Faltando apenas um mês para completar o período de coleta da taxa oficial de desmatamento do ano, os satélites do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) registraram uma queda de 55% no ritmo de abate da floresta amazônica. Os dados dos últimos 11 meses indicam que a Amazônia deverá ter a menor taxa de desmatamento desde 1988, quando o instituto começou a medir a devastação.
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Dados dos últimos 11 meses indicam que taxa de devastação deve ser a menor em 21 anos; Minc atribui queda a medidas de controle
Ministro observou, porém, que ações como o aumento da fiscalização e o corte de crédito para desmatadores têm efeito "temporário"
Ao comentar os dados mais recentes do Inpe, referentes a junho, o ministro Carlos Minc (Meio Ambiente) atribuiu a queda do ritmo das motosserras a duas palavras: "controle e pancada". Minc acredita que os efeitos da crise internacional, com queda dos preços de commodities, como a carne, não foram responsáveis pelos números. A pecuária é apontada como principal causa do desmatamento na região.
Minc observou, no entanto, que medidas como o aumento da fiscalização, o corte de crédito para desmatadores e a retirada do gado criado em áreas de desmatamento irregular têm efeito "temporário".
"Mesmo caminhando para o menor desmatamento dos últimos 20 anos, o problema ainda é muito grande. Não me sinto contemplado. Minha esperança são alternativas de desenvolvimento sustentável na região", avaliou o ministro.
A expectativa do ministério é que a taxa anual de desmatamento indique a derrubada de aproximadamente 9 mil quilômetros quadrados de floresta entre agosto de 2008 e julho de 2009. Isso equivale a seis vezes a cidade de São Paulo.
Na série histórica do Inpe, iniciada em 1988, o menor volume de abate de árvores foi registrado em 1991. Pouco mais de 11 mil quilômetros quadrados de floresta foram cortados, mais de sete vezes o tamanho da cidade de São Paulo.
Em 2008, apesar de várias medidas adotadas no início do ano para conter o desmatamento acelerado, a taxa medida até julho ainda cresceu 12% em relação ao ano anterior e alcançou 12,9 mil quilômetros quadrados. O resultado interrompeu um movimento de três anos consecutivos de queda.
Apesar dos resultados obtidos, o combate ao desmatamento ainda enfrenta resistências, sobretudo no Pará. Ontem mesmo, o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) teve problemas com a operação "Boi Pirata" na região da BR-163, no Pará.
Mesmo após o Tribunal Regional Federal da 1ª Região expedir mandado de segurança favorável à continuidade da apreensão de gado criado em áreas embargadas por desmatamento, o juiz estadual pediu a prisão do coordenador da operação, Leslie Tavares.
Segundo os dados do Inpe, o Pará registrou a maior devastação em junho. Foram 330 quilômetros quadrados, mais de metade do desmatamento registrado no conjunto dos oito Estados da Amazônia, de 578,6 quilômetros quadrados.
Essa extensão do desmate no Pará pôde ser detectada apesar de 49% do Estado estar encoberto por nuvens em junho.
Nuvens são obstáculos ao sistema do Inpe. Quando sua presença é grande, os dados de desmatamento captados pelo satélite ficam subestimados.
Dados mostram nova geografia da devastação
Por CLAUDIO ANGELO
EDITOR DE CIÊNCIA
O ministro do Meio Ambiente chamou uma entrevista coletiva para comemorar a previsão de queda no desmatamento em 2009. Mas omitiu que os dados divulgados pelo Inpe são quase todos negativos: o desmatamento em 2008 foi quase 1.000 km2 maior do que se estimava; Pará e Maranhão estão fora de controle; e a devastação está cada vez mais espalhada pela Amazônia.
O dado do Prodes (sistema que calcula efetivamente a taxa de desmatamento), divulgado ontem sem alarde pelo Inpe, mostra que a devastação em 2008 foi de 12.911 km2, não de 11.968 km2. O governo vinha se fiando nesse dado para dizer que houve "empate técnico" entre 2008 e 2007. Ou seja, para todos os efeitos, havia queda no desmatamento por quatro anos seguidos.
O novo dado, obtido a partir de 334 imagens de satélite, mostra que a curva virou em 2008 e a devastação voltou a crescer. A tendência para 2009 é de queda.
Mas é na análise da série histórica de dados do monitoramento por satélite que está a notícia mais problemática: o padrão geográfico do desmatamento mudou.
A devastação saiu do chamado Arco do Desmatamento (sudeste do Pará, norte de Mato Grosso e Rondônia) e se concentrou no coração do Pará e no Maranhão. O desmate parece ter se estabilizado em Rondônia e em Mato Grosso. Para o diretor do Inpe, Gilberto Câmara, a destruição está "mais difícil de combater e prever".
Os dois principais focos da "metástase" do desmate são a Terra do Meio e o eixo da BR-163 (Cuiabá-Santarém). O fato de o desmatamento persistir ali significa que as medidas de "governança" adotadas a partir de 2005 -criação de unidades de conservação e interdição de áreas- fracassaram.
Um alerta sombrio para um governo que se prepara, usando as ações na BR-163 como exemplo, para rasgar mais um eixo de devastação na Amazônia, a BR-319.
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