sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Envolverde - Projetos criados por Dorothy Stang provam que sustentabilidade é possível, diz missionária


Por Ivan Richard, da Agência Brasil

Anapu (PA) - Os Projetos de Desenvolvimento Sustentáveis (PDS), idealizados por Dorothy Stang, são exemplo de que é possível obter renda da floresta amazônica preservando a mata. A afirmação é da também missionária americana Jane Dnyer, que está em Anapu (PA) há 12 anos e mantém o trabalho na região desde o assassinato de irmã Dorothy, em 2005.

Para irmã Jane, se os governos local, estadual e federal investirem em programas semelhantes aos PDS seria possível alimentar a população, preservar o meio ambiente e oferecer uma fonte de renda aos agricultores de Anapu.

"Para preservar a mata a agricultura familiar precisa de máquina. O povo quer cumprir o fogo zero, mas sem equipamento não há condição de fazer isso".

Ela afirma que, sem fiscalização, até mesmo os projetos de manejo não são respeitados na região.

"Tudo aqui é ilegal. Se os madeireiros atuam legalmente, porque eles esperam até a noite para vir até a cidade. A gente vive nessas estradas e encontramos os caminhões esperando a noite chegar. Já criaram caminhos alternativos para não passar pela cidade. E a mata continua caindo".

Nos PDS, argumenta a religiosa, os agricultores são orientados a utilizar a floresta de forma sustentável. Nessas áreas é possível, inclusive, explorar economicamente a extração de madeira, como explica a missionária.

"O único local onde há verdadeiramente um programa de manejo é no PDS Virola Jaobá, que é um manejo comunitário", afirmou a religiosa, explicando que no local cada árvore retirada recebe uma placa de identificação de metal.

Com essa marca, acrescentou irmã Jane, a tora de madeira pode ser identificada e pode-se encontrar o tronco na floresta. "O que sai tem placa e o que fica tem placa. O móvel que for feito daquela madeira vai receber a mesma marca de identificação", exemplificou.

O problema, para ela, é a ilegalidade. "Nosso povo, em vários travessões, está com medo do fundo dos seus lotes, porque as madeireiras entram e os agricultores nem sabem. O problema é a ilegalidade e a responsabilidade", disse.

A pequena casa de madeira onde mora em Anapu está sempre de portas abertas. A única medida de segurança é um pedaço de arame que prende o velho portão de madeira. Perguntada se tem medo de que lhe façam mal, irmã Jane diz que o perigo que corre é o mesmo de todos no município.

"A gente vive em Anapu e tem um relacionamento com o povo daqui. O que o povo de Anapu é sujeito, nós também somos. Então, se há problema de segurança o povo também está passando por ele e não saímos enquanto não houver segurança", diz.

Ela conta que, mesmo depois do assassinato de Dorothy, continua indo em todos os locais no município. "Alguns até chamam a gente de Dorothy", brinca.

"Sozinho não ando mais. Antes andava, mas vamos a todas as estradas do município. Hoje acho difícil alguém pegar uma bala e matar a gente. Já criou problema demais para eles. Se quiserem acabar com a gente, deve ser por um 'acidente'. Todos nós sabemos [dos riscos] e fazemos o possível para evitar, mas ninguém pode evitar tudo". Irmã Jane disse que nunca pensou em deixar Anapu.

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Duas realidades distintas da floresta em Anapu marcam a paisagem da região

Anapu (PA) - O canto do pássaro uirapuru, conhecido como pai da mata, anuncia a chegada à área do lote 55, zona rural de Anapu, onde é desenvolvido o Projeto de Desenvolvimento Sustentavel (PDS) Esperança, idealizado pela missionária Dorothy Stang, assassinada em 2005.

Ali, o que se vê é mata fechada, árvores altas e clima bastante úmido, o habitat do pássaro que só é encontrado em florestas densas.

A paisagem é bem diferente do percurso de aproximadamente 20 quilômetros até chegar ao PDS idealizado pela missionária. Neste trecho, a imagem é de desmatamento, corte raso e floresta queimando. É isso o que se observa ao logo do Travessão Santana, estrada de terra que corta a floresta até o PDS Esperança.

Os próprios agricultores do lote 55 sabem explicar a clara diferença das paisagens dentro da mesma floresta amazônica. "Aqui é meu paraíso, de onde tiro meu alimento. Cada árvore aqui é importante para tudo que fazemos", explica o agricultor Raimundo Souza, conhecido como Paraupebas.

Ele mora sozinho em uma casa de madeira. "Nasci aqui e andei por São Paulo, Rio de Janeiro, Mato Grosso e Acre. Como sou analfabeto, nada deu certo e voltei para o que sempre soube fazer", conta mostrando pés de mamão e uma roça de abacaxi, plantados por ele.

O agricultor Manoel Filho, também morador do lote 55, cultiva arroz, feijao, milho e caucau. "Se tivéssemos mais apoio, poderíamos plantar mais e vender na cidade. O que colhemos aqui dá apenas para nosso sustento", afirma.

A única escola do lote 55, uma área de três mil hectares, é feita de troncos de madeira, coberta com palha. Não há paredes. "Todos os dias caminhamos cerca de um quilômetro e meio até a escola", diz a professora Francisca Silva dos Santos.

Devido às incertezas que marcam a posse da terra e a dificuldade para continuar os estudos, a única professora da região pensa em deixar o local no próximo ano. "Não temos apoio para nada aqui. Quero continuar a estudar, me formar e, como não tenho carro, fica dificil ir até a cidade". (I.R.)

(Envolverde/Agência Brasil)

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