O governo brasileiro teme que propostas como a defendida pela indústria de papel e celulose possa ser uma ameaça à floresta nativa. Há países que desmataram sua cobertura vegetal e querem créditos de carbono para reflorestar. Isso abriria um precedente perigoso. Madeireiros ilegais e desmatadores poderiam se sentir estimulados a derrubar mais floresta, ganhar com a venda da madeira e destinar a área depois para projetos de reflorestamento, que gerariam créditos de carbono. "Nosso objetivo é manter a floresta em pé", diz um negociador brasileiro.
Projetos de reflorestamento possibilitam o sequestro de carbono da atmosfera. Mas a riqueza de uma floresta original, como a Amazônia, é a biodiversidade e a influência que exerce no regime de chuvas, e não só ser um sumidouro de carbono. Fixar o carbono no solo e tronco das árvores é só um serviço da floresta - e é aí que está o conflito com a posição defendida pela indústria de papel e celulose.
Na negociação internacional há consenso sobre a inclusão de mecanismos de incentivo ao Redd (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação), mecanismo que será discutido na Conferência de Copenhague. Ninguém se opõe que Redd deva constar do acordo. O problema é como estes mecanismos irão funcionar.
Os EUA, por exemplo, costumam enxergar a floresta como um "estoque de carbono". Assim, tanto faz se for uma floresta de eucaliptos ou a floresta amazônica. "A nossa preocupação é que Redd não seja um estímulo para a derrubada da floresta", continua o negociador. "Isto valeria também para a agricultura, um dos mais importantes "drivers" do desmatamento."
Com este flanco aberto, dizem negociadores, ficaria difícil ao governo brasileiro assegurar que não se está derrubando floresta para, por exemplo, plantar cana-de-açúcar para produzir etanol (e obter créditos de carbono com isso). O lobby do setor de papel e celulose também é o de alguns países que já desmataram muito e querem créditos para reflorestar. É uma situação bem diferente da brasileira.
O setor de papel e celulose já pode ter créditos de carbono de projetos de reflorestamento relacionados ao Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). A Plantar de Minas Gerais, por exemplo, pode ter créditos de carbono para suas florestas de eucalipto e, assim, produzir carvão vegetal sem que se queime floresta nativa na operação. Há duas críticas em relação ao MDL. A primeira é que o processo de aprovação dos projetos é lento. A segunda é que não há muita demanda. "A Europa, que é o principal comprador, tem restrições ao uso de créditos florestais para reduzir suas metas do primeiro período do Protocolo de Kyoto", diz Karen Suassuna, do WWF.
Na última rodada de negociações do acordo climático, em Bancoc, há duas semanas, a posição brasileira sofreu um golpe. Estavam se discutindo salvaguardas para florestas e, no texto final, saiu a referência a ter que manter a mata em pé, contra a conversão da floresta para plantações. O Brasil defendeu que o texto deveria voltar a ser como antes. Foi apoiado por outros países. Mas a União Europeia se opôs ao pedido brasileiro. A situação ficou num impasse.
"Deixamos passar porque isso está num estágio muito inicial e será a primeira coisa a voltar na próxima rodada", diz o negociador. "A posição da UE foi surpreendente para a delegação brasileira. Não são eles quem têm todo este discurso de proteger a Amazônia?"
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