terça-feira, 5 de agosto de 2008

Folha - Cartéis tiram renda da agricultura, diz Mangabeira

Por MAURO ZAFALON
DA REDAÇÃO

Para o ministro de Assuntos Estratégicos, é preciso acabar com o "caldeirão de insegurança jurídica" que há na Amazônia

Mangabeira afirma, na Fiesp, que "é preciso fechar a torneira das terras públicas, facilmente disponíveis a aventureiros e devastadores"

"A Amazônia é um caldeirão de insegurança jurídica. Por isso, uma das prioridades do momento é a regulamentação fundiária da região. Sem resolver esse problema de titularidade das terras nada mais funcionará na Amazônia."

As afirmações foram feitas por Roberto Mangabeira Unger, ministro Extraordinário de Assuntos Estratégicos, ontem na Fiesp (reúne as indústrias paulistas), em encontro com integrantes do setor agrícola.

Os presentes disseram que gostaram do que ouviram. "Se o ministro conseguir colocar em prática o que propõe, realizará o sonho do agronegócio", avalia o ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues.

Segundo Mangabeira, é preciso fechar a torneira das terras públicas, facilmente disponíveis aos aventureiros e aos devastadores. "Enquanto não fecharmos essa torneira, continuará a ser mais fácil e mais eficiente saquear do que produzir na Amazônia florestada."

Para o ministro, é preciso reorganizar e equipar as instituições responsáveis e simplificar as leis. "Nenhum dos países que enfrentaram na história moderna um problema fundiário dessa dimensão conseguiu resolvê-lo sem simplificar as leis sobre a propriedade e sobre a transmissão da propriedade."

O país precisa, ainda, enfrentar problemas de transporte, insumos e transformação industrial, afirma o ministro. Nos transportes, o problema número um é a busca da saída do Centro-Oeste para o Norte.

No que se refere a insumos, "o país precisa superar a nossa absurda dependência das importações de fertilizantes." O país não tem de continuar nas mãos do cartel mundial de fertilizantes, diz ele.

Quanto à transformação industrial, o Brasil precisa elevar o grau de agregação de valor, diz Mangabeira. Mas para resolver esses problemas é necessário uma obra institucional, o que implica coordenação estratégica entre o Estado e o produtor. Organizar a comercialização, o extensionismo, a política de preços mínimos, o seguro agrícola e o seguro de renda.

Para Mangabeira, é necessário reorganizar os mercados agrícolas. Na maior parte deles, os produtores brasileiros estão fragmentados, enquanto os compradores e fornecedores são cartelizados. "E, por conta dessa cartelização, se apropriam da parte do "leão" dos ganhos da agricultura".

Não há uma fórmula para o fortalecimento dos produtores nacionais, admite o ministro. Ela pode vir pelo fortalecimento das cooperativas, pelo desenvolvimento de armazenagem de estoques reguladores e por procedimentos antitrustes em favor da competição.

O ministro propõe um regime de concorrência cooperativa, em que produtores possam competir entre si e cooperar ao mesmo tempo, utilizando o conjunto de facilidades jurídicas e de incentivos econômicos. "Fazer um mutirão de recursos financeiros, comerciais e tecnológicos, o que facilitaria o acesso à economia de escala."


Setor de "vanguarda"

Mangabeira diz que estamos acostumados a pensar na agricultura como exceção, mas o setor é de "vanguarda". Na sua avaliação, o país pode começar a construir um novo modelo de desenvolvimento baseado na ampliação de oportunidades.

Sobre o fato de os mesmos temas serem administrados por vários ministérios, Mangabeira diz que não se pode permitir que a repartição de competências entre os ministérios produza desorientação conceitual estratégica. "O projeto de agricultura é um só e precisamos superar o legado desse contraste entre duas doutrinas: uma voltada para o pequeno produtor e outra para o grande."

"O país vive um vazio de projetos e de construção nacional. A única coisa que a nação vê é uma série de lobies e de facções, cada um defendendo o seu. Nesse ambiente, não há alternativa sistêmica, mas reivindicações pontuais. E nem mesmo esses problemas pontuais conseguem ser encaminhados e resolvidos", segundo o ministro.

Para o desenvolvimento sustentável da Amazônia, o ministro diz que são necessários regulamentação fundiária e zoneamento ecológico e econômico; persistência e radicalização no combate ao desmatamento; assegurar alternativas de produção a pequenos produtores; reorganização agrícola a partir da agricultura da Amazônia e dos cerrados; incrementar a indústria de transformação; e construir um novo paradigma de transporte multimodal.

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