantidades de elementos minerais. Durante o apodrecimento, os fungos liberam enzimas que digerem os constituintes da madeira, gerando energia para o fungo e liberando CO2 e H2O para a atmosfera. Resumidamente, a madeira é o alimento dos fungos.
Além do apodrecimento causado por fungos temos também os insetos que se alimentam de madeira. Entre eles, destacamos os cupins que utilizam a madeira como alimento.
O apodrecimento é um processo natural, que ocorre sempre que as condições favoráveis estiverem presentes. Estas condições são temperatura favorável, umidade e oxigênio. Assim a madeira exposta a intempéries (chuva, calor, sol) e em contato com o solo sofre mais com o apodrecimento e com o ataque de insetos.
Como é feita a análise das amostras na Flona do Tapajós?
No início de cada inspeção, cada estaca é movimentada manualmente para frente e para trás, com a finalidade de avaliar se a perda de resistência provoca a sua quebra. Quando a quebra não ocorre, a estaca é retirada do solo e recebe uma leve raspagem para remoção do solo aderido. Em seguida, uma leve pressão é aplicada com instrumento pontiagudo (canivete ou formão) para verificação do grau de ataque. Posteriormente, cada estaca recebe uma nota em função do ataque sofrido: sendo nota zero para a estaca sadia e nota quatro para estaca que quebra (podre).
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